segunda-feira, 25 de março de 2019

Aproveite sua Stadia


Essa semana foi realmente recheada de novidades, talvez a maior tenha sido a entrada do Google no mercado de games, ou a expansão pra ser mais exato, com o anúncio de seu novo serviço de streaming "Stadia". Para quem não sabe, streaming significa que seu jogo não roda no seu PC, ele roda nos super PCs do Google e você apenas recebe uma transmissão ao vivo de tudo. Dá pra ver que não é uma coisa muito legal logo de cara.

O problema com streaming de jogos é muito semelhante ao problema que o Kinect e a PS Camera enfrentaram ao tentar bater de frente com o Wii Remote. Uma câmera, por melhor que seja, apenas pode reagir depois que algo acontece. Com o avanço da tecnologia supõe-se que podemos chegar a um atraso tão mínimo de milissegundos que possa se tornar quase imediato e eliminar a estranheza, porém até agora não temos isso.


A tecnologia de streaming local do PS4 para o PS Vita funciona perfeitamente, porque são duas plataformas próximas se comunicando entre si, sem problemas. Tente fazer isso pela internet e nada funciona direito. A tecnologia que a Sony comprou do Gaikai para a PlayStation Now é bastante limitada e constantemente considerada inferior à retrocompatibilidade do Xbox One que simplesmente permite que você baixe os jogos antigos fisicamente e os jogue.

Para alguns jogos streaming não é um problema, jogos que não requeiram reflexos rápidos. Porém pegue um jogo até mesmo simples como Rocket League e um atraso de milésimos de segundo é a diferença entre você acertar uma bola e você acertar uma bola... mas ela logo depois atravessar você como se você nunca tivesse estado na frente dela. Considere alguns dos jogos mais populares hoje em dia como Fortnite, Apex Legends, Call of Duty, todos sofreriam imensamente.

Alguma vez já jogou um jogo antigo e pensou "nossa, eu costumava ser muito melhor nisso"? Descartamos apenas como falta de prática, mas na verdade muitos jogos antigos hoje sofrem delays causados pela emulação e hardware diferente do original. Talvez você não esteja errado, os jogos realmente respondam mais devagar. Por exemplo, um NES Classic ou SNES Classic tem um tempo de resposta muito melhor que uma máquina de emulação caseira montada com base em um Raspberry.


Vamos ser sinceros, se qualquer outra empresa dissesse que vai lançar jogos por stream, ninguém ligaria muito. A Microsoft mesmo anunciou seu xCloud e não houve muito interesse. estamos prestando atenção porque é o Google. Normalmente o Google não brinca com tecnologias e tem poder suficiente para dar o máximo de suporte para o que interessa à empresa.

Por ora o serviço apenas vai ser lançado em alguns países mais ricos e de conexões melhores, o que já significa uma taxa de exclusão para a maior parte do mundo. Porém se funcionasse neles já seria um ponto de partida. O Google pode ter mais servidores, mais potentes e mais próximos do que a maioria das empresas poderia pagar. Se a internet de algum país fosse uma barreira, ele consegue até mesmo melhorar a conexão daquele país se tiver vontade.

Porém digamos que se tratasse apenas de uma questão de força bruta. Que o Google vai botar sua força ao máximo para fazer isso funcionar... faz sucesso onde funciona no mínimo de uma forma decente? No Japão as conexões são bem potentes e acessíveis com grande velocidade na maior parte do país e eles já tiveram experiências com jogos por Stream.


Lá foram lançadas versões de Dragon Quest X para o Nintendo 3DS por Stream, e mais recentemente o Nintendo Switch recebeu versões de Phantasy Star Online 2, Resident Evil 7 e Assassin's Creed Odyssey. Nenhum desses jogos fez sucesso, mesmo Dragon Quest X que é uma série de grande porte no Japão.

Por ora não há nada que sugira que o Stadia será algo excepcional, porém sempre há aquela ponta de mistério quando se fala de uma empresa tão grande quanto o Google. Eles têm portas diretas para 80% dos dispositivos móveis do mundo, como smartphones, e não têm medo de usá-las. não acredito que a tecnologia já tenha atingido um ponto em que possa ser considerada "boa o bastante" para o usuário final, então acredito que o Stadia fracassará a menos que algo mude ou o Google force extremamente a barra.

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domingo, 24 de março de 2019

Nindies Showcase Spring 2019 - O Bom, o Mau e o... Rítmico?

arte de Brian Bear

Nesta última semana a Nintendo apresentou uma de suas "Nindie Showcases", um vídeo de destaque para vários jogos independentes que serão lançados em breve. Houve duas enormes surpresas no início e no final da conferência respectivamente.

A primeira foi a revelação de que Cuphead, outrora exclusivo do Xbox One, seria lançado para o Nintendo Switch. A segunda foi a revelação de Cadence of Hyrule, um jogo rítmico que mistura Crypt of the NecroDancer com The Legend of Zelda. vamos falar um pouco de tudo que foi apresentado.

Cuphead

De longe a maior surpresa da conferência, uma quebra de paradigma no que diz respeito a consoles e seus exclusivos. Cuphead era um exclusivo do Xbox One, do tipo que a Microsoft investiu seu próprio dinheiro nele para garantir que fosse a única capaz de explorá-lo. Ainda assim ela resolveu agora lançá-lo no Nintendo Switch, fruto dessa relação estranha que ela e a Nintendo vêm tendo.


Isso é diferente de Minecraft que já estava disponível em várias plataformas quando a Microsoft comprou a série e nem sabemos se entre as cláusulas do contrato estavam algumas exigências sobre manter o jogo funcionando nas plataformas em que já estava. Isso é realmente uma empresa lançando um de seus exclusivos em outra plataforma. Halo no PlayStation 4! Mario no Xbox! God of War no Switch! Histeria em massa! Cães e gatos vivendo juntos!

