sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Quem é e para onde vai a Retro Studios


Na Nintendo havia uma ideia, reunir um grupo de indivíduos talentosos, para ver se eles poderiam se tornar algo mais, para que quando precisássemos eles pudessem desenvolver os jogos... que ela nunca pode. Foi assim que nasceu a Retro Studios como uma second party, uma empresa da própria Nintendo focada em criar jogos que não faziam o estilo da Nintendo.

Nunca foi uma novidade para a Nintendo que ela tinha dificuldade em fazer certos jogos, como FPS e games mais adultos, e ao reconhecer essa falha ela decidiu adquirir outros estúdios que pudessem fazê-los por ela, como a Silicon Knights, produtora de Eternal Darkness e a Retro, que foi meio que uma aposta no escuro. Vamos ver melhor quem é a Retro Studios e por que ela pode acabar.

Tudo começa com o antigo fundador da Iguana Entertainment, Jeff Spangenberg, um cara meio excêntrico mas que havia ajudado a empresa a atingir um bom patamar, com alguns sucessos como Aero the Acrobat, ports de NBA Jam, o port de Side Pocket para Super Nintendo, entre outros. Em geral a Iguana pegava projetos pequenos mas fazia um trabalho razoável e Aero era sua única franquia original de peso.


No meio da jornada do estúdio surgiu a oportunidade de ser comprada pela Acclaim Entertainment e a Iguana topou em 1995 por uns US$ 5 milhões. Eventualmente a empresa emplacou também Turok: Dinosaur Hunter no Nintendo 64 e a Nintendo até promoveu a série já que era um jogo de tiro adulto em seu console, um gênero que ela não cobria bem.

Durante seus anos finais a Acclaim começou a tomar muitas decisões erradas e era um grande caos administrativo lá dentro. Jeff Spangenberg foi demitido e processou a empresa por quebra de contrato, provavelmente porque seu contrato não permitia que fosse demitido da própria empresa que criou, mas a Acclaim já não devia estar muito preocupada com isso já que iria falir em pouco tempo.

Provavelmente a ponte criada entre a Iguana/Jeff e a Nintendo durante o Nintendo 64 acabou se pagando já que a Nintendo resolveu entrar numa nova empreitada com Jeff para criar a Retro Studios em 1998, uma equipe focada no desenvolvimento de jogos para um público mais velho que a Nintendo não tinha interesse em atender por conta própria. Aqui as coisas começaram a dar bem errado pra Jeff.


Empolgado com sua empreitada, ele começou a recrutar todos os talentos que podia, alguns dos melhores da indústria e principalmente gente com experiência que ele conhecia da própria Iguana Entertainment. Jeff parecia ficar especialmente feliz de tirar gente das mãos da Acclaim, provavelmente ainda por rancor de ter sido demitido.

A questão aqui é que ele se empolgou demais e começou a contratar muita gente antes mesmo de ter projetos para tal. É um dos grandes erros cometidos por desenvolvedores como Cliff Bleszinski, David Jaffe e Keiji Inafune, sair de um grande estúdio e levar a mesma filosofia de desenvolvimento para um pequeno estúdio, sem perceber que ela não se encaixa. Principalmente no âmbito financeiro.

Logo de cara a Retro, um estúdio recém-criado, começou a trabalhar em vários projetos ao mesmo tempo, como um RPG chamado Raven Blade, um jogo de combate entre carros, jogos de esporte, entre outros. A empresa estava bem sem direção e basicamente muitos artistas e programadores estavam à toa ou voando solo, sem tarefas específicas. Na época também era comum que os estúdios precisassem fazer suas próprias engines para cada console, não havia ainda a Unreal Engine.

Por um tempo o estúdio ficou uma bagunça e tudo que exibia era claramente muito sem planejamento, muito inicial, extremamente distante de virar um produto final. Depois de algum tempo nessa bagunça e queimando um bocado de dinheiro de sua parceira, a Nintendo decidiu intervir e mandou seu maior especialista em jogos: Shigeru Miyamoto.


Os desenvolvedores da Retro sentiram a pressão e quando Miyamoto falava eles só concordavam. Eles mostraram o jogo de combate entre carros, Miyamoto disse: "Por que os carros precisam de armas? Eles não podem só bater uns nos outros?" e os desenvolvedores responderam: "Tem razão. Não sabemos por que estamos desenvolvendo esse jogo". Vale lembrar que franquias como Twisted Metal e Vigilante 8 tinha tido sucesso na época e não seria mal o GameCube ter seu próprio jogo do gênero.

Miyamoto basicamente cancelou todos os projetos da Retro de tão iniciais e sem direção que estavam. Porém ele gostou da engine gráfica que eles haviam feito para o jogo de RPG e assim encaminhou a mão de obra da empresa para um projeto próprio dele, sem dúvida a aposta mais arriscada da Nintendo naquela geração: Metroid Prime para o GameCube.

A ideia de reimaginar a série Metroid como um FPS era extremamente ousada, com uma chance enorme de dar errado. Miyamoto viu o potencial daquele grupo de desenvolvedores perdidos de fazer o que eles faziam de melhor na Iguana, jogos em primeira pessoa. Mesmo que em todas as outras etapas de planejamento eles não fossem muito bons, ele poderia liderá-los e suprir essa demanda.


O resto é história. Metroid Prime foi um sucesso muito maior do que qualquer um poderia imaginar. Nem tanto de vendas pois enquanto vendeu muito bem para um Metroid, não vendeu tanto quando comparado a outros FPS da época. No entanto sua qualidade era inquestionável. Por um tempo a Retro fez as sequências de Metroid Prime, até que partiu para seu próximo projeto.

Donkey Kong Country Returns do Nintendo Wii é outro jogo que teve uma grande aclamação do público. A série Country estava sumida e apesar de Jungle Beat ser um jogo bem legal, não era um bom Donkey Kong pois não era o que o público queria. A ideia de dar a franquia para a Retro, conhecida pela qualidade de Metroid Prime, era garantia de hype entre os fãs e os comparativos com a Rare, que criou a série Country original, se fortaleceram.

Apesar de inicialmente DKC Returns ter um bom impacto, ao jogar um pouco mais ele revela alguns problemas que incomodam, como ser scriptado demais, e o tornam bem menos genial que Metroid Prime, o qual também é um patamar alto para se alcançar. Isso levanta uma questão. Quanto custa a produção de um jogo de alta qualidade?


Empresas como a Rockstar, por exemplo, se arriscaram por muito tempo com estratégias de tudo ou nada. Ela investia tudo no desenvolvimento de seu próximo jogo com alta qualidade. Investia milhões e então recebia milhões de volta em lucro. Quando um jogo falhava no entanto, o prejuízo era imenso e arriscava falir a empresa (Você sabia que uma vez a Nintendo quase faliu a Rockstar? Mas isso é história pra outro dia).

