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sábado, 27 de junho de 2020

Analisando Crash Bandicoot 4 em 1 minuto e meio


Crash Bandicoot 4: It's About Time foi revelado recentemente em um trailer de 1 minuto e meio pela Activision e pela Toys for Bob, companhia que cuidou dos remakes dos três jogos originais e da série Spyro The Dragon. O novo jogo será lançado para PlayStation 4 e Xbox One em 2 de outubro e seguirá o estilo do Crash clássico com fases em corredores porém com uma nova temática de viagem no tempo. Vamos falar um pouco sobre por que o jogo deverá ser legalzinho, mas não excepcional como os originais.

A Toys For Bob é uma companhia competente, com alguns jogos que eu realmente gosto ou admiro, como Tony Hawk's Downhill Jam e Skylanders, porém eles não são uma Naughty Dog ou Traveller's Tales. Para não mencionar que após a aquisição pela Activision e ter sido forçada a trabalhar praticamente só em Skylanders e Remakes, as melhores mentes criativas da empresa já devem ter saído.


Como o subtítulo dá a entender a temática da vez será viagem no tempo, algo que muitas séries exploram atualmente. Viagem no tempo é um ótimo tema para criar conteúdo de maneira fácil e barata. Seu personagem está viajando no tempo e por isso ele terá contato com diversas localidades e eras riquíssimas de detalhes e mitologias, eras por si só que já são excitantes. Crash no Velho Oeste? Crash na era Mesozoica? Crash na Segunda Guerra Mundial? talvez não esse último.

Há no entanto um defeito em viagem no tempo, o mesmo defeito de quando um personagem simplesmente visita um mundo fantástico como um herói que irá salvá-lo. Você pega mitologias e conteúdos de terceiros, sem ampliar seu próprio mundo ou mitologia. Em outras palavras, enquanto Crash estiver visitando todas essas épocas interessantes, seu mundo continuará o mesmo. É um pônei de um truque só.

Um dos melhores exemplos de jogo que amplia a mitologia da série é Super Mario Bros. 3 que mostrou reinos vizinhos ao Reino dos Cogumelos. Era incrível ter um reino de deserto, um reino de gigantes e um reino nas nuvens, locais que Mario nunca mais visitou naquele mesmo formato. O mesmo acontecerá com Crash ao criar mundos que nunca mais poderá visitar.


A jogabilidade em si é como o clássico Crash, porém com alguns problemas novos. Só o fato de ser a jogabilidade clássica não seria um problema, pois há muitos anos não temos um Crash novo, porém é uma pena que não vejamos alguma evolução. Isso acontece principalmente porque a empresa que está fazendo o jogo não é a mesma que criou a série, eles não têm o DNA inicial que permitiria uma evolução natural. É possível entender as origens de uma franquia e evolui-la, porém é mais difícil.

A grande novidade aqui são power-ups, como antigravidade e desacelerar o tempo. O único problema é que esses power-ups são usados de maneira errada. Simplesmente há momentos no jogo em que você precisa deles para passar por algum desafio. Isso não é um "aumento de poder", se você não pode realizar o que precisa sem o power-up, ele é meramente uma ferramenta.

Novamente tomando Super Mario Bros. como exemplo, completar as fases de Mario com power-ups é mais fácil e a experiência de cruzar as fases com cada um deles é diferente. Como Mario pequeno você é cuidadoso e procura por um cogumelo. Como Super Mario você já tem uma garantia de poder e de ser atingido sem morrer, mas quer mais, uma flor de fogo, por exemplo. Quando está com a Flor de Fogo, foca-se em confrontar inimigos, algo que não faria se precisasse pular na cabeça deles.


Acredito que a Activision como publisher também vai interferir no nível de dificuldade do jogo, mostrando que algumas das maiores reclamações são sobre o jogo ser muito difícil e como provavelmente Spyro teve mais sucesso com o público infantil do que Crash. Posso estar errado e eles estarem convencidos que a dificuldade faz parte do que torna o jogo essencial, mas o normal é a publisher querer abaixar a barra para aumentar o público.

Crash Bandicoot 4: It's About Time até tira uma página do manual da Nintendo de coadjuvantes irritantes com uma nova máscara no lugar de Aku Aku, então seria bom se eles tivessem tirado um pouco mais de coisas legais para deixar a jogabilidade melhor. Simplesmente fazer Crash como na época do PlayStation One mas com tecnologia melhor só nos levará para algo semelhante a Crash Bandicoot: Wrath of Cortex, algo que não parecia uma evolução real e que com o tempo matou o fogo da franquia.

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Review de Dead or School


Eu gosto de jogar jogos ruins. Não jogos ruins ruins, mas aqueles jogos que são ruins em alguns setores para se sobressaírem em outros. A indústria de jogos é permeada por jogos pretensiosos com visuais fotorrealistas e narrativas supostamente profundas que acreditam que isso garante enaltecimento automático, então constantemente eu me vejo procurando a antítese deles, jogos ruins que não têm bons gráficos, não têm boa história mas garantem que você vai se divertir.

Dito isso, uma jornada por jogos ruins que acabam sendo bons traz também muitos jogos ruins... ruins. Jogos ruins que não têm as qualidades redentoras que você esperava que os tornaria bons, então ficam sendo apenas.. ruins. Dead or School tenta ser um jogo ruim bom e falha, mas não chega a ser um jogo ruim ruim, o que o coloca em uma categoria que também não é tão interessante, o medíocre.

A história do jogo se passa em um futuro não tão distante no qual criaturas mutantes forçaram a humanidade a fugir para o subsolo, onde viveram por duas gerações. O jogador controla Hisako, uma menina da terceira geração criada no subterrâneo que possui grande força e começa a ter o desejo de retornar à superfície.


A principal motivação dela, no entanto, é bem ridícula. Hisako quer ser uma estudante e frequentar uma escola com amigos porque isso parece muito divertido, tudo graças a um uniforme de colegial guardado pela avó dela. A história ridícula quase funciona pra mim, mas ela me deu mais cringe do que eu gostaria. Ainda assim eu vou dar o benefício da dúvida de que ela é um ruim do tipo bom.

No quesito jogabilidade, no entanto, dá pra ver um certo amadorismo. Dead or School é um jogo independente, do tipo que a jogabilidade parece ter sido feita por uma única pessoa em qualidade e por muitas pessoas na falta de foco. A ação se desenrola lateralmente em fases com gráficos 3D, vulgarmente, 2.5D.

Você tem três tipos diferentes de ataque, com espada, com uma arma de fogo de médio porte e com uma arma de fogo de grande porte. Todos os ataques usam seu fôlego e você não pode simplesmente atacar sem parar ou a personagem fica cansada. Os golpes não parecem que encaixam e mesmo os tiros não têm peso, naquele estilo RPG onde só causam dano, sem real impacto.

O jogo tem vários sistemas e subsistemas, um em cima do outro, como se quantidade fosse torná-lo profundo. Cada arma pode ser melhorada, pode receber upgrades, têm uma árvore de habilidades própria, desviar de golpes no momento certo pode causar um momento de câmera lenta, se a personagem sofrer dano demais suas roupas se rasgam e seu poder de ataque aumenta em troca de baixa defesa e mais.


São tantas coisas acontecendo que você não consegue dominar nenhum desses sistemas e nem sentir o suficiente a influência de cada um deles na jogabilidade para se importar com algum deles. A jogabilidade parece uma colcha de retalhos, um amontoado de coisas incoerentes que acaba atrapalhando e deixando o jogo mais devagar porque você precisa investir muito mais tempo para entendê-lo.

Visualmente a aparência do jogo não é muito inspirada, parece um amontoado de recursos comprados em lojas da Unreal ou Unity. A personagem principal até é bacana e os inimigos têm um efeito legal de saltarem da frente da tela para a ação, porém os cenários são muito genéricos e de má qualidade. Se o resto do jogo fosse bom eles poderiam ser mais toleráveis como um conjunto consciente de sua própria baixa qualidade. A música foi onde senti que estava um pouco acima do resto do jogo e é até agradável.

Eu não gostei muito de Dead or School, mas apesar de tudo ele não é ruim. Seu preço atualmente é um pouco caro, mas em uma promoção dá pra se arriscar e ver se ele bate naquele exato ponto de equilíbrio de jogo ruim que é bom pra você individualmente, pois ele é um jogo popular com algumas pessoas. Eu esperava algo mais próximo da série Senran Kagura mas acabei com algo que se assemelha aos jogos independentes de Touhou.

Nota: 6/10

Review de Hidden Through Time


Hidden Through Time é um jogo de encontrar objetos, um pouco no estilo de "Onde está o Wally?", porém com várias coisas ao invés do famoso personagem. Não é um jogo muito ambicioso, ele se propõe a algo e realiza essa tarefa perfeitamente, o que me dá um certo dilema para analisá-lo já que o mesmo tempo ele faz tão bem seu trabalho mas não apresenta muita profundidade além disso. O jogo está disponível para PlayStation 4, Xbox One, Switch, PC, Mac e Android. A versão analisada foi a do PS4.

A parte "Through Time", "através do tempo" em português, é a grande sacada do jogo. O tema de cada fase é uma parte da história da raça humana, desde os tempos das cavernas até eras mais modernas. É divertido ver o mundo evoluindo ao seu redor e o conteúdo de épocas como Antigo Egito e revolução industrial são conteúdos fantásticos.


Ao início de cada fase você recebe uma lista de itens e cada um deles tem uma dica, próximo de uma charada, que indica onde você poderá encontrá-lo. Não é preciso encontrar todos os itens em uma fase para passar adiante, apenas alguns, porém para desbloquear fases futuras é preciso ter um certo número de itens. Caso o jogador não encontre todos os itens de primeira, pode voltar à fase posteriormente. O jogo também salva seu progresso o tempo todo, então é fácil parar de jogar e voltar depois.