Ok, tirando o choque da quebra de exclusividade, que não me entendam errado, é algo enorme, o quanto Cuphead funciona no Switch? Acho que não muito. Cuphead é um jogo que tem uma aparência bonitinha, mas que é também muito difícil, causando uma certa dissonância entre o que as pessoas que o compram esperam e o que recebem.

O problema é que a dificuldade do jogo não será mexida e se tem uma coisa que Cuphead precisava era de um rebalanceamento no desafio. Como o jogo é apenas de lutas contra chefes, se você bater em uma barreira de dificuldade simplesmente não há mais conteúdo a menos que você os supere. Normalmente há mais de um chefe para escolher enfrentar, mas às vezes tudo que está entre você e o resto do jogo é uma batalha que não consegue vencer.


Não que Cuphead não possa ser difícil, mas ele não precisa. A melhor parte dele não é sua dificuldade e ela acaba por excluir muitas pessoas por conta dessa barreira. O jogo tem um modo mais fácil porém claramente recrimina o jogador por usá-lo ao cortar as últimas fases das batalhas e não permitir que o jogo seja terminado nesse modo.

Tecnicamente parece que o jogo será bem convertido para o Switch a 1080p no modo console e 720p no modo portátil, mas sempre rodando a 60 FPS, o que é bem impressionante. O lançamento está marcado já para 18 de abril.

Overland

Estou bem em cima do muro sobre Overland porque vimos pouco do jogo. Eu adorei o visual e adoraria jogar algo naquele estilo, porém a jogabilidade em si parece estranha. Primeiro, é um jogo de estratégia em um mundo pós-apocalíptico, dois temas que não casam muito bem. Segundo, sinto que ele pode cair para algo mais próximo de um puzzle. Vou ficar de olho por enquanto sem um parecer definitivo. Sai no final do ano para Switch, PS4 e Xbox One.


My Friend Pedro

Este promete ser um dos jogos mais divertidos do ano, um jogo de ação que mais parece uma sessão de ação louca do Deadpool. Não é preciso falar sobre o jogo, basta assistir ao trailer e sentir. My Friend Pedro sai em junho para Switch e PC. Eu havia lido sobre uma versão para PS4, mas parece que foi um engano da Kotaku. Ainda assim tem cara que sairá para outras plataformas depois.


Neo Cab

Parece um jogo bem entediante no estilo Indie de foco na história acima de qualquer jogabilidade. Você dirige uma espécie de Uber futurista e interage com diversas reações tentando agradar seus clientes para receber boas notas, porém o foco mesmo com certeza está na história. Nada promissor. Sairá no verão norte-americano, nosso inverno.


The Red Lantern

Visualmente, The Red Lantern é exatamente o que eu adoraria jogar, algo refrescante para os olhos, com um visual belíssimo e uma localidade única. Na prática, eu senti que o jogo parece muito mais focado em uma narrativa e eventos scriptados do que ele deixa transparecer. Aparentemente há elementos de sobrevivência, mas não estou muito convencido.


Este é o primeiro jogo do estúdio e essa história me lembra muito a de Firewatch e como ele acabou saindo um jogo super linear. The Red Lantern sai ainda esse ano para o Nintendo Switch e por enquanto é bem difícil encontrar informações sobre ele, mas apostaria que pelo menos para PC também deve sair.

Darkwood

Darkwood é um jogo meio rogue de terror com visão aérea e bem bacana. Você tem sua base, a fortalece, monta armadilhas e explora o mundo ao seu redor em busca de mais suprimentos. Eu gosto desse estilo de sobrevivência rogue, mas quando vou passar tanto tempo assim em um jogo eu prefiro que ele não seja tão sombrio. Porém sem dúvida há público para isso, como é o caso de The Forest.

Curiosamente Darkwood é o único jogo que não teve o vídeo publicado no canal oficial da Nintendo

Ele sairá em maio para Nintendo Switch, mas já está disponível para PC. Uma coisa legal é que o criador do jogo o colocou de graça a versão para PC para quem não puder pagar em um torrent no Pirate Bay sem DRM (proteção de cópia). Ele apenas pediu que se as pessoas gostarem e puderem pagar que comprem o jogo em uma das lojas oferecidas.

Katana Zero

Há vários jogos nesse estilo particular de Katana Zero como N++, Mark of the Ninja e Not a Hero, uma ação 2D lateral em que você precisa eliminar inimigos rapidamente de certas formas para continuar sobrevivendo. Não sou muito fã desse estilo de jogo, acho que algumas pessoas gostam, mas definitivamente não é uma jogabilidade que eu enalteceria. Sai em 18 de abril no Switch e já está disponível para PC.


Rad

Parece um jogo divertido inicialmente, mas há algo nele que não cheira muito bem. Rad parece que vai ser um jogo leve, com um pouco de ação auto-consciente de sua superficialidade, mas aos poucos cruza perigosamente essa linha que separa o descompromissado do desleixado. Parece ser um jogo de baixo custo que não realizará seu potencial de ser algo simples e divertido. Sai no verão norte-americano, nosso inverno, para Switch e PC. Talvez haja mais plataformas porque não consegui achar informações suficientes sobre ele.


Creature in the Well

Apesar de visualmente até ser promissor, lembrando um pouco Hyper Light Drifter, esse Creature in the Well desaponta um pouco. Seria em teoria um jogo de ação porém com elementos de pinball que funcionam quase como quebra-cabeças. Parece um gimmick para justificar a existiência do jogo e que simplesmente não se sustenta por mais do que alguns minutos. Creature in the Well sai também no verão norte-americano, nosso inverno, para o Switch e PC.