Já empresas como a Nintendo não, elas se arriscam muito menos. Ela gasta uma quantidade razoável no desenvolvimento e extrai muito de lucro de vendas graças a uma série de fatores, seja o carisma de suas franquias de incrível sucesso ou seu público extremamente fiel. Um Mario é garantia de milhões de vendas, independente de quanto é gasto em sua produção.

Esta é a filosofia da Nintendo para desenvolvimento: investe-se pouco, colhe-se muito. Extrai-se o muito do pouco. Cria-se uma bola rosa e vende-se os jogos dela aos milhões. Não esperamos que a Nintendo faça jogos com custo exorbitante e nível de detalhamento exagerado como GTA 5 ou Red Dead Redemption 2, pois não é assim que ela pensa. (Não citem Super Smash Bros. como exceção porque quem manda nesse é o Sakurai. Se ele diz que quer uma orquestra, a Nintendo contrata uma orquestra ou ele ameaçar tirar dinheiro do próprio bolso pra contratar).

Quando a Nintendo investiu em empresas como a Rare ou a Retro não é apenas porque viu profissionais incríveis, mas porque viu profissionais incríveis e lucrativos, que extraíam muito do pouco. Quando você já tem muito desde o início, ou seja, você contrata os melhores profissionais, dá a eles bastante tempo e gasta muito dinheiro com esse processo, você já espera que o produto final seja de alta qualidade. Porém nesse caso o lucro pode ser menor porque o dinheiro investido é muito e um jogo de alta qualidade não garante um retorno proporcional em vendas.


A Rare era extremamente útil como um estúdio pequeno, como quando trabalhava para a LJN fazendo jogos licenciados. Ela pegava pouco e extraía muito, o que deve ter chamado a atenção da Nintendo. Anos mais tarde a empresa estava produzindo GoldenEye 007 para o Nintendo 64. Porém já no desenvolvimento desse jogo a Nintendo estava tendo dificuldades de controlar a Rare e tinha que lidar com os seus atrasos e custos.

Os projetos da Rare ficavam cada vez mais longos e mais caros, sem retorno garantido. Conker's Bad Fur Day era um jogo infantil que demorou tanto em seu desenvolvimento que virou um game de paródia. Perfect Dark também teve um desenvolvimento longo, Dinosaur Planet nem ficou pronto a tempo de sair no Nintendo 64 e assim por diante. Essa era a mesma empresa que pouco tempo atrás fazia jogos simples como Blast Corps. A cada novo jogo eles ficavam mais ambiciosos.

Quando a Nintendo viu que não era mais lucrativo manter a Rare, ela vendeu o estúdio e se livrou desse abacaxi. Esse pode muito bem se tornar o destino da Retro Studios se cada vez eles tiverem projetos maiores, com maiores custos e sem retorno garantido. Na mesma época do Nintendo 64 a Iguana lançou Turok e criou uma franquia de tamanho razoável onde antes não havia praticamente nada. Esse tipo de talento é interessante para uma empresa grande.


Uma empresa com o tamanho e o custo da Retro botando um jogo no mercado a cada 2 a 3 anos com vendas que variam bastante simplesmente não se alinha com a filosofia da Nintendo. Um dos grandes problemas de estúdios como a Rare e a Retro é que eles parecem ignorar o peso financeiro nas decisões da Nintendo. Se fosse a Rockstar, seria esperado que os estúdios investissem em projetos cada vez maiores, mas a Nintendo se interessa mais em eficiência.

A Retro Studios praticamente não aparece mais nas conversas da Nintendo, estava desenvolvendo seu próximo projeto há bastante tempo em segredo e só agora voltou a ser mencionada. Metroid Prime 4, que inicialmente não seria desenvolvido pela Retro e sim por um estúdio interno da Nintendo, teve seu desenvolvimento rebootado e agora contará com presença da Retro.

Segundo a Nintendo, o resultado não estava atendendo a qualidade esperada da série, mas faz você se perguntar, por que a Retro não estava envolvida desde o início. É possível que a Nintendo queira se livrar da empresa mas percebeu que ainda não consegue fazer um FPS por conta própria sem rodinhas na sua bicicleta.


Também pode significar novamente a sombra da perda de Iwata já que quem provavelmente tomou a decisão de levar o desenvolvimento de Prime 4 para um estúdio interno deve ter sido Kimishima. Porém o que acontece com o projeto que a Retro estava desenvolvendo até agora? Será cancelado? A Nintendo já fez isso antes com a empresa. Serão contratadas mais pessoas para trabalhar na empresa, aumentando assim seus custos?

É bastante possível que a Nintendo já esteja considerando fechar ou vender a Retro Studios, seguindo o mesmo caminho da Rare.

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Os modos que sinto falta em Super Smash Bros. Ultimate


Super Smash Bros. Ultimate, Everyone is here!, mas... a maioria dos modos que eu gostava dos jogos passados da série não estão. Recentemente foi revelado o modo história de Super Smash Bros. Ultimate, chamado World of Light, porém confesso que não me agradou muito e fez pensar em como a falta de mais conteúdo single player me afastou do jogo.

Assim como a maioria dos jogos de luta, Super Smash Bros. Ultimate é focado no multiplayer, algo comum em Street Fighter 5, Tekken 7, Soul Calibur 6, todas as grandes franquias de jogos de luta nos altos dígitos. Porém, acredito que haja um bom público para conteúdo single player nos jogos. A maioria das pessoas não joga pela porção competitiva, apenas para brincar com os amigos, então mais conteúdo single player significa maior valor quando os amigos não estão por perto.


Super Smash Bros. Melee parecia saber bem disso e se por um lado muitas pessoas ainda jogavam porque ele era fantástico competitivamente, muitas outras o jogavam porque havia muita coisa para fazer nele. Gastei horas no modo "RPG" de Street Fighter Alpha 3, conheci a história de Jojo's Bizarre Adventure através do jogo de luta da Capcom e o reboot de Mortal Kombat se tornou um dos meus jogos preferidos devido à história single player.

World of Light parece para mim um modo single player muito parecido com o de Dragon Ball FighterZ. Inicialmente à primeira vista parece divertido, porém apenas traz lutas e mais lutas muito iguais, sem variedade o suficiente para dar uma profundidade extra ao jogo. Então ao invés de ficar falando como Ultimate não me agrada, vou falar dos modos que eu sinto falta de capítulos passados de Super Smash Bros.