Os cenários e animação são extremamente parecidos com os livros do Wally e isso significa também aquela dose de carisma que inclui ver várias situações engraçadas espalhadas pelo campo de busca que não tem necessariamente a ver com o que você está procurando. É possível também olhar dentro de construções com um clique que faz as paredes sumirem.

O visual é simpático, com personagens 2D estilo vetorial e com animações básicas. Houve alguns momentos em que senti lentidão, o que não é muito perdoável para um jogo 2D simples em um PlayStation 4, apesar de não atrapalhar muito. A música é tranquila e relaxante, algo necessário se você demorar muito em uma fase.


O jogo acaba rápido, mas é interessante para jogadores que gostam de troféus / conquistas já que dá pra se guiar por eles para ter algum conteúdo extra. Também há um modo de criação de mapas no qual você pode criar suas próprias fases com facilidade e também baixar fases de outros jogadores para jogar. Em teoria isso deveria estender muito a vida útil do jogo, mas não há muitos mapas bons para experimentar.

Eu me diverti bastante com Hidden Through Time, toda sua execução do que se propõe a fazer é perfeita, porém senti falta de um algo mais, mesmo que irrisório. Algo que talvez desse uma sensação de progressão, construção, algo que permitisse você sentir que além de vencer as fases estivesse fazendo algo mais como reconstruindo uma cidade ou criando um museu. Ainda assim só posso elogiá-lo e recomendá-lo para jogadores que gostam desse estilo.

Nota: 8,5/10

quarta-feira, 1 de abril de 2020

Impressões de Call of Duty: Warzone


Recentemente Call of Duty: Warzone foi lançado de surpresa como um Battle Royale gratuito da Activision que utiliza a mesma base de Call of Duty: Modern Warfare, mas não exige o jogo, funciona independente do mesmo. Como de costume eu embarquei por motivos de trabalho, mas então aconteceu o que eu não esperava, eu adorei o jogo.

Quando PlayerUnknown's Battlegrounds foi lançado eu comprei o jogo e joguei um pouco, mas logo vi que não era um jogo pra todo mundo, exigia um compromisso de tempo e habilidade muito grandes. Se você não tivesse tempo não tinha como esperar as partidas de quase uma hora e se não tivesse habilidade morreria assim que encontrasse alguém depois de 20 minutos vagando sozinho. Eu vi o potencial mas não podia recomendar pra um grande público.

O tempo passou, PUBG inspirou uma onda de outros jogos semelhantes, dos quais provavelmente o mais popular é Fortnite. No entanto a mistura de mecânica de tiro e construção também não é nada intuitiva para a maioria dos jogadores. Depois tivemos um outro Battle Royale bem expressivo, Apex Legends, da Respawn Entertainment, a mesma equipe de Titanfall, então isso me chamou a atenção. Porém, ainda assim não era muito legal.


Ao chegar em Call of Duty: Warzone realmente me senti em casa, era esse o Battle Royale que eu queria todo esse tempo. Ele tem toda a boa jogabilidade FPS de um Call of Duty, a qual eu esperava de Apex Legends, com uma mecânica de Battle Royale rápida e divertida que atualiza a fórmula para funcionar bem também para quem não tem tanto tempo nem tanta habilidade.

As partidas são rápidas porque o circulo que se fecha ao redor dos jogadores e incentiva o confronto, uma marca dos Battle Royale, é realmente rápido e mais mortal que em outros jogos. A habilidade conta menos porque você pode coletar dinheiro pela partida e comprar itens que te ajudam a sobreviver. Seus companheiros de time também podem te ressuscitar por dinheiro. É um Battle Royale que realmente suporta diferentes tipos de jogadores.

Acredito que a principal evolução da fórmula aqui são os "Contratos", algo semelhante a side quests que o jogador pode pegar e completar em troca de dinheiro e itens. Normalmente em um Battle Royale pode haver um grande período de tempo em que nada está acontecendo, quando não tem ninguém por perto e todos se escondem até sua posição não ser mais segura. Isso não acontece em Warzone porque todos querem e sabem como obter mais dinheiro e itens, então se arriscam mais.


Posso me imaginar facilmente viciado nesse jogo, apesar de infelizmente não ser bom o bastante nele. Eu jogo bem FPS, se jogar algumas horas fico calibrado para ir muito bem, consigo matar um bocado de gente no início, mas não sou tão bom a ponto de nunca morrer em um confronto 1 x 1. O maior problema é o de vários jogos online do PlayStation 4, o quanto de espaço eles ocupam no HD. São dezenas de GB apenas para um jogo, nunca houve tão pouca coisa instalada no meu PS4.

Apesar disso, recomendo que todos deem uma chance para Call of Duty: Warzone e talvez se surpreendam tanto quanto eu.

sábado, 7 de março de 2020

Kratos e o Navio de Teseu


Quando joguei o novo God of War de 2018 me lembrei como já falei aqui no blog que não o considero God of War. Isso porque tudo que tornava God of War um God of War foi removido e apenas usaram o nome do protagonista e o título em algo novo. Normalmente eu falo muito isso de franquias da Nintendo como "Super Mario Odyssey não é Mario" ou "Skyward Sword não é The Legend of Zelda", mas God of War é um exemplo ainda melhor. Me fez pensar como era um bom momento para explorar um exercício de filosofia: o Navio de Teseu.

Existe na filosofia esse exercício de pensamento sugerido pelo filósofo Plutarco na Grécia Antiga, com diversas variantes: Imagine o herói mitológico Teseu, conhecido por ter derrotado o minotauro, e que ele tem um navio. Então o Kratos o mata e rouba seu navio. Tá, isso não acontece no exercício original, mas a gente sabe que o Kratos faria isso. Após sua aventura, Teseu retorna para casa e é recebido com entusiasmo pelo povo. Eles ficam tão animados com sua história que decidem exibir o seu navio em um museu.

Há apenas um problema, uma das tábuas estava quebrada da aventura. Eles decidem então trocá-la por outra e exibir o navio normalmente. O navio permanece em exibição por anos e aos poucos as outras tábuas de madeira começam a apodrecer. Conforme é necessário elas vão sendo substituídas, aproximadamente uma por ano, até que depois de muitos anos nenhuma parte original do navio permaneceu. Resta então a pergunta: "Este ainda é o Navio de Teseu?" (ou do Kratos?). Normalmente a maioria concorda que não, então vem outra questão: "Quando deixou de ser?".

Essa pergunta levanta vários dilemas em torno do Navio, como um objeto, mas também sobre o conceito de identidade como um todo, inclusive de pessoas. Nós não somos a mesma pessoa durante toda a nossa vida. Nossas células morrem, são substituídas e de tempos em tempos não resta nada do nosso eu anterior. Então como nossa identidade se mantém através do tempo?


Se por um lado é uma pergunta antiquíssima, por outra é um dilema moderno que teremos que resolver se um dia quisermos ensinar a inteligências artificiais como determinar por conta própria o que são as coisas, como nomeá-las e diferenciá-las. Nós temos um certo conhecimento abstrato que não conseguimos explicar que nos diz quando uma coisa é uma coisa e quais características a definem, mas mesmo esse conhecimento nos falha às vezes. Por exemplo, cariocas e paulistas não conseguem chegar a um consenso sobre o que são bolachas e biscoitos.

Ao repararmos no cerne do dilema veremos que ela está em alta também na indústria de entretenimento como um todo com reboots de filmes clássicos, desenhos animados e filmes/séries de super-herói. Quando os personagens não são fiéis aos originais, eles ainda mantêm sua identidade? Sabemos que o Batman é o Batman, mas se ele vestisse um uniforme verde limão em um filme, o aceitaríamos como Batman? Temos um julgamento automático e abstrato de senso comum que nos faz saber o que é ou não o Batman.

Isso se estende a recente polêmica por inclusividade em Hollywood. Um personagem mantém sua identidade se tiver sua raça alterada? Seu gênero? Sua orientação sexual? Provavelmente há pessoas preconceituosas de verdade levantando a voz contra a diversidade, mas muitas reclamações sobre esse assunto são na verdade sobre "Transitividade de Identidade". Uma mudança, não diferente das tábuas de madeira do navio de Teseu, impede que a identidade de A seja transmitida para B.

Essa sensação estranha que sentimos quando a identidade de algo não passa por completo é o que Freud descreveu como "Unheimlich", uma palavra sem tradução mas que significa basicamente "estranheza", ou "uncanny" em inglês. É o mesmo conceito por trás do "Vale da estranheza" / "Uncanny Valley" que nos faz sentir aversão a coisas que parecem muito com humanos mas não chegam a ser humanos, como robôs ou modelos 3D de pessoas. O conceito está por trás também de Doppelgänger que se assemelham a alguém conhecido como no filme "Nós".


O "familiar porém estranho" causa essa sensação devido a uma dissonância cognitiva, quando recebemos ao mesmo tempo duas informações opostas de nossa mente, positiva e negativa, de que algo "É" e "Não é" ao mesmo tempo. Nosso cérebro recebesse uma mensagem de que "A é uma certa coisa" (ou está em um certo estado como "vivo" ou "morto", como na estranheza por robôs e zumbis) e ao mesmo tempo recebesse a mensagem que "A não é essa coisa". Então um God of War que não é God of War causa certa estranheza e até repulsa.

Vale ressaltar que não há uma resposta certa para o paradoxo do Navio de Teseu e provavelmente não vamos resolver os mistérios da alma humana hoje, mas os pensamentos desenvolvidos para esse exercício podem nos ser úteis para desvendar coisas mais simples. Por exemplo: "Quando jogos mudam toda a sua essência, ainda são o mesmo jogo?". Eu acredito que não.

