domingo, 31 de dezembro de 2017

Horizon vs. Zelda


The Legend of Zelda: Breath of the Wild é o melhor jogo de 2017, provavelmente o melhor jogo em décadas desde Ocarina of Time, não há dúvidas de sua superioridade. No entanto esse ano teve outro jogo muito bom que teve a infelicidade de nascer à sombra da obra-prima da Nintendo e esse jogo foi Horizon: Zero Dawn.

Vejo muitos fãs da Nintendo tirando um sarro de Horizon: Zero Dawn (Horizon: Zero Prêmios é uma das minhas preferidas porque Breath of the Wild levou todos) sem perceberem que eles não têm tanta base para zueira assim. Tudo isso devido à forma que a Nintendo vinha tratando The Legend of Zelda e os seus fãs através dos últimos anos.

Por muito tempo a Nintendo sentou em cima da franquia The Legend of Zelda sem fazer nada digno do seu nome e lançando jogos que não tinham nada a ver com os valores clássicos da série. Eram jogos criados com base no gosto pessoal do produtor Eiji Aonuma, que herdou a série de seu criador original, Shigeru Miyamoto, apesar de nunca ter gostado do que o The Legend of Zelda original era em primeiro lugar.



Durante esse período a Nintendo passou anos servindo pombo no jantar e dizendo que era peru. Sabendo como alguns fãs da Nintendo são, sempre houve os que disseram "Meu Deus eu nunca comi uma coxa de peru tão deliciosa quanto essa". Se dependesse apenas desses fãs, ela continuaria servindo sempre a mesma coisa e as pessoas que se recusassem a comer continuariam com fome.

Uma outra empresa notando essa fome das pessoas resolveu assar seu próprio peru naquele Natal e finalmente essas pessoas teriam exatamente o que queriam comer. Eis que chega a Nintendo com uma ave ainda maior e pigarreando enquanto chama atenção como se fosse o Quico esfregando sua barraca de sucos profissional ao lado da Tienda del Chavo.

Um jogador que gostou de The Legend of Zelda: Skyward Sword não deveria comemorar Breath of the Wild porque não passou fome. A criação de Breath of the Wild foi com base no que o público reclamava de Skyward Sword, reclamações que eu sempre mencionei aqui no blog. Skyward Sword é o ápice da chatice de um Zelda de Aonuma com ilhas no céu ao invés de mundo aberto e side quest de levar papel no banheiro pra alguém.



Breath of the Wild é o anti-Zelda de Aonuma, é tudo que ele nunca quis fazer. Infelizmente ainda tem pessoas que pensam que Breath of the Wild é um jogo de Aonuma, mas é muito claro que ele teve pouca participação direta. Você encontrará a presença dele apenas nas partes que o interessavam, como na história linear. Todo o mundo aberto, seu conteúdo e suas mecânicas foram feitas por outras pessoas bem mais talentosas.

Quem são essas pessoas? Lembram-se quando eu falei sobre The Legend of Zelda: A Link Between Worlds e cogitei que houvesse alguém infiltrado na série? Alguém que parecia saber o que estava fazendo, parecia saber sobre o que era Zelda e estava tentando resgatar seus valores clássicos? A ideia parecia tão improvável que pensaram que eu estava maluco... bom, mais do que de costume.

O site Did You Know Gaming investigou e acabou descobrindo que o conceito de The Legend of Zelda: Breath of the Wild partiu de uma demo criada por três desenvolvedores. Esta demo aplicava física no The Legend of Zelda clássico do Nintendo 8 Bits e dava ao jogador liberdade de criar múltiplas soluções para seus problemas. Essa demo foi criada por Shiro Mouri, Hiromasa Shikata e... um terceiro desenvolvedor desconhecido que eles não conseguiram identificar, o que é bem estranho.