Adventure Mode

De longe o que eu mais sinto falta, o Adventure Mode de Super Smash Bros. Melee te colocava em fases baseadas nas séries mais famosas da Nintendo, com design simplificado, inimigos e algumas batalhas especiais. Dentro dessas fases você podia explorar, ganhar troféus, perder vidas se não fosse cuidadoso, e em geral ver um pouco do conteúdo dessas séries que compõem o jogo.


Ele tinha essa parte importante de representar sobre o que são essas franquias, ver os mundos aos quais elas pertencem, é muito divertido passar pelo Reino dos Cogumelos com um personagem que não seja Mario ou atravessar um templo de The Legend of Zelda com alguém que não seja o Zelda e assim por diante. Realmente invoca a aura celebrativa de Super Smash Bros. de reunir todas essas franquias.

Vale lembrar que nessa época não havia história para o modo single player de Super Smash Bros., você passava por todas essas fases e batalhas simplesmente porque sim, e as rejogava infinitamente porque eram divertidas e você queria aumentar sua coleção de troféus. Um modo semelhante e com um pouco mais de variedade seria perfeito para um novo Super Smash Bros.


Subspace Emissary

Um grande problema que o Subspace Emissary tinha era ser comparado ao Adventure Mode, quando claramente ele não tinha a mesma pegada. Ele ainda trazia fases, inimigos e muitas das mesmas ideias, porém ele não trazia o mesmo conteúdo. A maioria de suas fases mal lembravam as fases dos jogos de verdade de onde saíram e seus inimigos eram em maioria genéricos. As fases eram mais como cenários de fundo do que realmente fases.


O modo Subspace Emissary era inferior ao Adventure Mode em praticamente tudo, exceto em alguns pontos. O primeiro, a história com cutscenes bem no estilo Vingadores em que todos os personagens se reúnem para enfrentar os inimigos. O segundo, ele contava com um modo cooperativo, o qual inevitavelmente já melhorava em muito a jogabilidade, com um estilo meio beat'em up. Eu sinto falta dessa parte cooperativa e acho que poderia haver mais. Por último, ele tinha ótimas lutas contras chefes exclusivos do modo.


Uma coisa legal que foi muito pouco explorada no Subspace Emissary era a capacidade de melhorar seu personagem com Stickers, adesivos. Cada personagem tinha base de seu troféu para colar adesivos e ficar mais forte, alguns adesivos maiores que outros, alguns com bônus melhores e o jogador tinha que fazer malabarismo para colar o maior número deles. Era como arrumar a maleta de armas de Resident Evil 4. Esse elemento quase de RPG é algo que poderia ser muito explorado em um single player da franquia.


Event Match

Esse modo teve sua estreia em Super Smash Bros. Melee e até esteve presente em Super Smash Bros. para Wii U e 3DS. Aparentemente ele não retornará para Super Smash Bros. Ultimate segundo informações, mas talvez apenas esteja em algum lugar mais escondido nos menus. Por ora vou acreditar que realmente não está lá ou ao menos que não será tão legal quanto em Melee.


As Event Matches são lutas especiais com condições variadas e às vezes até alguns elementos exclusivos, como foi o caso de Giga Bowser (também um chefe secreto no Adventure Mode). Essas batalhas tinham uma pequena história e características baseadas nessa história, como dano aumentado, apenas pokébolas como itens ou apenas bombas, além de lutas contra "chefes", os quais estavam ausentes no Wii U.


Cada porção de batalha também estava atrelada ao desbloqueio de novos personagens, afinal não dava pra ter um evento com Mewtwo se ele ainda não estivesse liberado. Então quanto mais personagens você liberava, mais eventos tinha pra jogar. Hoje com a possibilidade de DLCs gratuitos esse é o modo que mais teria a ganhar com eventos extras semanais ou mensais.

Conclusão

Para todo o conteúdo que Smash Bros costuma ter em seus jogos eu sempre fico abismado como normalmente não é investido o suficiente na experiência single player. O multiplayer competitivo permite que o jogo permaneça relevante durantes anos porém apenas para uma certa parcela de jogadores. Outros irão trazê-lo sempre para reuniões de amigos. Porém uma grande parcela irá eventualmente encostá-lo.

Considerando que se trata de uma série comemorativa com tantos anos de história Nintendo, ainda é impressionante pra mim que ela não se mexa para criar um modo single player viciante que mantenhas as pessoas retornando para jogar cada vez mais. Super Smash Bros. Ultimate ainda não é a versão definitiva do jogo que eu quero, pois apesar de "Todos estarem aqui", eles não estão indo a lugar nenhum.

quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Os estúdios secretos que criam os melhores jogos


Aqui no blog eu já mencionei que às vezes alguns jogos surpreendem com uma qualidade que a produtora original não poderia ter, como é o caso de Sonic Colors que eu não acredito que tenha sido feito pela Sonic Team, e muitos dos leitores acharam que eu estava maluco. "Como assim outro estúdio fez o jogo no lugar da Sega? Não faz sentido", então eu resolvi falar um pouco mais sobre esses estúdios secretos que fazem alguns dos melhores jogos da indústria.

Há muitos nomes para esse trabalho como "mercenário", "desenvolvedor fantasma", "equipe secreta", entre outros. A ideia é que por uma quantia em grana, esses caras pegarão o seu jogo ou franquia e irão torná-lo melhor, às vezes até excepcional, sem que ninguém jamais saiba que eles trabalharam no seu jogo. É um pouco anti-ético por parte das empresas, porém alguns estúdios até preferem trabalhar assim.

Vale lembrar que não estamos falando de outsourcing, que é quando uma empresa paga outra pra fazer uma parte do jogo mas esse outro estúdio ainda é creditado por isso. Muitas empresas têm usado recentemente mão-de-obra asiática barata e qualificada, como da China e Coreia, para baratear custos. Por exemplo, em Horizon: Zero Dawn havia uma empresa inteira dedicada apenas a criar e animar alguns dos robôs, outra empresa inteira para rostos e expressões faciais, e assim por diante.

Normalmente os estúdios utilizam outsourcing para trabalho braçal e até um pouco do artístico, mas as empresas secretas não, elas são especializadas em deixarem seu jogo bom. Elas mexem principalmente na jogabilidade e nas fases, às vezes até mesmo na parte conceitual do jogo ou fazendo o projeto inteiro sem que ninguém saiba. Quando apenas fazem pequenas trechos e melhorias em jogos, algumas dessas empresas chegam a trabalhar em até dez projetos durante um ano.


Quando você tem um jogo que não está divertido, quando não tem ideia de como levar uma franquia adiante ou quando até tem todo o seu conceito de jogo em ordem mas não tem tempo ou pessoal qualificado para dispor, é aí que você chama um desses estúdios. Eles farão seus problemas sumirem sem que ninguém fique sabendo que eles sequer existiram em primeiro lugar.