Pequenas mudanças

A interpretação mais radical seria a dos fãs mais hardcore de jogos, filmes e outros produtos de entretenimento: "O Navio de Teseu deixa de ser o Navio de Teseu assim que a primeira placa de madeira é removida". Neste caso apenas a reprodução mais perfeita da identidade mais primordial de algo seria aceito. O próprio Plutarco no entanto rebate essa ideia.

O Navio de Teseu não deixa de ser o navio se apenas uma placa for substituída, assim como uma camisa não deixa de ser aquela camisa porque perdeu um botão. Um novo botão pode ser costurado nela sem alterar em nada sua identidade. Podemos perder uma parte do nosso corpo, colocar uma prótese e ainda sermos a mesma pessoa. Plutarco concluiu: "Objetos sobrevivem a pequenas mudanças".


Há um problema aqui no que se refere a "pequeno", pois é um termo abstrato. O botão não é "pequeno" porque representa apenas 1% da camisa ou porque mede 1 cm. Se esta fosse uma famosa camisa de botões de marfim, perder um botão afetaria sua identidade. Tem algo a ver com a relevância da mudança. Novamente, relevância é algo abstrato.

Nós sentimos relevância, mas cada um sente de uma maneira diferente. Acredito que todos concordariam que se Robert Downney Jr. tivesse sido trocado em Homem de Ferro 2, seria uma mudança relevante. Porém se eu tentasse dizer que trocar o ator que fazia o Máquina de Combate por Don Cheadle estragou o filme, duvido que alguém me daria atenção. Até porque a maioria das pessoas pensava que era o Cuba Gooding Jr. no primeiro filme. Não é, o ator se chama Terrence Howard, pode pesquisar.

Em outras palavras, o que é "pequeno" para uma pessoa, pode não ser pequeno para outra. Eu gosto dos meus personagens bem fiéis aos seus conceitos primordiais para que transpareçam suas nuances, algo que muitas vezes se perde em adaptações. No entanto focar apenas no que eu gosto ou o que eu quero, serve apenas pra mim. Só podemos descobrir o que é de fato relevante se descobrirmos o que é relevante para muitas pessoas. Filmes da Marvel são um bom exemplo onde várias concessões são feitas mas muitas vezes a identidade dos personagens originais ainda está lá.


Eu não acredito que The Legend of Zelda perdeu sua identidade quando Link deixou de ser canhoto em The Legend of Zelda: Twilight Princess para o Nintendo Wii, era uma mudança pequena. Eu acho no entanto que ele perdeu sua identidade quando seus jogos pararam de ser sobre se aventurar e começaram a ser sobre side quests, ficar falando com pessoas e tentando descobrir como resolver seus problemas mundanos.

Todos ficaram satisfeitos quando a série voltou as suas raízes com Breath of the Wild, isso significa que essas mudanças eram relevantes para um grande grupo de jogadores. Acredito que nesse pensamento tenhamos uma das chaves para resolver o problema do navio em relação a mudanças nos jogos. Guarde-o para mais tarde.

Dois navios

Digamos que todas as tábuas foram substituídas. Neste caso acho que a maioria concorda que este não é mais o Navio de Teseu. Mas quando isso aconteceu? Quando ele deixou de ser? No exato momento quando a última tábua foi substituída? Porém quando a última tábua é substituída ele não é tão diferente de como estava uma tábua atrás. Sua identidade se agarrou a uma única tábua? Quando mais da metade das tábuas foram trocadas?  Quando trocaram um terço? Entre duas a quatro? Trinta e sete? Não há uma resposta concreta para isso.

Então o filósofo inglês Thomas Hobbes decidiu complicar ainda mais o paradoxo. Imagine que as placas de madeira do Navio de Teseu não estavam apodrecendo, elas apenas estavam sendo substituídas ano a ano. Todos os anos uma tábua do navio era removida e uma nova tábua era colocada em seu lugar. Enquanto isso as tábuas velhas eram passadas para uma outra armação e lentamente formavam outra embarcação igual à original.

Então este novo barco que recebeu todas as tábuas do Navio de Teseu é o Navio de Teseu? Quando se tornou? Os dois são o Navio de Teseu? Nenhum deles? Essa vertente sobre a troca de tábuas entre dois navios nos ajuda a entender que não dá pra dizer por exemplo que o navio de Teseu deixa de sê-lo ao perder metade das tábuas, pois em dado momento ficaríamos ilogicamente com dois navios, quando ambos tivessem metade das tábuas.


Essa segunda interpretação criada por Hobbes diz: "Um objeto vai para onde suas partes vão". Porém essa interpretação também não soa correta já que identidade parece vir de algo mais do que apenas uma soma de todas as partes. Normalmente videogames mantêm seus títulos e personagens, como é o caso de God of War e Kratos, mas não necessariamente suas identidades.

Quando uma franquia de jogos deixa de parecer aquela franquia específica? Para algumas pessoas se o personagem e o nome estão lá, está valendo. Afinal o jogo é daquela companhia, ela faz o que quiser com ele. No entanto, a Nintendo poderia colocar Mario em um FPS com uma pistola e chamar de Super Mario World 3? Ele não seria reconhecido como um jogo de Mario apesar do título e do personagem. Assim como Super Mario World 2: Yoshi's Island não é lembrado como a sequência de Super Mario World mas como um jogo do Yoshi.

Sabemos que o novo God of War tem Kratos, mas há tantas outras coisas que não foram passadas dos antigos God of War para o novo que ele parece apenas uma única tábua de madeira que restou. Sua personalidade não é a mesma, a jogabilidade não é a mesma, seu estilo de jogo não é o mesmo e assim por diante. Qual God of War é realmente God of War? Os originais de ação ou este novo de aventura? Assim como o navio, não podem haver dois God of War atrelados ao mesmo título.

Se pegarmos toda a jogabilidade de um jogo e colocarmos em outro título e personagem, como em sucessores espirituais, ele é o mesmo jogo? Bloodstained parece Castlevania. Mighty No. 9 não parece Mega Man. Yooka-Laylee não parece Banjo-Kazooie... mas Banjo-Kazooie: Nus & Bolts também não. Bomberman Act Zero definitivamente não parece Bomberman. Wreckfest é praticamente FlatOut sem o título, talvez porque carros não são personagens?


Não temos uma resposta para isso e acredito que muitas vezes nos iludiríamos a julgar pela qualidade. Bloodstained poderia ser Castlevania porque é bom, mas Mighty No. 9 não poderia ser Mega Man porque não é tão bom. Porém tanto Castlevania quanto Mega Man já tiveram jogos ruins e isso nunca fez ninguém questionar sua identidade a ponto de serem excluídos da série.

Dizemos que é um "jogo ruim de Castlevania" ou um "jogo ruim de Mega Man", mas nunca "não é Castlevania" ou "não é Mega Man" para jogos ruins. A perda de identidade não tem a ver com a qualidade como âncora e temos que resistir a usá-la como tal.


Já te contei a definição de identidade?

Uma coisa que eu sempre falo é que Mario não era Mario antes de ser Mario. O personagem apareceu em jogos como Donkey Kong, Mario Bros. e Wrecking Crew, mas nada daquilo ainda era Mario. Mario passou a ser "Mario" quando Super Mario Bros. fez um sucesso estrondoso. Aquilo passou a ser Mario porque foi como a grande maioria do público conheceu o personagem. Ninguém diria que Mario perdeu sua identidade em Super Mario Bros. porque não tinha a marreta de Donkey Kong ou porque agora pulava em cima das tartarugas ao invés de bater no chão embaixo delas.


Então a Nintendo nos propõe um desafio com Super Mario Bros. 2 nos Estados Unidos, uma versão editada do jogo japonês Doki Doki Panic com Mario inserido no lugar do protagonista, pulando mal e tirando legumes do chão para matar inimigos. Aceitamos Super Mario Bros. 2 como Mario? Apesar de tecnicamente não o ser em seu cerne?

The Legend of Zelda 2: Adventure of Link é totalmente diferente do primeiro jogo, o aceitamos como The Legend of Zelda? Talvez esse último seja o caso que mais se assemelha a God of War, uma mudança completa da jogabilidade. Porém a identidade de explorar e se aventurar parece ter sido mantida em The Legend of Zelda 2 enquanto eu acredito que a identidade de God of War se perdeu.

Saber se um jogo, ou qualquer outra coisa, mantém sua identidade parece passar por como definimos a identidade em primeiro lugar. A identidade não está diretamente atrelada ao personagem ou título. Em jogos uma boa parte para estar relacionada à jogabilidade, mas arrisco dizer que o elemento principal é: a identidade de um jogo é o que a maior parte de seu público considera como sua identidade. Essa interpretação por sua vez passa necessariamente por como o jogo ficou popular.

Quando Super Mario Bros. ficou popular ele era um jogo sobre andar por fases para chegar ao final, comer cogumelos e salvar a princesa. Não era como Donkey Kong, Mario Bros. ou Wrecking Crew. Mario continuou fazendo basicamente as mesmas coisas até Super Mario World com pequenas mudanças e sem ter sua identidade questionada. Em Super Mario 64 porém de repente seu objetivo não era mais atravessar fases nem comer cogumelos. O desafio agora era resolver quebra-cabeças para ganhar estrelas.


Muitas pessoas sentiram que aquele não era o mesmo Mario que elas conheciam, quem conseguia jogar ele em 2D muitas vezes não conseguia jogá-lo em 3D, não entendia os objetivos, não se adaptava aos seus controles, não sentia prazer na sua jogabilidade. Para essas pessoas a identidade de Mario não passou para o jogo. Esse problema nunca aconteceu com Mario Kart que sempre foi o mesmo desde o Super Nintendo e nunca teve um momento em que as pessoas disseram "Isso não é Mario Kart".