Bloodroots

Mais um que gosto do visual, vejo alguns defeitos, mas diferente dos outros acho que se salvará. O jogador controla um personagem chamado Mr. Wolf que sai por aí matando todos em seu caminho usando o cenário como arma. Sinto que falta um pouco de variedade e espontaneidade para que não vire um quebra-cabeça de matar os inimigos com as armas certas, mas acho que ainda se salva.


A ação é frenética e a forma como o jogador sai matando um inimigo atrás do outro com o que vai encontrando pela frente chega até a me trazer uma vibe de Hotline Miami. Espero que esse realmente vingue. Bloodroots é outro que vai ter lançamento no verão norte-americano, inverno aqui, para Switch e PC.

Pine

Digamos que Pine é um jogo de aventura genérico tentando muito não parecer um jogo de aventura genérico. Sua jogabilidade parece bem fraca, um pouco amadora até, mas o jogo tenta tirar o foco ao dizer que o principal é a aventura, a exploração, facções brigando entre si por comida, etc. Uma dica é que se um jogo não faz bem algo tão simples quanto bater em um inimigo, muito provavelmente seus sistemas mais avançados não são tão bons quanto as promessas sugerem.


Vale a pena dizer que às vezes simplicidade pode passar por genérico, então eu poderia estar enganado. Porém acredito que o menu de itens do jogo é o que realmente o denuncia, algo pouco intuitivo e desnecessariamente complexo que não combinaria com simplicidade. Ele sai em agosto para o Switch e sairá também para PC porém não há uma data ainda no Steam. Pode ser em agosto também e a página apenas estar desatualizada.

Vlambeer Arcade / Nuclear Throne / Super Crate Box

O estúdio Vlambeer teve direito a um pequeno bloco na apresentação para falar de três jogos. Não há tanto o que falar sobre eles, então vamos aos poucos. O único anúncio de um jogo novo foi "Vlambeer Arcade", uma coletânea de minigames que receberá atualizações mas não parece nada promissora. A Vlambeer sabe criar bons conceitos e jogabilidades, mas eu quero vê-los em jogos completos, não minigames. O primeiro dos minigames será "Ultra Bugs" e sai ainda esse ano.


Nuclear Throne é um jogo um pouco antigo de 2015 para PlayStation 4, PS Vita e PC que recebeu um port no dia da conferência para o Switch. Apesar de tão antigo curiosamente eu nunca o joguei, acabei optando por "Enter the Gungeong" (os dois parecem semelhantes), mas ele parece bom. Já Super Crate Box sai em Abril e é basicamente um minigame também, muito divertido, mas que não dura mais do que algumas horas de entretenimento.


Swimsanity!

Há coisas que inicialmente eu até gosto em Swimsanity! como uma jogabilidade de tiro cooperativa, mas há um clima estranho de baixo custo e cara de que o design é bem limitado e deixará o jogo sem graça. O lançamento está marcado para o verão norte-americano, nosso inverno para Switch, com uma versão PC planejada para a primavera norte-americana, porém talvez essa data esteja só desatualizada.


Blaster Master Zero II

Criado pela Inti Creates, que é um bom estúdio, Blaster Master Zero II é um novo jogo na série e não um remake como o primeiro Blaster Master Zero. A jogabilidade provavelmente será ótima e não duvido que ela seja muito divertido, porém o visual do jogo me incomodou um pouco. Ele utiliza gráficos em 8 Bits e acho que era um jogo que realmente se beneficiaria de um upgrade visual. O jogo foi lançado no mesmo dia da conferência para o Switch.


Stranger Things 3: The Game

O jogo baseado na terceira temporada da série Stranger Things já estava anunciado há algum tempo para Nintendo Switch, PlayStation 4, Xbox One e PC, mas agora foi confirmado que ele chegará em 4 de julho, junto com a série na Netflix. Eu gostei bastante da primeira temporada de Stranger Things e acho que esse jogo tem potencial para ser uma boa companhia para a série. No entanto eu realmente gostaria que lançassem também o anterior, que ironicamente tinha charmosos gráficos em 8 Bits.


Cadence of Hyrule

A última surpresa da Direct, apesar de não ter sido mais chocante que Cuphead, ainda foi bastante inesperada. O início do trailer dá a entender que é um novo jogo da série Crypt of the NecroDancer, o qual eu até gostei apesar de não ser tão bom em administrar ritmo com jogabilidade e surpreendentemente consegui zerar, algo que eu achei que não conseguiria.



Porém depois entram elementos de The Legend of Zelda... e aí eu realmente não gostei muito. Se fosse Crypt of the NecroDancer 2 provavelmente eu compraria, mas Cadence of Hyrule me parece um mau uso da franquia The Legend of Zelda. Os remixes das músicas de Zelda são bons, gosto do visual dos gráficos que me lembram um pouco o GameBoy Advance porém com sprites maiores, mas por que Zelda?

O próprio título dá mais destaque para Cadence, o que dá a impressão que é um Crypt of the NecroDancer com conteúdo especial de Zelda, quando deveria no mínimo ser um jogo original de The Legend of Zelda com a jogabilidade de NecroDancer para ser aceitável. Não é uma questão de semântica. Mesmo que involuntariamente, Cadence é a protagonista do jogo, Link e Zelda são seus ajudantes.


A ideia de aplicar uma jogabilidade já existente na franquia The Legend of Zelda funcionou muito bem em Hyrule Warriors. No entanto como participações especiais é mais fácil Link e Zelda estragarem o equilíbrio da jogabilidade de Crypt of the NecroDancer do que terem a experiência moldada ao seu redor. Cadence é a personagem padrão e se você jogou o original dá pra notar como Link e Zelda são fortes demais em relação a ela.

Definitivamente Cadence of Hyrule foi uma viagem desnecessária ao poço de The Legend of Zelda.

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sábado, 23 de março de 2019

Você pode fazer carinho no cachorro?