Os motivos tanto para quem os contrata quanto para quem escolhe trabalhar nesse molde são variados. Algumas empresas podem não querer passar uma imagem de incompetência para o público e investidores ao pedirem a ajuda de outros estúdios. Outras podem não querer que vaze a informação que um jogo aguardadíssimo na verdade está virando uma bomba. Algumas podem não querer que as pessoas pensem que o jogo terá menos do charme da empresa porque outra produziu uma parte, etc.

Já para quem aceita ser contratado sem créditos, há algumas vantagens. Alguns estúdios mercenários cobram um extra para realizar o trabalho em sigilo, o que é vantajoso em curto prazo, outros conseguem mais trabalho devido a sua discrição e quanto mais discretos forem, mais serão recomendados entre os círculos internos das grandes empresas como resolvedores de problemas. A maior desvantagem é que às vezes as pessoas não os reconhecem e não sabem da sua qualificação.

Especificamente no caso dos estúdios japoneses há ainda toda uma cultura de ninjas que trabalham através das sombras. Há estúdios inteiros que não só não querem ser creditados que ainda entram em desespero se você disser que irá creditá-los, pois seria o equivalente a um ninja ter o rosto mostrado na televisão, é quase o fim de carreira para eles.


De todos os estúdios secretos, a mais conhecida é a Tose e temos que parar um instante para apreciar a ironia de um estúdio secreto que é bastante conhecido. A Tose foi fundada em 1979 em Kyoto, no Japão e já trabalhou com algumas das maiores empresas de jogos como Nintendo, Capcom, Square Enix, Sega, Konami, Bandai Namco e até mesmo estúdios americanos como a Electronic Arts.

Às vezes tudo que a Tose faz são ports, convertendo jogos antigos para novos videogames. No entanto as empresas confiam tanto na Tose que muitas vezes emprestam franquias para que ela crie seus próprios jogos. Dois títulos excepcionais que eu adoro do Nintendo DS por exemplo são da Tose: Super Princess Peach e Dragon Quest Heroes: Rocket Slime, ambos publicados como jogos da Nintendo e da Square Enix, respectivamente.

A Tose produziu praticamente todos os jogos de Dragon Ball antigos do Super Nintendo, como o RPG Legend of the Super Sayan, a série de luta Super Butouden e provavelmente o Hyper Dimension, mas é difícil saber. Trata-se de uma empresa que já tocou em milhares de jogos, e digo este número literalmente, e mesmo assim quase nunca é creditada e para o público em geral ela mal existe.

O que garante então que a Tose não seja apenas uma lenda urbana? Bom, a maioria dos insiders da indústria sabem sobre ela e ficam sabendo quando é ela que acaba desenvolvendo um jogo, só não é conhecimento público. Às vezes o nome da Tose chega a ser creditado em jogos na área "Special Thanks" dos créditos, sem detalhamento de seu envolvimento e com pseudônimos nos nomes dos envolvidos.


Porém a maior evidência da existência da Tose é justamente em jogos da Nintendo. Eles são coautores ao lado da Nintendo da série The Legendary Starfy, uma franquia de plataforma submarina parecida com Kirby que só teve um dos jogos lançados no ocidente para o DS. A Tose também portou a série de minigames Game & Watch clássicos da Nintendo para o Game Boy.

Como eu disse, a Tose é a mais conhecida, e talvez alguns dos leitores até já tenham ouvido falar dela, talvez alguns pensassem que se tratava apenas de uma lenda urbana. É bem difícil comprovar o envolvimento do maior estúdio secreto que já trabalhou em milhares de jogos que passaram pelas nossas mãos, agora imagine como é difícil encontrar os menos conhecidos.

Entre alguns dos que realmente sabemos: Resident Evil: Code Veronica não foi feito pela Capcom, foi feito por um estúdio chamado NexTech, vários jogos de séries de RPG como Final Fantasy, Persona e Yakuza passaram por uma empresa chamada Hyde, Overwatch teve partes feitas por uma desenvolvedora chamada Supergenius, Street Fighter 5, Final Fantasy 15 e BioShock Infinite tiveram a mão do Streamline Studios.

Há ainda outros desenvolvedores secretos como a Snowed In Studios e Fuel Industries que sabemos que fazem jogos para grandes empresas, mas sequer sabemos algum projeto em que tenham se envolvido. A maioria desses estúdios é antiga, dos anos 2000 e até antes. A Snowed In Studios é a única mais recente, fundada em 2010 e trabalhou primariamente em plataformas atuais como o PlayStation 4 e Xbox One.


Para quem acompanha o mundo dos jogos, talvez essa não seja a primeira vez que ouve falar da Hyde, pois ela esteve envolvida em algo nos últimos anos. Após Keiji Inafune, um dos criadores de Mega Man, deixar a Capcom ele realizou uma campanha de financiamento coletivo para um jogo chamado Mighty No. 9 que seria um sucessor espiritual do robô azul. O projeto atrasou muito e as pessoas ficaram revoltadas, principalmente porque antes do jogo estar sequer pronto, Keiji abriu outra campanha para outro jogo.

Esse segundo jogo chamado Red Ash seria um sucessor espiritual da franquia Mega Man Legends, assim como Mighty No. 9 seria de Mega Man. A principal causa da revolta foi por Inafune já estar pensando em outro jogo quando o primeiro ainda estava atrasado, mas havia uma outra reclamação que surgiu nessa época. A produtora que ele havia escolhido para produzir Red Ash, uma tal de Hyde que ninguém nunca tinha ouvido falar.

Muitos das pessoas que diziam não querer colaborar com a campanha de Red Ash mencionaram a loucura de Inafune de contratar um estúdio que não tinha qualquer histórico de desenvolvimento relevante, no entanto ele provavelmente já os conhecia, o que pode ou não indicar que a Hyde já trabalhou com a Capcom. A Hyde parece ter mexido em muitos RPGs, então talvez ela tenha produzido Mega Man X: Command Mission?

Algum tempo depois que a campanha falhou, o presidente da Hyde deu uma entrevista descontraída na qual revelou que a empresa é um desses estúdios secretos da indústria. E quando as pessoas diziam que eles não tinham experiência para produzir jogos, ele apenas riu e disse que era uma das desvantagens de ser um estúdio secreto.


No caso específico de Sonic Colors, talvez tenha havido mesmo a mão da Dimps, uma empresa que desenvolveu vários jogos de Sonic para portáteis em conjunto com a Sega, como Sonic Advance, Sonic Rush e as versões de Sonic Colors (NDS) e Sonic Generations (3DS). No início eu não achava que a Dimps tinha esse cacife todo para melhorar tanto o jogo, pois os Sonics portáteis eram legais mas não excepcionais, mas depois de Sonic Generations do 3DS e Dragon Ball Xenoverse, realmente dá pra ver que alguém lá sabe o que faz.