Enquanto Mario Kart cada vez vendia mais em cada plataforma, a série Super Mario principal caiu em vendas. Jogadores pediam pelo retorno de Mario em 2D e quando isso aconteceu, com New Super Mario Bros para Nintendo DS e New Super Mario Bros. Wii para o Nintendo Wii, eles venderam muito mais do que Mario em 3D. Foram 30 milhões de unidades cada, enquanto Super Mario Odyssey chegou à metade disso. Há 15 milhões de pessoas que compraram um desses jogos e que não compram o outro.

Isso significa que uma franquia de jogos nunca pode mudar? Não é isso que estamos falando. Essa mudança porém precisa vir acompanhada da maioria de seu público já existente ou conquistar um novo público ainda maior, como aconteceu com Fire Emblem. Se uma franquia mudar para formas em que cada vez tem menos público, irá rumar para sua própria auto-destruição.

Qu4tro Causas

Ao trabalhar com a definição de coisas, Aristóteles definiu 4 "causas", que são na verdade como "explicações para o ser", pois não é o mesmo uso tradicional da palavra "causa" em nosso idioma. Elas eram: Formal (Eidos), Material (Hyle), Agente/Eficiente (Kinoun) e Fim/Final/Propósito (Telos). As duas primeiras acredito que não nos servem por serem mais voltadas para objetos físicos.


A Causa Formal significaria que definimos uma coisa pelo seu formato, como as mesmas tábuas de madeira organizadas de uma certa maneira são um navio, mas organizadas de uma maneira diferente podem ser uma casa. Poderíamos tentar esticar esse conceito para significar o design do jogo, a forma do jogo em si.

Se considerássemos a Causa Formal como a forma abstrata que os elementos de um jogo são organizados para formar um jogo de ação, de aventura, de RPG, talvez pudesse haver algum significado. No entanto acho que essa ideia é um tanto quanto frágil para colocarmos muito peso em cima dela. É algo interessante de se pensar, mas não nos levaria onde queremos.

A Causa Material é propriamente a matéria-prima de algo, por exemplo, um objeto que identificamos pelo material do qual ele é feito. Acho que para videogames o "material" significa que a sequência de um jogo de videogame precisa ser necessariamente um jogo de videogame, não poderia ser um jogo de tabuleiro ou qualquer outra coisa. Não é algo que se aplique no que estamos pensando. Agora vamos para as causas que realmente importam.

A causa Agente ou Eficiente seria quem criou o objeto e como. Aqui temos menos uma questão autoral e mais uma questão de transformação. Quem transformou aquela matéria-prima em um objeto? No God of War original foi David Jaffe com a equipe da Sony Santa Monica, enquanto o novo jogo foi Cory Balrog com o mesmo estúdio, porém com algumas pessoas diferentes obviamente. Segundo Aristóteles, duas coisas não poderiam ser a mesma coisa se fossem feitas por pessoas diferentes ou métodos diferentes.


Isso não deixa de ser uma resposta, porém talvez não seja satisfatória para nós. Por essa ideia apenas os desenvolvedores originais de um jogo e uma mesma equipe poderiam de fato passar a identidade dele para outro, mas não é o que vemos na prática. The Legend of Zelda: Breath of the Wild recebe perfeitamente a identidade de The Legend of Zelda sem seu autor, Bloodstained recebe a identidade de Castlevania com o autor mas com outra equipe.

Por mais que seja tentador ver exemplos de pessoas que não são os criadores das séries desvirtuando-as, como Cory Balrog em God of War, Eiji Aonuma assassinando a série com The Legend of Zelda: Skyward Sword ou Kenta Motokura criando algo que não é Mario em Super Mario Odyssey, parece difícil atrelar uma série inteira a apenas um autor.

Isso significaria que os novos Star Wars não são Star Wars porque não tem George Lucas e eu acredito que muitas pessoas sentiriam que isso é verdade, mas provavelmente por pensarem na qualidade do produto final e não realmente na identidade dele. Apenas lembrem-se que os Episódios 1, 2 e 3 também não foram muito bons e foram feitos por George Lucas. Eu não descarto completamente a possibilidade de o autor definir a identidade, mas vamos tentar não nos ater a essa resposta.

Agora a causa realmente interessante para nós: a Causa Final, Fim ou Propósito. Esta causa é simplesmente com que propósito aquela coisa foi feita. Claro que poderíamos presumir que jogos são feitos para divertir e terminar por aqui mesmo em um belo mundo de arco-íris no qual desde que um jogo seja "bom" e "divirta" ele faz parte de uma mesma série. No entanto existe um nível mais profundo de propósito nos jogos.


Cada tipo de jogo diferente exerce um tipo de trabalho diferente e mata uma fome diferente do jogador. Às vezes você quer uma refeição completa, às vezes algo para beliscar, outrora está com vontade de um doce. Cada jogo é feito para preencher uma sensação específica. Por isso muitas vezes jogos que são genéricos, repetitivos e anuais ainda fazem sucesso, pois podem oferecer uma experiência confortável e sem riscos para momentos em que não queremos nada pesado, como um mingau da Ubisoft.

Se pensarmos sobre o propósito dos jogos, de repente fica muito óbvia a diferença entre o God of War original e o novo God of War. Um é um jogo de extrema ação e violência, uma catarse selvagem do dia a dia pacato para despertar instintos primitivos. O outro é uma jornada focada na história, feita para fazer o jogador pensar e sentir-se como os personagens dessa história, com ação inserida apenas como conflito ocasional.

Ambos os jogos têm propósitos completamente diferentes, despertam sensações totalmente distintas, oferecem experiências que são praticamente dois jogos diferentes. O mesmo pode ser dito entre The Legend of Zelda: Breath of the Wild e The Legend of Zelda: Skyward Sword ou Super Mario Odyssey e New Super Mario Bros. Wii ou Super Mario 3D Land.

As analogias constantes com comida ao falar de jogos é porque todos nós sofremos de uma questão muito simples: fome. Quando não temos um certo tipo de jogo para jogar, ficamos com fome daquele jogo. Se uma empresa para de fazer um tipo de jogo ficamos famintos durante anos até outro surgir para tomar seu lugar.


Por mais que tentem dizer que o novo God of War é God of War, ele não mata a fome de quem jogava as versões antigas de God of War. Isso também vale para vários outros jogos que falamos aqui. Acredito que essa é a segunda chave para resolvermos essa questão, a fome deixada por jogos que abandonam seu propósito.

You got the Big Key

Como pudemos ver, em produtos de entretenimento, e especificamente em jogos, há dois pontos essenciais para que ocorra a transitividade de identidade, para que muitas pessoas considerem algo novo como uma nova versão ou novo capítulo de algo já existente. Nos distanciamos aqui da questão filosófica para tentar entender o que o público entende de maneira abstrata como um produto fazendo parte de uma franquia.

Primeiro: Aceitação. É preciso que um público igual ou superior ao da franquia original considere esse novo produto como parte da série original, normalmente atrelado a vendas. O novo God of War vendeu mais do que o primeiro jogo, então por essa lógica God of War agora é isso, um jogo focado na história que explora os sentimentos de paternidade de Kratos e seu filho chamado "Boooy".


No entanto faltaria o segundo elemento: Propósito. Para sabermos se uma nova direção foi realmente aceita temos que considerar as pessoas que começarão a ter fome pelo que aquele produto costumava representar e saciar, quantas clamarão por um retorno às origens daquele produto conforme essa fome aumentar. Hoje vemos isso com Star Wars, no qual dois episódios da nova trilogia foram basicamente um retorno aos moldes originais porque o público não aceitou as mudanças feitas como Star Wars.

Se nos próximos anos o novo God of War saciar completamente o público do antigo de forma que essas pessoas nunca mais peçam por um retorno ao que Kratos era antes, ele passa a se tornar o novo God of War. Pessoalmente eu prefiro o Kratos original, assim como prefiro os Fire Emblem clássicos, mas a questão é o que o grande público decidirá como a identidade daquela série.

Existe mais uma interpretação para o Navio de Teseu... mas já está tarde, vamos falar disso em um futuro artigo sobre nostalgia.

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segunda-feira, 2 de março de 2020

Precificação: Onde Nintendo e Sony estão errando


Um dia desse estava vendo uma discussão sobre jogos da família PlayStation vs jogos da Nintendo e sobre como os preços caem rapidamente no PlayStation mas não na Nintendo, logo isso deveria ser um sinal de valor e qualidade. Um detalhe que não estava na conversa mas incluo também aqui é a questão do Steam e suas promoções com descontos vertiginosos. Uma coisa curiosa é que ambos naquela conversa estavam errados, mas por motivos diferentes.

A questão aqui começa sobre duas coisas: Valor e Preço. Parecem a mesma coisa mas são diferentes. Valor é uma mistura entre o que o seu produto oferece de concreto, e a percepção abstrata que o público tem de quanto ele vale. Já preço é o valor monetário, ou seja, puramente concreto, que você está pedindo pelo seu produto. Se o valor supera o preço, é um bom negócio, se o preço supera o valor, achamos que algo está caro e não vale a pena gastar aquele dinheiro.

Preços na Sony

A Sony, Microsoft e a maioria das Third Parties utiliza um sistema de preço chamado Price Skimming, o qual é basicamente um sistema de camadas de cebola. Inicialmente um jogo é lançado por US$ 60 que é aproximadamente o máximo que o público está disposto a pagar em um lançamento, e desde o seu lançamento seu preço vai baixando, seja natural ou artificialmente, com o intuito de pegar novos consumidores que não pagariam os US$ 60 iniciais, tanto por não verem qualidade quanto por limitações financeiras.