A jornada da Nintendo para voltar Zelda aos seus próprios valores clássicos era uma jornada fácil, confortável, na qual a única pessoa que precisaria ser contrariada era Aonuma. Esse não é o caso de Horizon. A Guerrilla Games só havia até agora cuidado de jogos de tiro FPS com a série Killzone, a qual vamos ser sinceros, é bem medíocre.

Eles foram ousados, provavelmente tiveram que lutar contra muita resistência para provar que podiam fazer uma aventura épica estilo The Legend of Zelda em um mundo onde não havia mais Zelda nos moldes clássicos, onde o povo sentia fome de algo como Breath of the Wild antes mesmo de Breath of the Wild existir.

Em outras palavras, a Guerrilla Games fez tudo que o que sempre pedimos das empresas de jogos, como ser ousada, inovar, investir em franquias novas, dar liberdade ao jogador, descobrir do que as pessoas têm fome e dar isso a elas. E quando o jogo saiu, todos ignoraram porque havia um novo The Legend of Zelda. Quando uma empresa faz tudo certo e o público a rejeita por fatores externos, perdemos o direito de criticá-la. Na prática o público deveria ter jogado ambos, mas não foi o que aconteceu.

No início do ano, pouco após o lançamento de ambos os jogos, Masahiro Sakurai, criador de Super Smash Bros., postou em sua coluna: "Uma semana antes de escrever essa coluna, dois maravilhosos trabalhos excepcionais foram lançados e eu fiquei dividido em como gastar meu tempo. Horizon: Zero Dawn e The Legend of Zelda: Breath of the Wild. De todo jeito, jogo ambos porque são realmente obras-primas".



Ele segue falando sobre Zelda ficar um pouco cansativo, mas não é nada muito importante e eu não concordo muito com o que ele disse: "Horizon é mais sem estresse e Zelda se torna uma rotina cansativa. No entanto se você jogou Zelda, provavelmente entende isso bem: as tarefas de Zelda são a parte mais divertida!".

A questão é que a Nintendo não liga o suficiente para Zelda para merecer a aclamação que Breath of the Wild recebeu. Muito do que eles acertam é acidental ou é conseguido pelas costas de Aonuma, nas frestas onde ele não estava, graças a alguém lá dentro que parece saber o que é Zelda. Se ela não valoriza, também não tem tantos motivos para manter esse estilo.

Você está confiante que o próximo The Legend of Zelda será no mesmo estilo que Breath of the Wild? Pois há uma grande chance de que ele seja bem menos divertido, com Aonuma tentando empurrar suas velhas ideias nele. Porque a própria Nintendo não chegou em Breath of the Wild por aprendizado, mas por acaso, como algo novo que ela tentou dessa vez.

Aonuma disse que Breath of the Wild abriu seus olhos sobre dar liberdade ao jogador e que pretende mantê-la, porém isso não significa necessariamente que ele entenda o que fez certo. Por exemplo, Hideo Kojima disse que entendeu que deveria dar liberdade ao jogador e isso gerou o ótimo Metal Gear Solid 5. Porém vemos em Death Stranding ele voltar com seus velhos hábitos de focar na narrativa para promover seu jogo e mesmo um ano e meio depois do anúncio ainda não vimos a jogabilidade.



Essa ambiguidade entre o que fala e o que faz pode ser bem vista na forma como Aonuma descreve a exploração e os obstáculos: "Uma das coisas que nós definitivamente consideramos é que sempre quisemos ter certeza que o jogador poderia entender qual seu desafio ou obstáculo é. Sempre quisemos ter certeza que o desafio podia ser desafiado. Então sempre quisemos fazer um meio linear de superar um obstáculo".

Temos a palavra liberdade e linear na mesma declaração, o que indica um conflito de pensamentos diferentes, como se fossem pessoas diferentes responsáveis por cada parte. Assim como Breath of The Wild tem partes livres em mundo aberto e tem partes lineares de história, e sabemos muito bem quem é o responsável pelas partes lineares.