Quando a Sega chamou a Dimps para fazer as versões portáteis de Sonic foi justamente por não ter pessoal suficiente para fazê-las ela mesma, o que parece ser o caso de Colors, conteúdo demais para pessoal de menos. Eles também tinham conhecimento prévio do console por terem feito a versão Wii de Sonic Unleashed. É completamente possível, mas foi o que aconteceu? Talvez nunca saibamos.

A verdade é que a indústria de jogos é excelente em guardar seus segredos, especialmente o setor japonês que é de onde provém boa parte desses estúdios secretos. Se eles não quiserem revelar que eles trabalharam em um jogo, provavelmente jamais ficaremos sabendo, ou então saberemos 10, 20 anos após eles terem sido lançados.

Para um olho treinado no entanto, não é tão difícil captar as oscilações de game design, quando um estúdio simplesmente faz um jogo que não poderia ter feito, cuja filosofia não bate. Um ponto fora da curva. Um sussurro de fantasma na multidão.

segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Nintendo, derivação e Bowsette


Uma das modas recentes dos últimos anos e que só tende a crescer ultimamente é a de vendas com base no carisma e não necessariamente em conteúdo. Já vemos isso há algum tempo no Japão com jogos de waifus, porém a onda tem chegado forte no ocidente com jogos como Undertale, Overwatch e Splatoon. Recentemente tivemos a explosão de "Bowsette" para mostrar o poder de marketing que a derivação tem, mas onde andava a Nintendo durante todo esse tempo? Caçando fangames na internet.

Um jogo como Overwatch tem a mesma quantidade de jogadores que Rocket League, no entanto a projeção que os fãs dão ao jogo, faz com que pareça que ele é muito maior. Pergunte a uma pessoa aleatória o que é Undertale e ela não saberá, mas fãs conseguiram que praticamente ninguém na internet tenha passado os últimos anos sem ver alguma fanart, vídeo ou referência do jogo, além de fazerem com que ele fosse eleito o melhor jogo de todos os tempos no GameFaqs. Splatoon 2 por sua vez se tornou uma febre no Japão e até mesmo Arms ganhou alguma projeção com seus personagens, apesar de agora estar esquecido.

Todos esses são jogos que não oferecem tamanho conteúdo para justificar essa adoração, mas isso não importa tanto quanto oferecer carisma, estilo sobre substância. Estamos em uma época muito "social" na qual o carisma vende seu produto muito mais do que aquilo que de fato ele traz. Essa onda social, é alcançada através da derivação, quando os fãs pegam seu produto para si e o transformam na internet, aumentando seu alcance com sua paixão (ou positividade forçada como alguns youtubers).

Ao olhar Overwatch e Rocket League não é difícil ver que não temos fanarts de Rocket League, porque seus personagens são genéricos, são carros, seria como ter fanarts de Fifa. Assim mesmo ambos tendo o mesmo tamanho e Rocket League por incrível que pareça tenha mais projeção no cenário competitivo, Overwatch parece um jogo maior, porque você vê mais pessoas criando conteúdo sobre ele, dizendo o quanto adoram seus personagens, comprando bonecos e outros tipos de produtos.


O que aconteceria se a Blizzard dissesse que as pessoas não podem criar conteúdo para Overwatch? Por um tempo isso aconteceu, quando a empresa tentou impedir que criassem conteúdo adulto com seus personagens e isso deixou o público bem zangado. Mas imaginemos um cenário hipotético que vá além, no qual nem mesmo vídeos sobre Overwatch possam ser criados, gameplays, transmissões no Twitch. Parece absurdo, não é?

No entanto é exatamente assim que a Nintendo tem lidado com a derivação na internet, proibindo-a. Claro, ninguém é proibido de fazer fanarts da Bowsette, mas faça um gameplay de um jogo da Nintendo e ela o tirará do ar, ou pegará a monetização para ela. Nenhum youtuber ou streamer atualmente quer trabalhar com jogos da Nintendo. Faça um fangame e por mais idiota que ele seja, ela o tirará do ar, mesmo sem jamais tirar jogos mal intencionados de verdade do Google Play.

Essa atitude não apenas machuca os fãs da Nintendo, mas impede que eles contagiem outras pessoas com sua empolgação, como fãs de Overwatch e Undertale fizeram. Até mesmo Minecraft deve muito de seu sucesso ao fato de que youtubers mostraram o jogo para outras pessoas que poderiam gostar dele. Enquanto isso a Nintendo continua tratando a internet como inimiga.

Masahiro Sakurai, criador de Super Smash Bros. ficou sem vontade de botar um modo história nos novos jogos porque todas as cutscenes de Super Smash Bros. Brawl caíram no YouTube rapidamente após o lançamento do jogo, como se isso anulasse todas as vantagens de ter um modo história ou de sequer ter cutscenes, as quais diga-se de passagem eram fantásticas.


A forma como a Nintendo enxerga a derivação de seus produtos como um inimigo é mais um sinal da filosofia de controle total que parece estar em vigor na empresa. Muitos devem se lembrar como esse método de fazer as coisas atingiu seu pico com as Nintendo Directs, as quais controlam até mesmo o fluxo de informação das novidades da Nintendo. É uma filosofia que nos tirou praticamente qualquer liberdade de interagir com a empresa.

Quando um fenômeno extremamente popular como Bowsette surge, a Nintendo se torna incapaz de faturar em cima, adicionando skins em jogos já existentes ou sequer reconhecendo a existência da personagem, pois ela não tem toda essa intimidade com os fãs. Enquanto é muito pouco recompensador fazer qualquer tipo de derivação da Nintendo, a Sega por sua vez chegou a contratar um dos melhores criadores de fangames de Sonic para fazer Sonic Mania.

Enquanto vários jogos utilizam a derivação a seu favor como Minecraft, Overwatch, Undertale e em menor escala títulos como Five Nights at Freddy's e Bendy and the Ink Machine, a Nintendo segue com uma filosofia velha que envia uma clara mensagem arrogante para os fãs: "Não toque em nada, você vai acabar estragando".

sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Red Dead 2, Westworld e o futuro dos NPCs



Red Dead Redemption 2 é a mais nova demonstração técnica de mundo realista da Rockstar, desenvolvedora conhecida pelo seu incrível trabalho na série GTA, e como de costume vem mostrando promessas extremamente ambiciosas sobre o jogo. A principal delas é a respeito de seus NPCs, os quais aparentemente são mais realistas e possuem um básico de inteligência artificial mais profundo do que estamos acostumados. Isso me lembrou de uma série muito boa da HBO chamada Westworld e como o futuro dos jogos sandbox pode estar em seus NPCs.