De cara não é difícil perceber o quanto Price Skimming é anti-ético. Se cobra mais de quem dá mais valor ao produto, seus fãs mais fiéis. Os consumidores que veem mais valor no seu jogo são punidos com preços mais altos, enquanto os que acham que seu jogo não vale tudo isso recebem descontos posteriormente. Não é um modelo justo e nem desejável porque nesse molde seus fãs são explorados e muitas vezes se sentem enganados quando veem o quanto o produto caiu de preço depois.


O processo de queda de preço como um todo afeta a percepção de valor do jogo. Se já é esperado que o preço caia logo em seguida nos próximos meses, cada vez mais pessoas esperam para comprá-lo com o desconto. O próprio presidente da Nintendo, Satoru Iwata, falou sobre isso uma vez ao discutir precificação do Wii e DS, sobre a qual falaremos depois.

Mesmo quando é um bom jogo, mas o preço cai, diminui-se a percepção de valor dele e presume-se que ele não é tão bom quanto um jogo cujo preço não caiu. Até mesmo vemos casos em que isso é completamente verdadeiro como no caso de bombas como Anthem e Jump Force. Como não estavam vendendo bem, rapidamente seu preço caiu para tentar não encalhar o estoque. Normalmente quanto mais próximo do lançamento vem o corte de preço, pior é o jogo.

Preços na Nintendo

Então, Price Skimming é ruim porque o preço cai e os consumidores se sentem enganados, certo? Aí temos a Nintendo com jogos que lançam a US$ 60 e... ficam nesse preço quase que permanentemente... e também está errado. Até o GameCube a Nintendo fazia Price Skimming também. Praticamente bastava um jogo vender mais de 1 milhão para ela lançar uma versão de baixo custo em sua linha "Player's Choice" que custava apenas US$ 20. Era muito mais fácil comprar jogos da Nintendo naquela época e o GameCube era uma boa opção como segundo console.

Então veio o Nintendo Wii e o Nintendo DS liderados por Satoru Iwata e "A Estratégia do Oceano Azul", sobre a qual já falamos extensivamente aqui no blog em diversas ocasiões. Existem alguns pontos simples nessa estratégia que falam sobre "Valor excepcional", encontrar algo que gere uma percepção de valor incrivelmente alta, e não abaixar seus preços nunca pois queda de preço equivale a perda de valor.

Preço de banana, sacou?

Os jogos do Nintendo Wii e Nintendo DS não caíam de preço, eles ficavam no mesmo preço durante praticamente toda a sua vida. Havia uma percepção de valor alta sobre eles, então as pessoas não se incomodavam tanto de pagar muito. Este modelo é desejável e rentável, porém apenas se você estiver seguindo à risca "A Estratégia do Oceano Azul", algo que a Nintendo parou de seguir um pouco depois da metade da vida do Wii.

Por exemplo, como em um produto de "Valor Excepcional" a relação entre valor e preço pende mais pelo abstrato e o preço não será reduzido após o lançamento, você precisa pensar melhor no preço de lançamento. Um jogo como Arms que não tem o mesmo nível de produção de um The Legend of Zelda não deveria ser vendido pelos mesmos US$ 60.

Na época do Wii e DS a Nintendo entendia isso, mesmo que aplicasse pouco. Alguns jogos saíam mais baratos como Endless Ocean e Brain Age, mas a maioria ainda mantinha o preço de lançamento. Vale lembrar que na época esse preço de lançamento no Wii ainda era US$ 50 enquanto todas as outras empresas já haviam subido seu preço para US$ 60.

Este modelo de preços que não caem é muito lucrativo para a empresa, porém ele exige necessariamente que você meça os seus preços de lançamento ou então começará a rumar para um caminho elitista onde as pessoas se esforçam para pagar em troca da suposta alta qualidade, pela marca atrelada ao produto, não tão diferente da Apple.


Dá pra ver exatamente quando a Nintendo abandonou a Estratégia do Oceano Azul no Wii pois foi quando eles lançaram a linha "Nintendo Selects", jogos de Wii mais baratos. Porém não foi uma boa ideia manter a política de não baixar preços em produtos de oceano vermelho como o Wii U, 3DS e Switch, pois isso está deixando os jogos da Nintendo muito caros. Muitos fãs da Nintendo atualmente reproduzem o mesmo discurso que fãs da Apple e têm uma lealdade quase elitista à marca.

Preços na Microsoft e Game Pass

Assim como a Sony, a Microsoft e as Third Parties no seu console praticam Price Skimming e já falei tudo sobre isso acima. No entanto, há um outro modelo de preços no Xbox em alta e que precisamos muito falar sobre, o Xbox Game Pass. Por uma assinatura mensal jogadores podem jogar mais de 200 jogos em uma espécie de Netflix de games.

A assinatura custa US$ 9,99, por mais de 200 jogos que nas lojas são vendidos por US$ 60 quando são lançamentos e US$ 30 e US$ 20 quando são remakes ou jogos independentes. Essa conta simplesmente não fecha. Não se sabe exatamente quanto a Microsoft está pagando aos desenvolvedores, está tudo bem escondido.

Alguns desenvolvedores já comentaram que é feito um pagamento adiantado baseado no que a Microsoft acha que o jogo vale, semelhante aos acordos de exclusividade da Epic Games Store. Não sabemos se é de fato o caso, mas parece ser o mais provável. A questão é, como a Microsoft está fazendo dinheiro vendendo uma coleção que valeria mais de US$ 200 a US$ 2 mil a US$ 10 por mês? A resposta é que talvez não esteja.


Como sabemos, a Microsoft tem dinheiro para queimar e o Xbox One foi um grande fracasso pra ela. Faria sentido antes de lançar uma próxima geração de produtos tentar limpar sua barra com um serviço excepcional, algo que pode não continuar na próxima geração. A Sony fez o mesmo com a PlayStation Plus que quando foi lançada no final da vida do PlayStation 3 só trazia jogos bons e depois passou a trazer jogos fracos no PlayStation 4.

Para desenvolvedores isso pode parecer bom, afinal eles têm mais estabilidade e não recrimino quem nunca fechou uma parceria de grande porte ficar satisfeito com milhares de dólares. Porém o Game Pass rouba os indies de seu momento "sink or swim", quando lançam seu jogo e descobrem se ele vai sobreviver ou afundar.

A longo prazo o Game Pass também significa curadoria, o que por um lado é bom pois o usuário leigo pode experimentar mais e ter algo mais voltado para seu gosto, porém por outro lado temos grandes companhias ditando o que está na moda, o que você vai ver com mais frequência, quais jogos têm mais chance de se tornarem seus jogos favoritos.

Preços no Steam

O Steam foi a loja que começou com promoções de descontos vertiginosos e isso agradou muito aos usuários do PC. Criou-se hype nas Steam Sales e desde esse princípio eu já vi um risco muito grande de desvalorização dos jogos. O que de fato aconteceu, já que hoje Flash Sales e descontos enormes são comuns também entre a Sony, Microsoft e Third Parties.


No entanto, muito se pode perdoar do Steam já que o mercado de PC era um faroeste antes dele. Se a opção for entre vender jogos muito barato e pirateá-los, ainda é mais vantajoso para a produtora que o jogador pague um pouco. Pirataria não existe atualmente nos consoles, no entanto, então emular essas super promoções prejudicou mais ainda a noção de valor em troca de mais compras compulsivas, pessoas que compram jogos porque estão baratos e muitas vezes nem mesmo os jogam.

Hoje o Steam sofre um problema de "discoverability", a capacidade de descobrir novos jogos em meio ao seu mar de novos softwares. Um bom jogo pode ser lançado no Steam e as pessoas simplesmente não saberem sobre ele porque está enterrado no meio de vários outros de baixa qualidade, não jogos subjetivamente ruins, mas jogos ruins de verdade, feitos sem qualquer esforço, que tentam enganar usuários a comprá-los.

O que isso tem a ver com preços? Para serem sequer vistos, muitos jogos se lançam em promoções sem precisarem realmente baixar o seu preço. E então tem jogos ruins que baixam seu preço para aparecerem nas mesmas promoções. É um jogo de gato e rato.

Preços nas Third Parties

Uma das formas que as Thirds Parties, empresas terceirizadas que publicam em várias plataformas, como Elecronic Arts, Activision, Bethesda, Ubisoft e etc, têm tentado se manter lucrando infinitamente é através de novos modelos de monetização. Tudo começou com a venda de DLCs e quando não reclamamos o suficiente disso, o buraco só começou a ficar mais fundo.


Talvez muitos não lembrem dos "Online Pass", um passe normalmente de US$ 10 que permitia jogar um certo game de uma empresa online. Eles vinham com os jogos novos, mas se você os comprasse usados era preciso comprar o Online Pass separadamente. Na época o medo das empresas eram jogos usados, mas logo elas viram que havia formas melhores e mais indiretas.

Ao invés de vender passes para jogar online, passaram a vender passes de conteúdo, os "Season Pass", além de DLCs separados. Hoje ao comprarmos um jogo de luta há temporadas separadas de conteúdo sendo vendido, com personagens diferentes de acordo com a temporada comprada. Vale no entanto lembrar que após um certo tempo costuma ser lançada uma versão com vários dos extras anteriores, normalmente antes de lançar novamente outra temporada, fazendo os consumidores realmente de otários.

Isso para não falar de "Lootboxes", as caixas com conteúdo surpresa, e outras mecânicas que estão puramente imitando jogos de azar. Não precisamos falar sobre, pois aparentemente quem vai acabar tomando essa decisão no lugar das produtoras e jogadores será o governo de cada país. Muitos já proibiram Lootboxes e as equipararam a jogos de azar.