Vou recomendar uma conta de humor inusitada no Twitter chamada @CanYouPetTheDog , criada agora em março de 2019 com o intuito de analisar um único elemento em cada jogo existente: "Você pode fazer carinho no cachorro?".

A conta já apresenta algumas dezenas de análises com um parecer muito simples: "Pode" ou "Não pode" e mais de 100 mil seguidores dispostos a acompanhá-los. Ela cobre jogos como The Legend of Zelda: Breath of the Wild, Super Mario Odyssey, Grand Theft Auto, entre outros.

Porém ela não se atém apenas a jogos recentes, já confirmou que é possível fazer carinho em cachorros em jogos como Pac-Man 2: The New Adventures, Phantasmagoria e Final Fantasy 8. Em alguns casos como Wolfenstein 3D eles até mencionam que é possível com a ajuda de um Mod. Em outros casos como The Last Guardian dá pra ver que a definição de "Cachorro" da conta talvez seja um pouco mais branda do que deveria.


O estilo de humor me lembra um pouco o do WeRateDogs (@dog_rates) com suas análises perfeitas de cachorros, mas principalmente um antigo caso do Miiverse, o famoso "Water Miiverse Guy". Era uma pessoa que postava no Miiverse apenas análises de água em todos os jogos: "Boa água", "Água bonita", "Incrível água", "Boa água para um jogo de GameBoy" e assim por diante. Um dia até a Nintendo entrou na brincadeira com uma seção "jogos com água maravilhosa" no eShop.

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A Morte e a Morte de PS Vita Berro d'AAA

arte de Synergy14

Eu acho divertido o livro A Morte e a Morte de Quincas Berro d'Água (inclusive o filme é bom se quiserem assistir) mas não dá pra negar que é apenas uma cópia de um sucesso muito mais antigo da Sessão da Tarde que é Um Morto muito Louco. Não é só porque somos todos amigos com Jorginho Amado aqui que também vamos deixar de fazer uma crítica quando ela se faz necessária.

A história do livro é sobre um morto que tem o cadáver carregado pelos amigos para viver uma última noitada em Salvador, Bahia, antes de acabar declarado morto por uma segunda vez quando cai de um barco em uma tempestade. Eu não posso deixar de sentir que há uma grande semelhança aqui com a história do PS Vita que viveu duas mortes.

Vida e vendas

O portátil da Sony lançado em março de 2011 teve sua produção encerrada recentemente, completando praticamente oito anos de vida. Para fins de comparação, isso é quase tanto quanto o Nintendo DS que foi lançado em 2004 e descontinuado em 2013 e quase o dobro do Wii U que foi lançado em 2012 e em 2016 já fechou as portas. O Nintendo 3DS lançado no mesmo ano que o PS Vita teve seus modelos principais com efeito 3D encerrados em 2017, mas permanece no mercado com os modelos 2DS que são a mesma plataforma.

No total ele vendeu por volta de 16 milhões de unidades, o que é muito pouco para qualquer plataforma em geral. Porém muito do que aconteceu com o PS Vita não era culpa apenas do PS Vita, como podemos ver também pelas vendas do Wii U. Não há plataforma mais horrorosa do que o Wii U, porém mesmo as piores plataformas da Nintendo nunca tiveram vendas como as do Wii U.


O Wii U teve vendas totais abaixo do PS Vita, por volta de 14 milhões. Para fins de comparação, o GameCube que foi muito mal também teve mais de 20 milhões e o Nintendo 64 mais de 30. Era óbvio que tanto Wii U quanto PS Vita não venceriam seus concorrentes, porém ninguém poderia esperar vendas tão baixas para plataformas que seriam segundas opções. Era quase como se ninguém as estivesse comprando.

Vale lembrar que o PSP teve um total de 80 milhões em vendas e está no Top 10 de plataformas mais vendidas, colado com o GameBoy Advance e à frente do Nintendo 3DS. Mesmo que o PSP tenha perdido a batalha contra o Nintendo DS ele foi um bom portátil e não imagino que as pessoas que o compraram tenham tido tamanho ressentimento de este ser o motivo para não investirem no PS Vita.

Se tomarmos as vendas do PSP e também considerarmos os 150 milhões de Nintendo DS vendidos, temos um mercado bem grande na geração passada. A mesma coisa se pegarmos o mercado de 85 milhões de Xbox 360, 85 milhões de PS3 e 100 milhões de Wii. Não podemos apenas somar esses números para saber o tamanho do mercado porque não sabemos o quanto essas vendas se sobrepõem, quantas pessoas tinham múltiplas plataformas, porém estamos falando de um mercado bem grande e que encolheu na geração seguinte.

Nos portáteis temos o 3DS com suas quase 80 milhões de vendas e o PS Vita com seus pouco mais de 15 milhões. Nos consoles temos o PS4 com mais de 90 milhões, o Xbox One com mais de 40 e o Wii U com seus quase 15. Se olharmos as plataformas líderes, a diferença é pequena em relação à geração anterior, mas quando olhamos para as segundas opções, a diferença é drástica.

Veja como a crise não afeta os líderes, mas todos em volta sofrem

O que acredito explicar as vendas muito baixas do Wii U, PS Vita e até do Xbox One é que em 2011 e 2012 o mundo sofreu uma forte crise econômica e as pessoas simplesmente estavam com menos dinheiro em mãos. Economia em uma escala global não é minha especialidade, então não poderia ter previsto isso.

Quando as pessoas têm poucos recursos elas escolhem apenas uma plataforma para apoiarem e nesse caso não há espaço para arriscar com um produto que pode não vingar. Rapidamente as pessoas escolheram o PS4 ao invés do Xbox One por uma diferença de US$ 100 e nunca mais o console da Microsoft se recuperou.