Uma das grandes promessas de Red Dead Redemption 2 é que agora você pode conversar com os NPCs, mas não aquelas famosas árvores de diálogo que ramificam em várias opções, uma conversa mais casual. Eles inicialmente realizam um julgamento sobre o seu personagem, se ele está bem ou mal vestido, se está sujo, com a barba por fazer, se há manchas de sangue e reagem de acordo com essa impressão inicial.

O jogador tem basicamente opções de escalada para os diálogos, os quais podem levar uma situação um nível acima ou desarmá-la. Uma vez tendo assustado alguém com sua aparência ou ações você pode aumentar esse medo ameaçando a pessoa ou acalmá-la dizendo que está tudo bem. Dependendo do seu sucesso essa pessoa pode ou não correr, pode ou não denunciá-lo para a polícia e talvez o mais interessante, ser legal não vai necessariamente te dar o melhor resultado, o que gera dilemas morais.

Obviamente isso são promessas e promessas são coisas frágeis como já vimos com Peter Molyneux e seus devaneios em Fable que nunca se concretizaram, mas o importante aqui é o conceito. Não estamos assim tão distantes de NPCs com inteligência artificial convincente, que deem um salto em relação ao que conhecemos atualmente. Em GTA por exemplo, você atira, as pessoas correm por um tempo, depois param e pronto, seguem rumando para lugar nenhum, sem casa, sem história.


Em simuladores de cidades como Cities Skylines (e acho que em SimCity também, mas não posso confirmar), cada pessoinha tem sua própria rotina, com sua própria casa, seu emprego e seu método de transporte para chegar até ele. Quando nos aproximamos da vida de cada um deles, como quais seus sonhos e aspirações, como Will Wright tentou, basicamente temos The Sims, criaturas com barras de necessidades e personalidade.

Não é algo tão complexo gerenciar todas essas vidas pois para um computador elas são apenas variáveis, ter ou não um trabalho é apenas 0 e 1, um local de trabalho é apenas um número com coordenadas predeterminadas de uma lista. Eles não estão de fato pensando, estão apenas nos dando a ilusão de pensamento, por isso o processamento não é algo de outro mundo ou inviável, como seria se cada NPC tivesse uma inteligência artificial real (aí sim cada um deles exigiria a potência de um videogame inteiro).

Então temos a série Westworld, a qual eu realmente recomendo que qualquer um aqui veja a primeira temporada. Trata-se de um futuro distópico no qual a humanidade visita parques de diversão com robôs extremamente realistas e com inteligência artificial limitada mas convincente. Westworld é o nome de um parque de diversões que leva os visitantes em uma aventura no velho-oeste.

Apesar de ser um parque de diversões, qualquer um que jogue videogame irá sentir algo familiar. Há NPCs, quests e outros jogadores como em um videogame qualquer. A diferença é que as missões não são dadas por uma pessoa com uma grande exclamação na cabeça. Uma dama deixa cair uma lata de leite, você a pega por gentileza, uma gentileza proveniente da sua persona no mundo real, e então você se envolve na quest dela, se quiser pode se envolver mais ainda na história e ela terá uma vida, uma família, sonhos, pelos quais você pode ou não se interessar. Tudo parece espontâneo e real, até que em uma segunda visita você a vê derrubar a lata de leite para outra pessoa e a magia se quebra.


Normalmente em um videogame não paramos para ajudar um NPC aleatório. Por que pararíamos? Ele não parece real. Em Westworld os NPCs parecem humanos e isso invoca certa empatia. Segundo a Rockstar, algumas missões de Red Dead Redemption 2 serão assim, não dadas por NPCs com exclamações na cabeça, mas comentadas por alto em conversas casuais até que o jogador decida investigá-las por conta própria.

Em jogos há dois tipos de história, a que é criada pelos desenvolvedores e a que é criada pelo jogador, a segunda muito mais potente que a primeira. Minecraft, por exemplo, praticamente não tem história criada por seu desenvolvedor, com exceção da caça ao Ender Dragon. A maior parte de sua história é gerada pelo próprio jogador e por sistemas ao seu redor que interagem e podem ser interagidos das mais diversas maneiras.

A forma roteirizada de contar história, na qual você tira o controle do jogador e o força em uma missão na qual os desenvolvedores esculpiram cada detalhe que será visto e interagido, exige muito dinheiro para ser produzida. Se Minecraft fosse um jogo sobre entrar em cinco templos, resolver armadilhas, pegar a espada mágica e matar o dragão, as pessoas já teriam largado dele há muito tempo. Ele se mantinha relevante porque a aventura nunca acabava, pois era uma aventura gerada pelo próprio jogador.

Atualmente jogos de mundo aberto não tem dinheiro pra preencher todos os seus cantos com história roteirizada e não têm designs interessantes o suficiente como Minecraft para preenchê-los com história para o jogador. Até mesmo o mais recente jogo do Homem-Aranha sofre disso. Desenvolver um sandbox divertido é difícil de um ponto de vista de design e por isso muitas empresas sequer tentam, fazem alguns sistemas básicos como árvores de habilidades, gangues, crimes aleatórios e pronto.


No entanto, ao termos NPCs mais realistas, eles poderiam reagir a vários detalhes do mundo, assim como reagiriam a uma camisa ensanguentada em Red Dead Redemption 2. Normalmente em um jogo de super-herói, o crime ocorre porque você está andando pela cidade de bobeira e o jogo cria um crime. Em outras palavras, ele cria um ladrão e cria uma vítima, NPCs que não existem de verdade fora dessa situação. Essa vítima não tem casa, ambições, necessidades, nem esse ladrão. São roteirizadas.

Ao criar sistemas ao invés de roteiros, você perde o controle de quando algo acontece, e perder o controle é uma coisa boa, as coisas começam a acontecer sozinhas. Um ladrão e uma vítima saem de casa no início do dia e em algum ponto ele vê a oportunidade de roubá-la, esteja você observando ou não. Você pode se perguntar: "De que adianta os NPCs fazerem algo quando eu não estou olhando?", e essa é a grande questão, trabalhar no espaço negativo.

Se todas as vezes que você estiver andando pela rua de bobeira em Spider-Man um crime é gerado para te entreter, todos jogadores verão esse crime, todos terão a mesma experiência e ao final do jogo estarão de saco cheio dele. Assim como no Level Design criamos caminhos que muitas pessoas não irão usar, é preciso existir a opção para que aqueles que a usem sintam que sua liberdade foi respeitada e que esse jogo lhes dá capacidade de expressão. Assim como uma fase na qual só andamos para frente é monótona, NPCs que sempre reagem da mesma maneira são monótonos.