De volta aos blocos primordiais

Todas essas técnicas de precificação estão erradas, simples assim. Elas são excessivamente confusas, mirabolantes, às vezes anti-éticas, tudo porque o mercado de jogos não tem crescido, então só sobrou a alternativa de extrair mais dinheiro das mesmas pessoas. Ninguém quer expandir o mercado mas todo mundo quer mais dinheiro.


Não há maior sinal de que todas essas formas de vender estão erradas do que um simples fato: Minecraft. Um jogo como Minecraft simplesmente nunca surgiria ou não pagaria o suficiente ao seu criador em todas essas formas de vendas. Qual a fórmula tão fantástica de venda de Minecraft? Você compra, o jogo é seu. Não irão cobrar por expansões, nem por conteúdo extra (ao menos na fase pré-Microsoft), afinal você já pagou por ele. E assim Minecraft se tornou um dos jogos mais vendidos de todos os tempos e deixou seu criador rico.

Se o criador de Minecraft não tivesse muita fé no jogo e lançasse ele no Game Pass ainda meio incompleto, talvez ele fosse deixado de lado e nunca recebesse todas as atualizações até a versão 1.8 que o tornaram tão relevante. Como um criador de primeira viagem, ele poderia ter pego alguns milhares de dólares e ido fazer outro jogo para ganhar mais um pouco, sem jamais saber que seu jogo valia 2,5 bilhões.

A pura definição de comércio é muito simples, um substituto para o escambo. Antes duas pessoas trocavam A por B, enquanto hoje duas pessoas trocam A por uma unidade monetária que depois é usado com uma terceira para comprar B. Comércio é simplesmente dar às pessoas o que elas querem em troca de dinheiro com base no que de fato valem. A ideia de lucrar em cima de alguém não é particularmente inerente ao conceito de comércio e São Tomás de Aquino já avisava que lucro excessivo era imoral e um pecado.


Hoje parece que comércio é o que menos acontece, já que todos tentam nos vender o mínimo possível, apenas nos permitindo uso, sem capacidade de revenda. Você não possui praticamente nenhum dos seus jogos digitais no PlayStation, Xbox, Nintendo Switch e PC. Nunca poderá revendê-los por um valor maior do que pagou se ficarem raros, não poderá deixá-los de herança para seus filhos depois que morrer.

Por que pagamos tanto para empresas que nos dão tão poucos direitos? Simplesmente porque não temos alternativa quando queremos jogar. Minecraft foi um modelo extremamente honesto de venda e isso se refletiu em seu incrível sucesso. Porém, cada vez é mais raro que nos ofereçam uma venda honesta. Isso nos leva a essas terríveis conversas sobre precificação onde simplesmente ninguém está certo.


segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

Review de We Happy Few: We All Fall Down


We All Fall Down é o terceiro e último DLC de We Happy Few, o qual segue os passos de Victoria Byng, uma personagem que conhecemos apenas por alto durante a campanha de Ollie e filha do General Byng. Este é o mais longo dos DLCs e o que mais parece com uma quarta campanha, enquanto os outros soam mais como histórias paralelas, porém isso acaba sendo uma coisa negativa pois traz mais linearidade e menos diversão.

Na campanha de Ollie ele faz com que Victoria pare de tomar a droga Alegria, o que a liberta e faz com que ela comece a notar a realidade de que as pessoas estão famintas pelas ruas. Isso a lança em uma jornada para destruir os suprimentos de Alegria para que o povo desperte também enquanto vê alucinações de sua mãe que foi deportada como espiã. O problema aqui é: já destruímos a distopia de We Happy Few com os outros três personagens, precisávamos mesmo fazer isso de novo?

As missões desse DLC são extremamente lineares e se resumem a ir de um lugar a outro da cidade de Wellington Wells e vendo um pouco mais do que aconteceu enquanto a cidade era destruída. Diferente dos outros dois que tinham uma história própria que funcionava muito bem, We All Fall Down é um puxadinho de uma história que já estava completa.


Assim como nos outros DLCs há mais ênfase em combate e Victoria conta com uma arma própria, um chicote bastante eficiente. Eventualmente ela encontra também uma pistola capaz de atordoar os inimigos, mas não é tão útil quanto eu gostaria. Há também um sistema de upgrade ao coletar Engenhocas espalhadas pelo cenário porém há só uns dois upgrades mais essenciais e o resto é superficial. Se houvesse upgrades mais interessantes a jornada e exploração seriam mais divertidas.

Um dos problemas que eu tive com o combate é que se você estragar uma parte de stealth há muitos inimigos de uma só vez para lutar com você. O combate em si não é difícil mas a personagem toma muito dano por golpe e é fácil morrer. Há uma grande quantidade de Bálsamos de Cura espalhados pelo mundo, mas durante os combate não dá pra se curar, então não resolvem esse problema.

Além do combate a segunda parte que compõe esse DLC são desafios de plataforma, os quais não combinam nada com a jogabilidade e o cenário de We Happy Few. O chicote de Vicky pode ser usado para acessar áreas superiores próximas ao segundo andar e telhado das casas, mas é difícil entender quais caminhos você pode percorrer e enxergá-los. Nas alturas os caminhos às vezes são feitos de tábuas de madeira, canos e jardineiras suspensas, mas é difícil ter certeza se um lugar é acessível para pisar ou apenas um enfeite de cenário.


Para quem já jogou We Happy Few, não há motivo para retornar por We All Fall Down, mas talvez para quem ainda vá conhecer o jogo possa gostar de ter "quatro" campanhas ao invés de três. No entanto como DLC os outros dois anteriores "They Came From Below" e "Lightbearer" foram mais divertidos e ofereceram um ponto de vista mais diferenciado.

O fato de que os personagens dos DLCs não podem ser usados no modo sandbox do jogo é um grande desperdício, já que isso realmente combinaria com as partes mais "rogue" da aventura e adicionaria ainda mais valor ao passe de temporada.

5/10

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Review de We Happy Few: Lightbearer


Re:Impressões de They Are Billions

Atualização: Alguns novos parágrafos foram adicionados ao final desse artigo para refletir o estado do jogo após a atualização de 3 de Dezembro para PlayStation 4 e Xbox One.


They Are Billions é um jogo que me chamou a atenção assim que eu vi o conceito, pois eu mesmo já havia pensado em fazer um jogo de zumbis com uma quantidade absurda de mortos-vivos, então parecia legal ver em ação.Fui tentar jogá-lo no PlayStation 4 e qual a minha surpresa ao ver que o jogo não foi nem um pouco otimizado para consoles. Claramente é um jogo com muito potencial mas várias coisas o seguram, especialmente a plataforma.

A interface é extremamente não amigável para consoles, é um port direto do PC. Isso significa letras pequenas para ler, descrições longas em janelas minúsculas, pois presume-se que o usuário esteja com a cara colada na tela. Tudo é excessivamente complicado e complexo pois foi feito pensado em um mouse e atalhos de teclado.

Há apenas dois modos de jogo: Sobrevivência, que é o modo principal e Desafio da Semana, que traz desafios semanais para jogadores mais avançados. Não há muito espaço para manobrar caso você não se dê bem de cara com o modo principal e a maior ausência é de um tutorial, o qual é completamente necessário em um jogo como esse. Acabei tendo que aprender a jogá-lo no YouTube.

O conceito é simples, o jogador têm um período de tempo para preparar sua comunidade e após esse prazo zumbis começarão a atacá-la. No entanto, mesmo no nível fácil não é tempo suficiente para se preparar adequadamente e basta que um zumbi chegue em uma habitação para contaminar todos e começar um efeito dominó.


Perder é comum demais e se isso apenas significasse que o jogo é desafiador, sem dúvida ele teria lá seu público. Porém o real problema é que a porta de entrada é estreita, é difícil começar a jogá-lo. Uma vez que aprenda a jogar então perceberá que há uma forma única de sobreviver, seguir um certo caminho fixo, sem muito espaço para sair dele. Isso torna o jogo um pouco desinteressante porque não tem muito espaço para criatividade.

Há vários recursos que você precisa ficar atento como dinheiro (ouro), energia, madeira, pedra, mão de obra e comida. É coisa demais para ficar atento o tempo todo e apesar de isso ser bem comum em jogos de estratégia para PC, é excessivamente complexo para um console. É como um nó de marinheiro, há pontos demais de interesse para ser intuitivo.

Ao tentar criar uma nova construção, talvez você não tenha mão de obra, então você tenta criar casas, mas não há comida suficiente, então você cria uma cabana de caçador para ter comida, porém não consegue posicioná-la tão longe pois é preciso colocar torres de tesla para aumentar seu alcance, mas não consegue construi-las porque não tem energia, não pode construir um moinho para gerar energia porque falta dinheiro e tudo que você queria era um misto-quente.

Uma coisa engraçada é que os gráficos do jogo são bem feitos, você pode dar zoom e ver tudo em detalhes, mas para a interface não há zoom. Então você pode ver muito bem cada detalhe em um soldado, mas não consegue ler direito o que os menus dizem. Se houvesse uma opção de aumentar o tamanho do hud ajudaria bastante.


Com toda essa dificuldade e alto custo de entrada eu nem cheguei perto de ver o que o jogo tinha de melhor para oferecer, as grandes hordas de zumbis atacando e sua comunidade sendo capaz de se defender. É aqui que um modo mais fácil realmente faria diferença, permitir que mais jogadores chegassem na parte realmente interessante do jogo.

Cada partida que eu tentava jogar envolvia uma longa preparação e acabava rapidamente ao receber um ataque. É como ser atacado por um Zerg Rush em Starcraft e perceber que havia um timer invisível contando sua derrota porque você não estava administrando seus recursos rápido o suficiente. Alie a isso o fato de que não temos um mouse nos consoles e é uma receita para não se divertir.