Como Aonuma não aprendeu realmente uma lição para chegar em Breath of the Wild, ele pode jogar tudo fora novamente no próximo capítulo, assim como acontece com várias franquias da Nintendo, assim como aconteceu de Wind Waker para Twilight Princess e de volta para Skyward Sword. Enquanto Horizon eu bati palmas desde o início e dei um voto de confiança, com Breath of the Wild tive que ficar com o pé atrás até o último instante porque Aonuma sempre pode fazer algo grande e estragar tudo.



Nós não elogiamos suficiente Horizon: Zero Dawn porque vivemos em um mundo no qual o segundo lugar é apenas o primeiro dos últimos, não há lugar para o segundo melhor jogo de aventura, e assim podemos matar algo que tinha potencial para ser muito maior. Talvez a Guerrilla Games nunca mais faça um jogo de aventura, talvez a Sony nunca mais arrisque nesse tipo de projeto. Alguns fãs da Nintendo podem achar que isso é porque ela esmagou o seu inimigo eficientemente, mas para o grande público é perda de diversidade e reforço da mesmice.

Ambos eram jogos que prometiam demais e é uma pena que eles tenham colidido e um deles acabou completamente eclipsado. Se Horizon: Zero Dawn tivesse se apressado para lançar no final de 2016 teria sido o Jogo do Ano daquele ano e Zelda seria desse, ou vice e versa. The Legend of Zelda: Breath of the Wild é exatamente o Zelda que eu faria se eu estivesse no comando da franquia e Horizon: Zero Dawn o Zelda que eu faria se não estivesse no comando de Zelda.

Artigos relacionados:
- Qual o segredo de The Legend of Zelda: A Link Between Worlds?
- Breath of the Wild: Uma lenda para chamar de sua
- Review de The Legend of Zelda: Skyward Sword

6 comentários:

  1. Rafa realmente eh difícil acreditar que tudo que você fala eh verdade. A link between Worlds e Breath of the Wild são jogos do AONUMA, óbvio que ele não faz os jogos sozinhos mas achar que alguém misterioso está tocando o projeto eh não querer dar o braço a torcer de jeito nenhum, e não foi acidentalmente que um dos melhores jogos da Nintendo foi feito. A sega disse que o mesmo time de Colors fez Forces. Você também criou uma teoria maluca que uma equipe paralela se chamou de Sonic team, e agora, ela voltou no forces ou não só pq o jogo eh ruim?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Quando você conhece um pouco sobre certos produtores você consegue enxergar a mão deles no jogo, exatamente o que fizeram, a filosofia por trás, e dá pra notar também quando essa filosofia está ausente. Os capítulos mais recentes de Zelda não têm a filosofia do Aonuma.

      https://www.youtube.com/watch?v=PhBUTjcP9a8

      Veja como essa paródia capta várias das coisas que eu falo sobre o estilo do Aonuma de fazer jogos, coisas que todo mundo que não gosta do estilo dele identifica fácil. Essas coisas estão ausentes ou extremamente reduzidas em A Link Between Worlds e Breath of the Wild.

      Quem fez a demo de Zelda em 2D com física que levou a equipe ao conceito de Breath of the Wild não foi o Aonuma, foram esses dois programadores e mais um terceiro misterioso, não segundo minha opinião, mas de acordo com o site Did You Know Gaming. A demo também era baseada no The Legend of Zelda original, o qual Aonuma não gosta, e Breath of the Wild resgata vários dos valores clássicos do original, valores que Aonuma nunca gostou.

      Outra coisa que acho que as pessoas não entendem é que os produtores não ficam permanentemente supervisionando os jogos, eles pedem pra que algo seja feito e de vez em quando passam para checar os resultados e dentro desse espaço as equipes têm muita liberdade.

      Por exemplo, Aonuma só conseguiu fazer alguns de seus Zeldas porque desobedeceu ordens diretas de Shigeru Miyamoto. Ele transformou Ura Zelda que era pra ser um pacote de expansão para Ocarina of Time em um jogo próprio, Majora's Mask. Transformou o remake de A Link to the Past em outro jogo, A Link Between Worlds. Porque Miyamoto pedia pra ele fazer algo e ele fazia algo diferente pelas suas costas. Não acho difícil que agora a equipe dele faça o mesmo com ele, ele os ensinou isso.