Em Westworld os robôs, chamados de Anfitriões (Hosts), têm valores em sua programação que alteram a forma como se comportam de uma maneira bastante semelhante a The Sims. Os técnicos da série podem alterar os níveis dos anfitriões em carisma, agressividade, inteligência apenas deslizando uma barra, gerando experiências e reações diferentes dentro de uma mesma narrativa. Em um mesmo crime você poderia ter várias ramificações de acordo com quem é seu ladrão, vítima ou uma inesperada combinação incomum de ambos.


No início da série Westworld vemos que as pessoas começam seguindo as quests dadas pelos NPCs mais óbvios, mas logo estão seguindo suas próprias jornadas, encontrando sua própria diversão em um mundo interativo. Em Westworld se o jogador quiser salvar alguém de uma ameaça, ele não precisa entrar em uma missão, pois o mundo em si já é perigoso, pessoas inocentes morrem diariamente sem ninguém intervir e isso significa que em uma dessas ocasiões o visitante pode chegar no exato momento e salvar essa pessoa, tendo uma experiência única.

Isso não é tão diferente em conceito das vilas de Minecraft, as quais são completamente desprotegidas contra monstros. Se uma horda de zumbis for em direção a uma vila, você poderia impedi-los. Os habitantes no entanto não ficarão gratos, eles não são programados para isso. Você pode ficar o dia inteiro ajudando a vila, plantando, construindo, protegendo-a e eles não reagirão de forma alguma.

Se ao invés disso os NPCs tivessem variáveis, hoje haveria comunidades inteiras dedicadas a construir vilas em Minecraft nas quais os jogadores poderiam ser vistos como reis. Ao invés disso se você tiver habitantes demais em um mesmo local, todos tentam entrar na mesma casa até se sufocarem por falta de espaço (sim, é sério).

É possível que eventualmente cada jogador tenha seu próprio mundo para moldar da forma que quiser graças a sistemas que nos permitirão interagir com os NPCs a ponto de torná-los parte desse mundo, validadores de que este mundo existe fora da sua observação. Não que esteja defendendo hiper realismo no qual você comete um crime em GTA e uma AI detetive te investiga em uma delegacia (apesar de que isso poderia ser um novo gênero de jogo).

O futuro do sandbox pode ter mais a ver com gerar sensações do que acompanhar histórias, ou seja, mais perto de um parque de diversões que de um filme.

domingo, 30 de setembro de 2018

Minecraft segue seu caminho de irrelevância na MineCon 2018


Esse final de semana tivemos a MineCon 2018, um evento que reúne todas as maioridades novidades relacionadas a Minecraft em um ano e para surpresa de ninguém os anúncios foram bem caídos. Vale a pena dar uma olhada no artigo anterior "Como a Microsoft destruiu Minecraft" já que não vamos falar dessa parte toda da questão, apenas de como as novidades continuam levando Minecraft por um caminho de irrelevância.

A primeira novidade é "Village and Pillage", que dá uma maior diferenciação entre os habitantes das vilas e entre habitantes de vilas em biomas diferentes. Cada bioma agora terá diferentes tipos de arquitetura e isso promete pelo menos uma maior variedade às cidades, mas vale lembrar que cidades são ocorrências relativamente raras em Minecraft, então poucas vezes você teria contato constante com duas diferentes.

O destaque ficou para um novo tipo de inimigo que anda em bando chamados Pillagers, saqueadores que lembram um pouco os já adicionados Illagers que aparecem nas mansões porém com um elemento nômade. Eles atacam com uma nova arma, a besta, a qual poderá também ser construída por jogadores, e costumam andar com uma criatura que parece um búfalo para atacar inimigos.


Particularmente eu gosto da ideia de um grupo de inimigos que ofereça algum desafio, pois após dominar uma área com uma fortaleza é muito difícil se sentir ameaçado em Minecraft, porém eles poderiam facilmente dizimar um vilarejo antes que você tivesse tempo de protegê-lo. Para não mencionar que novamente isso afeta a parte de "contraste" do jogo, deixando os dias igualmente perigosos em relação às noites.

O ideal seria que Minecraft tivesse etapas mais demarcadas para que inimigos não viessem atacar antes de você estar pronto, como em um Tower Defense. Criar fortalezas é legal, mas Minecraft não foi bem projetado para isso, uma vez que você erga uma defesa ao seu redor, os inimigos não podem entrar. Por isso há todo o elemento de mineração para que você tenha que se expor ao perigo em troca de recompensa.

Muitos elementos de Minecraft hoje parecem precários, mal feitos demais para um jogo tão popular. Até hoje é dificílimo criar armadilhas para matarem inimigos automaticamente, elas são ineficientes, bugadas, exigem constante manutenção. O tipo de coisa que poderia ser consertado em um Minecraft 2 e integrado desde o início no design se esse fosse o foco do jogo.


O segundo anúncio foi que estavam ampliando os biomas, pretendem adicionar extras a todos os biomas do jogo, mas irão fazer isso um de cada vez a começar pela Taiga graças a uma votação de usuários. Agora temos pandas comedores de bambu e mais gatos. São adições bem vazias que mais uma vez inflam o jogo sem qualquer retorno para a jogabilidade.

São as típicas adições de Jeb, sempre mais, mais, mais, sem qualquer motivo para o mais. Em cinco segundos eu consigo pensar em adições melhores. Ao invés de um Panda, simplesmente um urso, faça o jogador ter um pouco de medo da fauna. É algo simples e que adiciona à jogabilidade, não apenas mais um enfeite para o cenário.

Por fim tivemos o primeiro prego na tampa do caixão de Minecraft, o anúncio de um novo jogo chamado Minecraft: Dungeons, um dungeon crawler genérico com diferentes classes de personagens e aposto também que terá geração de dungeons aleatória. Esse é o tipo de jogo sem alma e genérico que a Microsoft faz quando tem uma franquia e deseja explorá-la por uma grana básica, praticamente um Fable Legends.


Não que eu diga que não vá fazer sucesso, não sei como anda a popularidade da estética de Minecraft hoje em dia, se crianças ainda são encantadas por qualquer coisa com visual de blocos como era na época que o jogo foi lançado. Muitos jogos ruins se firmaram entre bases jovens de jogadores sem muito discernimento graças a essa estética. Porém eu não espero um jogo relevante.

Eu realmente sinto falta de quando Minecraft era um bom jogo.


sábado, 29 de setembro de 2018

Crossplay e o vespeiro no vizinho


Crossplay tem sido uma das palavras do momento, uma polêmica que se instaurou mais ou menos no último ano e veio se arrastando a níveis mais controversos. Crossplay é a ideia de unificar multiplayer entre várias plataformas, algo que um dia já pareceu completamente absurdo mas hoje se espera das empresas e elas são cobradas quando não têm. Vamos entender um pouco o que está acontecendo e por que essa questão não é tão simples quanto deixar todo mundo brincar junto.