Eu esperava que o PS Vita vendesse uns 40 milhões, como o próprio Xbox One fez. Imaginava que ao ser lançado ele dividiria o espaço com o Nintendo 3DS por um tempo e depois ficaria em segundo plano, como se fosse um PSP piorado. Não parecia exagerado imaginar o PS Vita com metade das vendas do PSP e com metade das vendas do líder da geração, na verdade parecia até pessimista.

Portátil ou Plano B?

O que ninguém esperava no entanto é que a estratégia da Sony também fosse extremamente estranha: lançar para não vender. Desde o início quando o PS Vita foi anunciado e lançado havia algo de estranho na atitude da Sony em relação ao portátil, uma falta de vontade, um total descaso, parecia até mesmo que não queria vendê-lo. E aparentemente era exatamente isso.

O bundle do PlayStation 4 com PS Vita saiu de cena rapidinho

Tomando como base toda a estratégia da Sony para o PlayStation 4 foi possível ver que ela não tinha realmente intenção de vender o PS Vita como um portátil, apenas mantê-lo por perto como um Plano B caso o GamePad do Wii U emplacasse com a mesma força que o Wii Remote. Talvez a empresa tenha percebido que não foi lucrativo investir no PSP ou apenas não tinha condição na época para bancar o PS Vita e focou-se apenas no PS4. Vale lembrar que nessa época a empresa estava em crise.

A Sony parecia estar cobrindo todas as suas falhas naquela época com o PlayStation 4. Apostas em realidade virtual, controles de movimento, streaming de jogos, tudo para garantir que ele não ficasse de fora de qualquer disrupção como foi o Wii. Por essa lógica de Plano B dá pra ver uma grande semelhança entre o PS Vita e a PS Camera. Provavelmente a câmera do PS4 foi concebida para combater um possível sucesso do Kinect e assim que o periférico da Microsoft foi esquecido, a PS Camera também com pouco mais de uma dúzia de jogos. O mesmo aconteceu com o PS Vita.

Sem apoio da Sony o PS Vita ainda poderia ter feito sucesso, mas é justamente aqui onde entra o problema da crise econômica, ninguém se arriscaria por ele como se arriscaram pelo PSP. Sem suporte da Sony o PS Vita gritava por AAAs (jogos de alto nível de produção), mas eles não vinham. Essa seca começou a transformar o PS Vita em algo diferente, um cactus que inesperadamente tornava o solo fértil no deserto.

PlayStation Camera, esquecida como o PS Vita

Paraíso dos Indies

Uma coisa que poucas pessoas comentam é que o PS Vita foi um pioneiro entre os jogos Indies, a primeira plataforma completamente aberta para eles. O Xbox 360 deu o pontapé inicial com a Xbox Live Arcade, porém ainda havia muitas barreiras para ter seu jogo publicado e foi assim em vários dos serviços por um tempo. O PS Vita foi o primeiro que simplesmente abriu as portas para quem quisesse lançar seus jogos nele.

Essa ponte entre Indies e Sony se fortaleceu com o PS Vita e se ampliou no PlayStation 4 levando a um bom relacionamento da empresa com desenvolvedores independentes. Nessa mesma época a Nintendo se negou a publicar The Binding of Isaac no Nintendo 3DS devido ao conteúdo religioso do jogo e ele encontrou abrigo no PS4 e PS Vita. Ela ainda tratava Minecraft de uma forma estranha, como se não fosse um "jogo de verdade".


Muito antes do Nintendo Switch hoje ser elogiado como uma casa acolhedora e lucrativa para desenvolvedores Indie, perfeita para jogar esses pequenos jogos de forma "portátil", o PS vita já fazia isso. A diferença é que era o PS Vita, quando você dizia que jogos Indies estavam vendendo mais no PS Vita que em outras plataformas, ninguém ligava. Afinal, era o PS Vita. A narrativa de que ninguém ligava já estava estabelecida.

Consumidores do PS Vita eram bem hardcore e gastavam bastante em jogos, eu incluso. Não é incomum o Attach Rate (relação de jogos comprados por console) de plataformas menos populares ser maior porque os Tier 2 e 3 tendem a comprar menos jogos. O mesmo acontecia com o GameCube que tinha um Attach Rate alto, porém o PS Vita era um fenômeno para os Indies.


Um exemplo disso foi Retro City Rampage, um jogo que vendeu mais no PS Vita do que no PS3 e Nintendo 3DS. Este mesmo desenvolvedor lançou o jogo no Nintendo Wii e lucrou absolutamente 0 dólares, porque na época a Nintendo tinha uma política de exigir vendagem mínima antes de pagar qualquer Indie e o jogo não alcançou essas vendas.

Fenômeno japonês

Se o PS Vita tivesse sido apenas casa de Indies, seria um exagero dizer que ele era um solo fértil, mas muitos estúdios de pequeno e médio porte no Japão encontraram vida onde dizia-se ser um deserto árido. O público do PS Vita parecia ter desenvolvido um gosto peculiar por jogos japoneses, o qual aumentou ainda mais com o tempo conforme cada vez menos estúdios ocidentais queriam trabalhar com ele e uma pequena parcela do público japonês abraçava o portátil.

O PS Vita ajudou várias empresas japonesas a encontrarem um público que não estava em outras plataformas e elas cresceram com ele, assim como suas séries. Empresas como Marvelous, NIS America, Vanillaware, Koei Tecmo, XSeed Games, Idea Factory, Compile Heart, Imageepoch, Nihom Falcom, Nippon Ichi, entre outras.


Por mais que a imagem de fracasso do PS Vita fosse forte, muitas empresas não estavam correndo dele, estavam correndo em direção a ele. É um cenário bem diferente por exemplo do fim da vida do GameCube quando você via que as empresas simplesmente não queriam lançar jogos nele.