      O caso de Sonic Colors continua sendo um mistério porque o jogo é bom de um jeito que a equipe que fez todos os outros jogos de Sonic não é capaz de fazer. A Sega falou que Sonic Forces foi feito pela mesma equipe de Sonic Colors e Generations, mas isso não é bem verdade. Basta ver os créditos para ver que Sonic Colors teve 6 Level Designers, Forces teve 3 e estão falando que dois deles eram amadores que só haviam trabalhado antes em Sonic: Lost World, não Colors.

      Você pode acreditar que um jogo bom vindo de uma equipe ruim é uma intervenção alienígena, um milagre, um tiro no escuro (Sean Malstrom acha que a Nintendo fez Breath of the Wild por acidente), mas eu vou pelo caminho mais humano, acredito que alguns indivíduos talentosos podem fazer a diferença. Porque a indústria de jogos sempre foi assim, um punhado de gente numa garagem botando tudo de si, como em Mega Man 2.

      Eu acredito também em estúdios mercenários porque a existência deles não é folclore, são equipes que melhoraram seu jogo por dinheiro e sem aparecer nos créditos. Eu queria falar mais sobre eles, mas é bem complicado se investigar estúdios secretos, como o próprio nome sugere.

      Excluir
  2. Também compartilho do seu receio de que o próximo Zelda volte ao estilo do Aonuma. Com o sucesso que esse fez, é bem provável que ele queira assumir a direção de mais de perto, e com isso estrague o jogo como ele sempre fazia. Mas discordo que Horizon seja um jogo bom. Tipo, o jogo tem 10 min de cutscenes antes de te deixar controlar alguma coisa. E quando deixa é aquela velha fórmula fracassada de mundo aberto: "vá até um lugar, assista a uma cutscene para descobrir o próximo lugar que você tem que ir".

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Não foi minha experiência com o jogo. Depois que ele me forneceu o mundo aberto me dediquei a fazer várias coisas que não eram da história. Se seguisse a campanha sim, seriam várias cutscenes, mas acho que isso é verdade pra Zelda e Skyrim também. Não sou contra haver uma "main quest" desde que o jogador seja livre pra fazê-la só quando tiver vontade.

      Há uma introdução, o jogo demora um pouco pra entregar o mundo aberto e seria melhor dar controle diretamente ao jogador, mas não acho que diminua o jogo. Se Zelda tivesse uma introdução de 1 hora antes de te dar o mundo aberto ainda diria que é um jogo perfeito.

      Excluir
    2. Entendo o seu ponto. Tbm n joguei, mas foi exatamente por isso. Qnd soube q um jogo em mundo aberto sairia pro play 4, fui ver uma gameplay e de repente me deparei com as coisas q disse acima, que me afastaram de conhecer o jogo. Só fico imaginando o quanto de público Horizon perdeu exatamente por isso, demorar demais a dar poder ao jogador. E quanto a Zelda, a main quest é realmente chata, cheia de cutscenes e inimigos que poderiam ter sido melhores aproveitados, como as Divine Beasts (fico triste só de lembrar da minha decepção ao chegar na primeira e perceber q era só outra dungeon qualquer ao invés de uma batalha épica).
      Obs: sou o anônimo de cima

      Excluir
    3. As side quests do jogo também envolvem bem, todas têm uma história interessante fora da main quest, até as "coisas pra fazer" que costumam ser meio genéricas às vezes surpreendem.

      Por exemplo ter que escalar uma torre pra liberar informações do mapa, basicamente o arroz e feijão do mundo aberto, em Horizon são monstros chamados de "Pescoções" e eu fui em um deles pensando que era só mais uma tarefa e encontrei um grupo de bandidos inesperado tentando capturar o bicho, acabei enfrentando eles.

      Excluir