domingo, 7 de abril de 2013

O problema de endeusar os criadores

Hideo Kojima criador da série Metal Gear. Não, ele não é Deus.

  Se o ser humano tem fraquezas, uma das suas maiores é o endeusamento de outros seres humanos. Os mitos, se levados a um extremo, podem nos causar mal e levar ao abismo. Filosofas a parte, o que venho discutir nesse artigo é o quão mal pode nos fazer uma idolatria e como fugir disso.

  A idolatria é muito tentadora, afinal não é fácil criar nem construir coisas belas. Ao se conseguir isso automaticamente nos curvamos perante tal obra. A adoração a obra começa exatamente nesse ponto. O problema começa quando começamos a adorar o criador. Para isso imaginamos que tal feito só é possível ter vindo de um ser divino, alguém com habilidades acima do normal, sem questionarmos se isso é de fato verdade.

  Mas quais os reais problemas em se endeusar criadores? O primeiro problema é de acreditar que eles possuem habilidades divinas. Eles não são acima de ninguém  O que os separa dos demais é o seu esforço e não uma capacidade especial. Com exceção de épocas em que a informação era inalcançável para a grande parte das pessoas, os criadores nascem sem nenhuma grande vantagem. Os seus diferenciais são a capacidade de dedicação e o esforço para tal feito.

 O processo de criação, como já mencionado nesse artigo do blog, é um processo que requer entendimento. Não é uma simples questão de inspiração e sim de muito estudo. O processo de criação é complexo e difícil mas não é algo inatingível. Por exemplo, J.R.R. Tolkien , criador da obra "O Senhor dos Anéis", demorou 15 anos para escrever todos os três livros da saga, só depois de uma longa carreira como professor de filosofia e estudos linguísticos, além de um profundo conhecimento em mitologia. Portanto, Tolkien só foi capaz de criar tal obra magnifica após uma grande dedicação ao longo de sua vida e não graças a uma inspiração divina ou um dom como muitos gostam de acreditar, inclusive criadores que não sabem como são capazes de criar e atribuem suas realizações a sorte, dom ou superioridade intelectual.

Acima : Tolkien e seu cachimbo. Os hobbits certamente foram inspirados no próprio.

 O segundo e mais grave  problema se deve a idealização de tais seres. Esse ideal se torna tão grande a ponto de não se questionar mais a qualidade de suas obras e de se cegar por qualquer escolha ou opinião que possa ser atribuída ao criador ou obra. Como se não fosse possível que o sujeito cometesse erros.

  Um exemplo na industria dos video games é o criador de Mario Bros., Shigeru Miyamoto. Tal culto pelos seus feitos o tornaram quase como um Deus sob a Terra, onde tudo que ele toca virasse ouro e se algo que ele toca não vira, não é por sua culpa, a culpa é de outro. Já podemos imaginar o caos que isso pode causar. Se ele é livre para fazer o que quiser sem ser questionado, é sugerido um poder que pode ser usado sem consequências. Mario vem caindo em popularidade ano após ano mas ninguém questiona Miyamoto e suas escolhas. O fato dele ter abandonado a série Super Mario Bros. (Mario 2D) ou ter entregue a série Zelda nas mãos de pessoas incapacitadas não são expostas. Com isso ele continua tomando as mesmas atitudes em um longo espiral da morte.

 Pintura no teto da Capela Nintendista.

 Por ultimo temos mais um problema: o ego. O criador convencido de que realmente possui um dom especial centraliza toda a obra nele. Essa concentração cria uma visão singular da obra tornando qualquer outro entendimento como errado. Uma grande obra precisa ser flexível a visão do publico onde as lacunas são preenchidas pela imaginação do consumidor. O criador egocêntrico ignora qualquer visão de fora e se fecha, impedindo que alguém de fora possa se conectar. É muito comum o artista pensar que o publico não é capaz de entender a sua "genialidade" ao invés da dificuldade em se conectar. Como consequência, apenas um pequeno grupo consegue, o qual se sente especial pelo feito.

 Mudando de industria e indo para o cinema temos o já clássico exemplo de George Lucas, escritor de Star Wars. Lucas fora cultuado por anos pelos fanáticos da franquia até que o diretor resolveu alterar as obras antigas modificando cenas, incluindo efeitos ridículos de computação gráficas e substituindo atores. A sensação era de que aquilo que todos nós amávamos fora violado brutalmente. A desculpa de Lucas era de que a sua visão finalmente poderia ser mostrada com os avanços da tecnologia.

George Lucas e seu novo amigo Mickey Mouse

 A solução para esse problema é simples: não idolatre ninguém  E para os criadores a resposta é simples: você não é dotado de uma inteligencia superior, nem possui uma mente criativa acima das demais. Seja simples, objetivo e principalmente, estude!  Mesmo criticando George Lucas, a saga Star Wars só surgiu após o mesmo estudar sobre a Jornada do Herói, conceito baseado nos trabalhos do grande estudioso de mitologia Joseph Campbell.

 Na próxima semana estarei discutindo sobre a Jornada do Herói, o que significa e os diferentes processos de criação de um novo mito. Se você tem interesse em criar histórias ou apenas entender como funciona continue acompanhando o blog.

Um comentário:

  1. Acredito que quando uma pessoa desenvolve várias ideias seguidas.. que se tornam sucesso...
    É natural termos os "fãs".. que exageram um pouco em suas colocações..
    Muitas vezes nem transformam o cara em um deus.. mas como se identificam no trabalho dele.. acabam por comprar todas as suas ideias...
    É algo que acontece em qualquer área da sociedade.. principalmente nas artes.. música.. cinema.. literatura...

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