Acontecia o contrário com o PS Vita. Ele estava "fracassado", "morto", e ainda assim as empresas queriam lançar o máximo de jogos possível nele. Havia meses em que ele até recebia mais jogos do que o Nintendo 3DS. Para se ter uma ideia, a Xseed Games chegou a lançar 20 jogos na plataforma, mais do que em todos os outros videogames em sua história.

O PS Vita viu o crescimento de séries como Gravity Rush, Hyperdimension Neptunia, Senran Kagura, Yomawari, Ys, a franquia Atelier, a ponto de ganharem muitos capítulos e spin-offs no portátil e até saírem dele para terem jogos mais parrudos nos consoles.


Enquanto muitas pessoas não valorizarão esses jogos no PS Vita, as empresas com certeza valorizavam o portátil da Sony e sentem sua "morte" porque elas não estão conseguindo migrar para outras plataformas. Não encontram esse mesmo público no PS4 ou Switch. Consequentemente essas séries estão se apagando após brilharem no Vita.

Apesar de a produção do PS Vita estar sendo descontinuada, ele ainda recebe muitos jogos. Recentemente acabaram de sair jogos exclusivos de dança baseados em Persona 3 e 5 além de um port de Catherine que não será lançado no ocidente. Vários jogos que saíram no PS4 no último ano tiveram também versões para PS Vita que não saíram por aqui, mas continuam dando sobrevida ao portátil no Japão.


Recentemente a Kotaku fez uma matéria cujo título era "O 3DS está até morrendo melhor que o Vita", sobre o fato de que o 3DS também está saindo de cena lentamente e supostamente estaria fazendo isso melhor que o PS Vita. Então vem logo no segundo parágrafo uma afirmação que claramente contradiz a narrativa: "Desde setembro, 21 jogos saíram para o 3DS. Isso é menos que um jogo por semana. O Vita recebeu 43, incluindo jogos de dança de Persona 3 e Persona 5".

Fracasso?

Definitivamente o PS Vita não é um fracasso. Fracassar exige primeiro um objetivo que você esteja tentando alcançar e a verdade é que o PS Vita nunca tentou alcançar nada. Podemos criticar então a Sony por não ter sido ambiciosa com seu portátil, mas ela era uma empresa muito diferente em 2011, acuada após ferrenhas derrotas e ainda não de volta ao pódio como hoje com o PS4.

Ao tirar a Sony da equação, o que sobra? Apenas um portátil que fez um esforço tremendo para se manter relevante e de alguma forma conseguiu. O PS Vita se tornou uma ótima casa para Indies e jogos japoneses de nicho, não apenas um lugar que os recebia apaticamente mas um solo tão fértil que qualquer coisa que se plantasse crescia. Eu vi empresas se erguerem no PS Vita e hoje não sei o que elas farão sem mais poderem contar com esse público que as apoiou.

Por que elogiar o PS Vita e dizer que ele não fracassou se eu vivo reclamando do Nintendo 3DS e o chamo de fracasso? O Nintendo 3DS não vendeu mais que o quádruplo do PS Vita? Isso não significa obviamente que ele é melhor que seu concorrente? No entanto o PS Vita teve mais sucesso em sua derrota do que o Nintendo 3DS teve em sua vitória.

A filosofia do PlayStation 2 acabou sendo tóxica para o mercado de jogos

A forma como eu falo do PS Vita me lembra muito como eu costumo defender o GameCube frente ao PlayStation 2. Apesar de ter sido um dos consoles menos vendidos da Nintendo e tecnicamente um fracasso, ele tinha uma filosofia que era muito mais saudável que a maturização artificial tóxica do mercado de jogos que o PS2 trouxe. Eventualmente essa filosofia viria ser o embrião do Wii.

Uma analogia que constantemente uso aqui sobre o 3DS e o PS Vita é que se um guerreiro sai da aldeia dizendo que vai matar um leão, leva uma lança, um escudo, armadura e provisões, para depois voltar com um tigre, ele não teve sucesso porque levou recursos para matar um leão. Se você sai da aldeia para colher flores apenas com uma cesta e volta com um javali, você teve um sucesso inesperado e mais louvável que do guerreiro que matou o tigre, independente de que na comparação direta um javali vale menos que um tigre.

Neste ponto tanto o Nintendo 3DS quanto o PSP são fracassos pelo mesmo motivo. Não porque venderam pouco, mas porque levaram recursos da aldeia para matar um portátil que vendeu 150 milhões. Imagine quanto a Sony gastou de subsídio no PSP, na tecnologia do UMD, ou quanto a Nintendo gastou e subsidiou no 3DS para ter aquelas telas de efeito 3D sem óculos.

Na época não era possível tirar prints da tela

Vale lembrar que eu comprei um Nintendo 3DS bem cedo na vida dele e apenas quando fiquei completamente decepcionado com os jogos optei por comprar um PS Vita. Eu queria ver jogos inesperados no 3DS, produções ambiciosas como Resident Evil Revelations, bons Indies, Minecraft, jogos Nintendo de qualidade, jogos japoneses curiosos (como Ouendan no DS), mas nada disso parecia acontecer.

Enquanto no PS Vita muitas empresas queriam lançar seus jogos porque havia um público ansioso para comprá-los, no Nintendo 3DS a maioria das empresas fugia da plataforma porque eles já sabiam que o público do Nintendo 3DS queria comprar jogos da Nintendo.

Quando um jogo japonês era anunciado para o Nintendo 3DS eu já sabia que ele não seria lançado no ocidente, nenhuma empresa se interessava por lançá-lo. Enquanto isso no Vita empresas como a Xseed estavam loucas procurando qualquer coisa para publicar. Foi uma grande surpresa quando eu soube que Earth Defense Force 2 e Corpse Party: Bloody Drive sairiam no ocidente, ou quando a Idea Factory resolveu ir atrás de Sweet Fuse do PSP para traduzi-lo e lançá-lo compatível com o Vita.