They Are Billions é um jogo que eu queria ter gostado mais porque a premissa é bem legal, mas a execução deixou a desejar. Pode valer a pena jogá-lo no PC se você curte jogos de estratégia com riscos e punições altos. Porém definitivamente não vale a pena pegar uma das versões para console.

Atualização de 3 de dezembro

Normalmente eu não faço impressões contínuas de jogos, mas como They Are Billions parecia um bom jogo que apenas teve problemas em sua conversão para consoles eu resolvi dar uma chance quando uma nova versão foi lançada que atacou pesadamente alguns dos principais problemas que eu tive com ele. Ainda assim faltou um pouquinho para realmente resolver todos os defeitos e realizar seu potencial.


Duas das minhas principais reclamações com o jogo eram sobre falta de conteúdo e controles mal adaptados e ambas as questões foram melhoradas. Foi adicionado um modo campanha no qual o jogador precisa expandir os domínios do imperador Quintus Crane para levar a humanidade para fora das muralhas através de várias missões diferentes. Enquanto os controles não estão fantásticos ainda assim melhoraram bastante. A fonte do jogo no entanto ainda é pequena e mais adequada a um PC.

O mais importante no entanto é que agora o jogo tem um tutorial para ensinar como jogá-lo e isso era algo que estava fazendo muita falta. Nesse momento eu pensei que They Are Billions iria se catapultar para ser o jogo que deveria ser. Então fui pego de surpresa quando durante o tutorial um zumbi veio do nada e contaminou toda a minha colônia como sempre.

É estranho porque o jogo não te prepara para combater zumbis nesse trecho do tutorial. Você está apenas aprendendo a construir e manter sua colônia quando de repente, ela acabou. Isso continua a limitar o jogo apenas para quem já sabe como jogá-lo e impede que ele chegue ao público dos consoles.

sexta-feira, 22 de novembro de 2019

Review: Death Stranding é um dos jogos mais originais da década


Death Stranding é o mais novo jogo do produtor Hideo Kojima, criador da série Metal Gear e atualmente um desenvolvedor independente após uma saída um pouco conturbada de sua antiga produtora, a Konami. Agora como fundador da Kojima Productions o famoso designer nos apresenta seu primeiro jogo, inicialmente exclusivo para o PlayStation 4 e com estimativa de lançamento para 2020 no PC (e acredito que chegue ao Xbox One um pouco depois). Death Stranding é também o jogo mais original e profundo que eu joguei nos últimos anos.

História

O mundo de Death Stranding é marcado pelo evento que dá nome ao jogo, uma invasão de criaturas invisíveis chamadas B.T.s (Beached Things) que dizimaram quase toda a população. O acontecimento na verdade foi fruto de uma conexão entre o mundo dos vivos e o dos mortos, de forma que os B.T.s são como fantasmas. Estranhamente quando eles absorvem algo vivo há uma explosão gigantesca, quase como se fosse matéria encontrando antimatéria.

Os poucos sobreviventes da catástrofe vivem agora em abrigos isolados e o mundo está praticamente abandonado pois essa conexão com o mundo dos mortos também introduziu uma terrível chuva temporal, cujas gotas são capazes de envelhecer tudo que tocam. Rapidamente toda a vida animal pereceu, grandes construções ficaram em frangalhos e a natureza retomou boa parte do mundo. Não é um lugar agradável para passar suas férias.

Esse mundo dos mortos é chamado em Death Stranding de "A Praia" e nem tudo sobre ela é negativo. Dentro da praia o tempo passa lentamente, então é desenvolvida uma tecnologia computacional que possa se aproveitar disso, a rede quiral, na qual simulações e dados passam pela praia e saem quase instantaneamente em outro lugar (pense numa internet ainda mais potente porém com menos gatos). No papel de Sam Bridges, interpretado pelo ator Norman Reedus (The Walking Dead), você tem que conectar esses abrigos à rede quiral para formar uma sociedade novamente.


O próprio Sam não é tão fã da ideia, mas é arrastado para essa jornada. Sua mãe é a presidente da coisa mais próxima de uma país que sobrou, a CUA, "Cidades Unidas da América", e morre devido a um câncer logo no início do jogo. Sua irmã tentou a mesma viagem anteriormente e acabou capturada por uma facção terrorista chamada Homo Demens que não quer ver o mundo reconectado. Agora Sam precisa conectar a rede e resgatar sua irmã para que ela assuma como nova presidente.

Além do protagonista, sua irmã e das Cidades Unidas da América há um personagem a mais cuja história se torna bem relevante: B.B., o Bridge Baby. Para permitir que entregadores como Sam enxerguem os B.T.s foi desenvolvida uma tecnologia na qual bebês retirados do útero são convertidos em ferramentas graças a sua natureza bem no meio entre o mundo dos vivos e dos mortos.

Sempre que Sam conecta-se a B.B. após uma noite de descanso vemos estranhos flashbacks com um personagem interpretado pelo ator Mads Mikkelsen (da série Hannibal) que se tornam sua própria história paralela. Mads por sua vez está em uma performance avassaladora que facilmente poderia carregar o jogo todo nas costas.


No inicio o enredo demora para engrenar, com mais cenas cinematográficas no início do jogo para estabelecer esse mundo. Uma vez que essas explicações iniciais acabam, no entanto, há uma proporção extremamente maior de jogo do que de cenas para assistir. Apesar de ter muitos atores este não é um "jogo-filme" como costumam atribuir ao estilo de Hideo Kojima.

A história é sempre oferecida como um extra para agradar ao jogador após suas tarefas árduas e contada através de vários fragmentos que ora se juntam ora são desconexos até finalmente reunirem-se todos no final do jogo e fazerem sentido.

Jogabilidade

É justamente ao começar a jogar que as coisas ficam muito complexas. Em teoria a jogabilidade básica de Death Stranding é um simulador de entregas da Amazon ou Sedex como todas as piadas antes do jogo ser lançado sugeriam. Seu objetivo é pegar encomendas e levar de um lugar a outro do mapa com complexos subsistemas que mantêm a experiência sempre muito dinâmica.

O principal inimigo de Sam é o relevo acidentado que ele precisa atravessar até seu destino: rios, montanhas, abismos, todo tipo de obstáculo estará em seu caminho e você tem ferramentas para atravessá-los como escadas, cordas e itens que criam estruturas como pontes e geradores. Aqui entra a fase de planejamento do jogo. Cada item que você leva tem peso e torna mais lento e difícil chegar ao seu objetivo. O ideal é viajar o mais leve possível, mas mesmo analisando bem o mapa é provável que você seja pego despreparado por alguma situação.


Inicialmente equilibrar as coisas é um grande desafio. Não só a quantidade de peso, mas também o seu posicionamento afetam o equilíbrio de Sam. Uma pilha de cargas leves com uma pesa no topo irá sempre tombar ao mudar de direção, cargas pesadas sempre devem ficar mais embaixo. É possível até prender algumas cargas no próprio traje para diminuir essa torre de itens. Felizmente o jogo tem uma função de arrumação automática que poupa seu tempo.

Ao andar com a carga a inclinação do solo também afeta o equilíbrio. Os gatilhos L2 e R2 são usados para equilibrar a carga ao puxá-la pelas alças da mochila pela esquerda ou direita. Segurar os dois gatilhos por sua vez firma bem a carga e permite se reequilibrar, ao custo de fôlego. No início boa parte do jogo é andar enquanto se equilibra, tropeça e tenta chegar inteiro no seu objetivo.

Após muitas horas de jogo a mecânica de equilíbrio se torna um pouco menos importante pois são introduzidos vários tipos de auxílio. Há exoesqueletos que permitem se mover mais rápido, carregar mais peso ou andar melhor em terrenos acidentados, há veículos como motos e caminhões para levar a carga quando não há muitos obstáculos pelo caminho e é possível até mesmo instalar um estabilizar na mochila.

Ocasionalmente seu caminho é interrompido também por inimigos de verdade. Os B.T.s são os mais problemáticos pois ao encontrá-los é preciso entrar no modo stealth e tentar passar sem ser detectado. Mesmo com a ajuda do BB eles só ficam visíveis quando você está parado, mas dá pra planejar seu movimento para não encostar neles. Se chegar muito perto é possível até prender a respiração de Sam para que eles não o ouçam, passando a sensação de um jogo de terror.


Com o tempo você ganha formas de lutar com eles, graças a armas feitas a partir do sangue de Sam, mas não é muito fácil. Caso um B.T. te pegue e você não consiga fugir ele te arrasta para uma luta contra um grande chefe que caso vencido libera a área pra você. O problema é que como a arma usa o próprio sangue de Sam, é possível drená-lo demais durante o combate. Por sorte caso fique sem armas surgirá uma ajuda inesperada.

Os outros inimigos são humanos. Os Mules são pessoas que um dia já foram entregadores como Sam mas enlouqueceram e hoje procuram pacotes por compulsão e perseguirão o jogador para pegar sua carga. No começo você quer passar pelo território dos Mules o mais rápido possível para evitar problemas, mas no fim do jogo eles viram bons acampamentos para saquear em busca de recursos.

Não é muito difícil enfrentar Mules com socos, chutes e armas não-letais, mas eles podem causar problemas com suas lanças elétricas que podem até parar veículos. Há também os Terrorists, que são à primeira vista como os Mules porém mais difíceis por estarem armados e atrás de você ao invés da sua carga.


Há vários outros pequenos subsistemas em ação o tempo todo. É possível subir de nível para ganhar cada vez mais equilíbrio, fôlego e outros atributos, há um sistema de estresse de B.B. que fica irritado quando você cai ou e golpeado e precisa ser ninado com movimentos no DualShock 4 e obviamente a chuva temporal é capaz de danificar sua carga, então você precisa ficar esperto quando chove.