Ao falar de solo fértil, é exatamente desse tipo de coisa que estou dizendo. Mesmo reclamando do PS2, uma das minhas séries favoritas Earth Defense Force nasceu nele, porque ele também tinha um solo fértil. EDF é o tipo de jogo que nunca nasceria numa plataforma Nintendo porque ela não dá essa confiança para estúdios experimentarem coisas novas.


O PS Vita permitia, mas agora ele está morto. Não há mais onde plantar... ou será que ainda está vivo? Continuará recebendo jogos? Mais franquias crescerão nele? Bandido! Nos dando susto dizendo que estava morto. Enquanto escrevia, carregava a bateria do meu PS Vita e pode ser o sono, mas no meio da confusão podia jurar que ele disse:

Me enterro como entender
Na hora que resolver.
Podem guardar seu caixão
Pra melhor ocasião

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sexta-feira, 22 de março de 2019

Vídeo sobre a produção de Devil May Cry 5


Esses dias a Capcom divulgou um vídeo que é basicamente um diário de produção com alguns dos desenvolvedores de Devil May Cry 5 como o diretor Hideaki Itsuno, o game designer Yoichiro Ikeda e mais. O vídeo é chamado de "Devil May Cry - Filosofia de Design" mas não vou dizer que vi muita filosofia ali.

Ainda assim tem umas histórias interessantes, como o ator que fez a captura de movimento de Nero que caiu no meio das filmagens e a queda ficou tão boa que acabou parando no jogo ou o fato que Nico originalmente seria uma personagem bem mais séria (os designs iniciais me lembram uma Tron Bonne mais realista) mas que a atriz acabou inserindo um pouco de humor nela.


É também um pouco assustador ver quanto a Capcom está investindo em captura de rostos como em Resident Evil 2 e Devil May Cry 5 com resultados fantásticos. Por ora é algo que apenas as grandes empresas podem bancar. Se isso se tornar o padrão nos próximos anos os jogos de maior valor de produção começarão a se destacar bastante dos outros graficamente.


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Nintendo e a Realidade Virtual


Recentemente a Nintendo anunciou um visor de realidade virtual de baixo custo que irá vender em 12 de abril na sua linha Nintendo Labo: VR Kit. A ideia tem muito potencial e é algo que eu já estava esperando a Nintendo fazer há um bom tempo, porém é um tremendo erro vendê-lo como um acessório do Nintendo Labo. Vamos falar um pouco sobre o que é o produto, por que ele erra em seu público alvo e os desafios da Realidade Virtual.

VR Kit e crianças

O visor em si se chama Toy-Con VR Googles, é bastante semelhante ao Google Carboard, e vai vir em edições de US$ 40 ou 80 dependendo de quantos jogos/experiências de papelão o acompanham. Trata-se de um acessório de plástico com lentes curvadas que encaixa em uma armação de papelão, na qual também se encaixa o Nintendo Switch. As lentes ficam apontadas para a tela e criam o efeito de realidade virtual.

Uma coisa curiosa é que não tem um headstrap, algo pra prender o visor na cabeça do usuário. É preciso ficar segurando o aparelho o tempo todo, o que dá uma certa aparência de brinquedo à coisa toda. Talvez a ideia seja justamente não invocar a imagem daqueles mundos virtuais imersivos para os quais as pessoas escapam em todos aqueles filmes sobre futuros distópicos.


O kit completo inclui papelão suficiente pra montar seis "Toy-Cons", os brinquedos de papelão do Nintendo Labo que dão acesso aos jogos/experiências. Além do próprio visor haverá o Toy-Con Blaster, a Toy-Con Camera, o Toy-Con Bird, o Toy-Con Wind Pedal e o Toy-Con Elephant. No kit Starter + Blaster mais barato virá apenas o óculos e a Blaster, mas os outros Toy-Cons poderão ser comprados separadamente depois na loja da Nintendo por US$ 20 cada, igualando o valor do kit completo.

Desde que o Switch foi revelado em sua forma de tela com dois joysticks que se separavam nas laterais eu já havia percebido essa possibilidade para um visor de realidade virtual acessível, infinitamente mais barato que um PSVR, Oculus Rift, etc. Como disse alguns anos atrás: "A Nintendo é a rainha do "bom o bastante" e poderia oferecer uma solução para Realidade Virtual boa o bastante e mais barata."

A tecnologia por trás do Toy-Con VR Googles parece ser ótima e excitante, eu sempre confio na Nintendo para entregar uma boa tecnologia em seus acessórios. No entanto ela será totalmente desperdiçada devido à forma que a Nintendo escolheu vendê-la. A linha Nintendo Labo é basicamente uma série de brinquedos educativos de papelão, uma ideia até boa mas que não decolou, voltada principalmente para crianças.


Crianças. A Nintendo repetiu o erro do Virtual Boy e do Nintendo 3DS ao criar um efeito que não é recomendado para crianças quando este é seu maior público. Tudo que mexe com a visão de crianças cria preocupações nos pais, desde a nossa época quando eles ficavam preocupados por estarmos jogando colados na TV sem piscar ou olhando para um GameBoy no escuro ou no carro. Tudo isso torna muito mais difícil vender um visor que ficará na cara delas.

A emoção virtual

Mas esqueçamos um pouco que as crianças podem ficar vesgas ou com dor de cabeça. Por que vender este conceito para elas quando o valor excepcional está justamente em um espectro de emoções fortes que elas não conhecem? Claro que crianças podem achar realidade virtual legal, mas elas cresceram com muita tecnologia impressionante. São as gerações mais velhas que sentem o salto de certas tecnologias atuais como se fossem magia.

Pessoas que hoje têm 20 anos já cresceram em um tempo em que o bug do milênio é só uma piada esquecida e não uma preocupação real de um apocalipse das máquinas. Hoje vemos a tecnologia como algo sob controle que acreditamos compreender em sua maioria. A Apple pode anunciar que veremos Pokémons nas ruas que apesar de acharmos legal não sentimos como nenhum tipo de revolução. Apesar de a tecnologia ser impressionante, ela não desperta emoção. Ver um Pikachu virtual não te desperta emoções.


Quanto mais jovens somos, mais fácil é nos surpreender, isso começa a ficar difícil a medida que crescemos. Basicamente temos uma progressão de "impressionável" para "indiferente" através dos anos. Para sentirmos aquele ponto fora da curva é preciso uma emoção muito forte que nos tire do status de achar que nunca mais vamos ser surpreendidos.

Não sei se preciso dizer que o Wii é um desses pontos fora da curva. Muitas pessoas não ligavam para como os videogames estavam progredindo tecnologicamente até que essa tecnologia permitiu que essas pessoas jogassem tênis ou boliche reproduzindo os movimentos, despertando uma emoção. Vale lembrar que o Wii foi um fenômeno em asilos.

Dos 20 aos 40 anos praticamente não nos assustamos mais com jogos de terror, já vimos vários deles e já temos uma noção do que esperar. Um jogo de terror em realidade virtual no entanto faz você se sentir em perigo, é uma emoção que provavelmente só poderia ser equiparada com a primeira vez que você jogou um jogo de terror.


Ao direcionar o Toy-Con VR Googles às crianças a Nintendo transforma a realidade virtual em um brinquedo, uma curiosidade, aparentemente sem um plano para longo prazo. Quase parece que ela está testando as águas virtuais antes de decidir se navega por elas, mas não pode ser isso devido ao público que ela escolheu visar.

No meio do caminho havia uma pedra virtual

Vale a pena dizer que apesar de toda essa conversa sobre realidade virtual e como eu me empolgo com ela, essa não é a evolução correta para os videogames. Como já falo há alguns anos, a direção saudável não é a imersão, um visor que te coloca dentro do jogo, mas a emersão, algo que faz o jogo sair da tela para a sua vida. Porém não temos qualquer empreitada real nesse sentido de emersão, o que cria um vácuo que pode sim ser preenchido pela realidade virtual como tecnologia disruptora até que a evolução correta surja.

Nesse vácuo ninguém tem mais chance de dar certo do que a Nintendo. Ela é a única empresa excepcional o bastante que conseguiria aliar um visor "bom o bastante" para realidade virtual com experiências realmente divertidas que criassem emoções prazerosas e guiassem o mercado como um todo em uma direção que o público gostaria de acompanhar.


Atualmente há poucos jogos de realidade virtual realmente bons, dá pra ver como o momento mais desconfortável para os idosos do React Channel é ao jogar. Praticamente os únicos que funcionam bem são galerias de tiro ao alvo, simuladores cômicos de alguma coisa, playgrounds de franquias famosas, experiências psicodélicas e jogos de terror. Isso significa que não temos atualmente um "Mario" da realidade virtual, nem um Minecraft, nem um Angry Birds, nem um Wii Sports. A tecnologia ainda não tem uma mensagem clara o bastante para que um software consiga transmiti-la para o usuário.

Dá pra ver com o Nintendo Labo: VR Kit que a Nintendo está estudando formas de trabalhar com a realidade virtual, quais jogabilidades talvez possam funcionar, porém ainda muito primitivamente. A última vez que vimos a Nintendo experimentando com tecnologia, focando-se nas diferentes formas de dizer algo ao invés da mensagem, ela acabou com projetos como o Wii U ou mesmo o Wii Remote Plus.

Veja como o Wii Remote Plus era uma versão melhorada do Wii Remote. Ele era capaz de fazer muito mais coisa ao oferecer posicionamento real do controle na tela, enquanto o Wii Remote apenas avisava ao videogame que o controle havia sido movido, sem transpor sua posição na tela. Ainda assim ninguém ligou para ele, porque não tinha o principal, a filosofia por trás do Wii, do Wii Remote e de Wii Sports.


Wii Sports era brilhante em passar a mensagem do Wii, enquanto Wii Sports Resort era só um conjunto de minigames como este do Nintendo Labo, ou como Nintendo Land do Wii U. Apenas demonstrações de como os controles podem ser usados. Repito, várias formas de dizer algo quando no fundo não havia uma mensagem para ser passada.

Conclusão

Eu fiquei muito animado com o Toy-Con VR Googles, a tecnologia, pois há muito tempo eu esperava que alguém fizesse isso e mais do que qualquer um eu esperava que fosse a Nintendo. Então me desapontou bastante que ele chegue com o Nintendo Labo e não com um Mario ou uma franquia inteira original como seria antigamente.

A Nintendo tem todas as cartas na mão para dominar o mercado de realidade virtual, mas desconfio que ela apenas não queira. Vale lembrar que Shigeru Miyamoto já experimentou visores de RV e não parece ter gostado tanto. Ele chegou a dar uma declaração um pouco em cima do muro na época do Wii U:

"Quando você pensa em realidade virtual, é meio que uma pessoa colocando um óculos e jogando sozinho em um canto ou talvez em um quarto separado e ela passa todo seu tempo sozinha jogando nessa realidade virtual, isso está em contraste direto com o que esperamos realizar com o Wii U. Eu tenho um pouco de desconforto sobre esse ser o melhor jeito das pessoas jogarem"


Não o culpo, acho até que ele está certo em achar que eles não são bons atualmente. Porém a conclusão que ele tirou disso é que provavelmente a Nintendo não deveria investir em realidade virtual, enquanto a minha conclusão é que eles deveriam conquistá-la.

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