Depois de explicar como tudo funciona então vem um problema: Nada disso é divertido.

Strand System

A grande novidade de Death Stranding, que fez com que Kojima dissesse que o jogo pertence a um novo gênero chamado "Strand", é o seu "Strand System". Este sistema permite interação indireta entre os jogadores como itens e construções aparecerem no seu mundo quando na verdade foram colocados por outra pessoa em seus próprios mundos.

A primeira vez que você explora uma nova região em busca de um novo ponto para conectar a rede quiral, você está basicamente sozinho, isolado, "stranded". Ocasionalmente aparece uma escada ou corda deixados por outro jogador e você pode utilizá-los para facilitar sua jornada e também seguir o mesmo caminho que outra pessoa antes de você seguiu. Aqui a jogabilidade não é muito diferente do que já descrevi antes, basicamente ir de A a B para completar seu objetivo.


Ao conectar a rede quiral no entanto, você se conecta também aos outros jogadores e subitamente seu mundo se transforma. De repente aquele mundo desolado é invadido por trilhas, criadas pelo desgaste de vários jogadores que passaram pelo mesmo local em seus mundos. Você nunca os vê, mas vê o reflexo de suas ações. Há pontes que outras pessoas construíram, estradas, abrigos, torres de vigia, geradores, tirolesas, cargas perdidas por outros. E assim como eles construíram eles verão as coisas que você construir também.

A união de todos os jogadores torna mais fácil se locomover pelo mundo graças aos caminhos construídos por eles. Eu cheguei a criar uma estrada e quando terminei havia várias outras criadas por outras pessoas. O mistério de como o sistema funciona ajuda para que você não fique parado esperando que os outros façam as coisas, já que nunca se sabe quando elas vão acontecer. Sempre que você precisar explorar uma nova área estará sozinho de novo e isso sempre me deixava ansioso para conectar o próximo abrigo na rede quiral e ver o que os outros estavam fazendo e.

Eu disse que a jogabilidade de Death Stranding não era divertida, mas há um porém... ela não está tentando ser. Death Stranding não está tentando ser divertido. Os jogos de Hideo Kojima sempre têm algum tipo de mensagem, normalmente despejada sem muita sutileza em cenas com diálogos exposicionais, mas agora que ele tem total controle criativo aparentemente a mensagem está diretamente na jogabilidade.

O mundo de Death Stranding quando você está sozinho é vazio, desolado, depressivo, frio, hostil, repleto de morte, pessoas sem esperança e com músicas melancólicas. Ele não está tentando fazer você se divertir ou se sentir bem. O jogo parece querer evocar emoções, provocar desconforto, desespero e solidão, enquanto ao mesmo tempo te convida a procurar um raio de luz no meio desse céu nublado com um arco-íris de cabeça para baixo.


O Strand System cria uma questão sobre qual é a jogabilidade principal de Death Stranding, se é a que você joga diretamente ou a que você não joga. Se é o simulador de entregas ou a interação indireta com outros jogadores. Talvez uma combinação equilibrada de ambos. Se a jogabilidade fosse repleta de ação provavelmente o Strand System seria irrelevante apenas como um elemento a mais.

Imagine como seria fácil dar uma arma na mão de Sam, colocar alguns postos inimigos no mundo e transformá-lo em um jogo de ação tradicional. E esse jogo já existe, é Metal Gear Solid 5. Se Death Stranding fizesse exatamente isso seria aclamado com ótimas notas porque seria algo fácil de entender e divertido, até mesmo eu gostaria mais dele. Porém seria um jogo totalmente diferente do que é atualmente e não teria instigado essa conversa se um jogo precisa ser divertido para ser bom.

Há uma forte mensagem anti-violência em Death Stranding. Apesar de haver combate, você não pode matar ninguém, pois mortes significam mais B.T.s. Perto do final do jogo um personagem diz: "Uma arma não vai ajudar você aqui. Mas ela ainda tem um papel a desempenhar", que pode ser interpretado literalmente ou como uma metáfora. Death Stranding tem armas e combates mas às vezes isso parece fora do lugar em meio ao resto do jogo que não é focado em confronto.

É como se Death Stranding fosse baseado em dois pilares, o do jogo de entregas e o do Strand System, uma jogabilidade se alimentando da outra em perfeita simbiose. Talvez adicionasse um terceiro pilar com a história, pois ambas as jogabilidades são mais prazerosas enquanto se persegue a jornada da história, com missões mais elaboradas, cenas como recompensas e mistérios para desvendar.


Ainda assim o jogo se sustenta mesmo após a campanha acabar pois há mais áreas extras para conectar e muito para construir no mundo. As estruturas colocadas por você e outros jogadores apodrecem com o tempo devido à chuva temporal, então é preciso cuidar delas, porém ao mesmo tempo há estruturas demais para uma pessoa sozinha cuidar. Se eu não cuidasse daquele mundo, ele estragaria, mas eu também não poderia cuidar do mundo inteiro sozinho por mais que quisesse.

Particularmente eu gastei horas recuperando cargas perdidas por outros jogadores em áreas perigosas repletas de B.T.s e Mules para devolvê-las, consertando estruturas e melhorando as condições de locomoção. De certa forma aquele mundo se tornou algo confortável, algo "meu" que na verdade era "nosso" entre um grupo de pessoas que nunca sequer interagiu.

Gráficos e Som

No setor técnico Death Stranding não tem falhas. Seus gráficos são alguns dos mais impressionantes no PlayStation 4 com um mundo extremamente vasto e detalhado praticamente sem loadings. As animações também são muito boas, afinal não deve ser nada fácil criar uma animação de alguém quase escorregando várias vezes em solo escorregadio e depois se reequilibrando. Entre alguns dos detalhes gráficos mais impressionantes está a ferrugem que se acumula em veículos e cargas quando eles ficam expostos à chuva temporal.

A reprodução digital dos atores traz os rostos mais realistas e emotivos que eu já vi. Suas expressões surpreendem e eles parecem até mesmo ter músculos por baixo da pele. Aparentemente Hideo Kojima cobrou todos os favores que tinha porque o jogo tem um grande elenco de atores, suficiente para preencher 2 ou 3 filmes.


Temos Norman Reedus e Mads Mikkelsen como já mencionados, Lindsay Wagner (A Mulher Biônica), Margaret Qualley (The Leftovers), Troy Baker (The Last of Us), Léa Seydoux (Bastardos Inglórios), Tommie Earl Jenkins (Jersey Boys) e participações especiais dos diretores Guillermo del Toro e Nicolas Winding Refn e dos apresentadores Geoff Keighley e Conan O'Brien.

Na maior parte do tempo o jogo não tem música e enquanto isso é necessário para criar a atmosfera, não sou um grande fã da ideia. Em momentos específicos tocam algumas canções bem melancólicas que dão o tom do jogo. Há momentos de tirar o fôlego quando você vê áreas abertas realmente gigantescas que não sabe nem como começar a explorar e subitamente uma música começa a tocar ampliando seu isolamento.

Os efeitos sonoros são ótimos, do tipo que se tornam icônicos e passam a representar momentos específicos do jogo, como adentrar uma área perigosa de B.T.s ou a chegada da chuva temporal. Não chegam a ser como o som de "!" em Metal Gear Solid, mas sso seria pedir demais. A dublagem em inglês também está perfeita. O jogo está disponível também com dublagem em português, mas eu joguei com o áudio original e legendado, então não poderei falar sobre.

Conclusão

Death Stranding é um jogo com camadas sobre camadas, tanto em sua história como em suas jogabilidades. Se eu o recomendo? Na verdade, não. Eu não recomendo Death Stranding para ninguém que já não esteja interessado nele. Isso porque o jogo não faz nenhum esforço para mudar sua opinião se você já chegar com uma ideia predeterminada dele. Death Stranding espera que você esteja de braços abertos para experienciar algo diferente do que você conhece.


Seria um erro comparar Death Stranding a jogos comuns como The Legend of Zelda ou Horizon: Zero Dawn, jogos feitos para serem divertidos, com histórias cheias de ação, contos de cavaleiros contra o mal como em Star Wars. Death Stranding não tem muita ação, mas tem uma tonelada de subtexto, como em Star Trek, onde muitas vezes o soco emocional vêm através de palavras e ideias poderosas que reverberam na alma humana.

Como alguém que joga videogame há uns 30 anos acredito que tem um grande peso quando afirmo que eu não entendo totalmente o que Death Stranding é. Hideo Kojima disse que queria criar um novo gênero e eu acho que ele pode muito bem ter chegado perto disso. Um dia talvez olhemos pra esse monstro de Frankenstein como o ponto de partida dele ou apenas como uma breve curiosidade como um dia Shenmue foi.

Nenhuma nota 9 ou 6 irá ajudar você a entender se esse jogo é ou não pra você. Nenhuma análise vai ajudar a responder perguntas como: "Eu vou querer jogá-lo até o final?", "Depois que acabar a história ainda vou querer jogá-lo?", "Eu gostaria de jogá-lo após um longo dia de trabalho?". Ele é um jogo tão único que essas respostas são incógnitas.

Eu tenho mais de 80 horas no jogo, já cheguei a ficar grudado no videogame pensando "Eu não preciso dormir tantas horas, assim posso jogar mais Death Stranding" e ainda assim se alguém me perguntar se eu gostei do jogo eu não sei responder. Qualquer um que gostou de Death Stranding irá entender se você disser que não gostou porque achou chato. É compreensível. Mas ninguém que não gostou de Death Stranding vai conseguir entender a sensação de quem gostou.

Nota: 8,5/10