Pra quem chegou agora, Crossplay é a palavra que estão usando para definir a possibilidade de jogadores enfrentarem ou se unirem a outros usuários online em plataformas diferentes, concorrentes ou não. Porém obviamente quando são concorrentes é ainda mais impactante, pois até alguns anos atrás essa possibilidade nem existia na cabeça das pessoas.

Tudo começou a ganhar tração ironicamente no PlayStation 4 quando Rocket League permitiu crossplay entre jogadores do PS4 e PC. Desde então a popularidade e temática de Rocket League começou a empurrar a bandeira do crossplay, pois afinal era um jogo com apelo tão universal quanto o futebol e fazia realmente sentido que estivesse disponível em todas as plataformas.

O PS4 permite crossplay com PC, o Xbox One permite crossplay com PC, mas apesar de a produtora ter insistido muito, não conseguiu fazer crossplay entre PlayStation 4 e Xbox One. Na época ainda não sabíamos quem estava barrando o que, mas até entendemos, são concorrentes, não faz sentido se darem bem. Curiosamente na época a diferença de vendas entre as duas plataformas não era tão grande e nenhuma das empresas ligou pra isso.


Atualmente Rocket League está disponível até mesmo para o Switch e foi a Nintendo quem mais surpreendeu quando o assunto é crossplay. Apesar de ser muito retrógrada em várias situações, a Nintendo resolveu criar uma ponte de amizade com a Microsoft e permitir crossplay entre o Switch, Xbox One e PC. Esse relacionamento provavelmente começou ainda com as versões de Minecraft para Wii U e Switch.

Quando a Microsoft comprou Minecraft, manter as versões do jogo que já existiam provavelmente era uma obrigação da empresa, porém ela definitivamente não era obrigada a lançar novas versões para consoles que não eram dela como o Switch e o Nintendo 3DS, ainda assim ela o fez. Provavelmente a Nintendo teve que ir atrás da Microsoft para conseguir a versão do 3DS já que ela não aconteceu muito naturalmente.

Agora essa gentileza parece gerar frutos extremamente proveitosos para a Microsoft pois a Nintendo está parecendo sua amiga em propagandas sobre Crossplay. Se tanto Sony quanto Nintendo bloqueassem Crossplay, seria apenas mais uma prática da indústria que ninguém reclamaria, mas quando a Nintendo aceitou e inseriu Crossplay em jogos como Rocket League, Minecraft e Fortnite, obviamente colocou a bola na quadra da Sony e deu a ela automaticamente uma imagem de vilã.

A Sony já domina a geração com quase 80 milhões de PlayStation 4 vendidos contra 20 milhões de Xbox One e até o momento 20 milhões também do Nintendo Switch. Como líder, não era vantajoso para a Sony se abrir às outras plataformas e não é incomum que a Microsoft se pinte como defensora dos interesses do público, quando todos sabemos quais eram as reais intenções da empresa no início da geração.


O antigo CEO da Sony Online Entertainment, John Smedley, comentou que em sua época a razão para não fazerem Crossplay era puramente dinheiro, mas nesse caso não seria bem Crossplay e sim um "CrossMoney". Não é que a empresa não queira que pessoas joguem entre plataformas, eles não querem que as pessoas façam suas compras digitais no Xbox One e depois usem esses mesmos itens no PlayStation 4 sem que a Sony ganhe algo com isso.

A própria Nintendo apesar de permitir Crossplay em Fortnite estava bloqueando moeda virtual V-Buck comprada em outras plataformas. Isso fazia com que mesmo com uma conta unificada o saldo do jogador ficasse espalhado por múltiplas plataformas. Ninguém reclamou a respeito disso, como se todo o alarde e pressão tivessem agendas bem específicas.

Agora a Sony cedeu no quesito Crossplay e eu vou comentar por que não acho isso uma boa ideia. O conceito de todos jogarem juntos é maravilhoso, mas não tem necessariamente um bom lado prático. Não há muitas leis a respeito de crossplay e não sabemos quais são os acordos que as empresas estão firmando nos bastidores. Pode demorar até vermos os primeiros casos polêmicos sobre isso, mas a certeza é que veremos.

Se o seu vizinho tem um vespeiro no quintal, você joga uma pedra nele e acaba severamente ferido pelas picadas das vespas, a culpa é sua que provocou a ação ou do seu vizinho que foi negligente? E quando esse caso é ampliado para o âmbito online? O que acontece se algum dano for causado a uma pessoa em uma plataforma por um usuário que veio de outra rede?


Imagine se um usuário da Xbox Live aliciasse usuários da PSN para um golpe de venda de V-Bucks, se um usuário da Nintendo Online fosse assediado por um usuário da PSN, se jogando Fortnite no Switch o jogo fosse invadido por cheaters do Xbox One. Com as três empresas tão enroladas entre si é de se esperar que o consumidor leve a pior nessa e até tenha que lidar com um jogo de empurra-empurra.

A segurança das outras redes passará a se tornar também um problema de cada empresa individualmente, pois cada falha de segurança nelas poderá ser uma porta de entrada para um problema em outra plataforma. Se algo assim acontecesse, a Nintendo seria responsabilizada por sua clássica segurança frouxa?

Quando o Nintendo Switch foi hackeado, usuários colocaram imagens pornográficas em Super Mario Odyssey, mas e se fosse Rocket League? Em GTA 5 um hacker usando versões alteradas do jogo conseguiu se passar pela Rockstar e enviar uma mensagem de "pré-venda de GTA 6" com um link falso. Legalmente será uma loucura quando essas ocorrências envolverem redes diferentes e rivais pois cada plataforma tem níveis diferentes de segurança e abertura.

Dependendo dos acordos ou de como os tribunais decidirem futuras disputas (o que deve levar uma boa década), algumas empresas poderiam até ser devastadas por indenizações milionárias ou multas previamente estabelecidas. O que para a Microsoft não é problema nenhum, mas tanto Nintendo quanto Sony têm reservas limitadas.

Da forma como é feito atualmente o Crossplay não é uma boa opção para nenhuma das empresas, pelo simples fato que seus serviços online são gargalos para controlar quem entra na jogatina. No PC o multiplayer online é gratuito e praticamente sem moderação, o que abre espaço para uma comunidade bastante tóxica e repletas de cheaters. Muitos jogos são injogáveis no PC devido a trapaceiros.


Isso tudo para não falar de más intenções, pois se tem algo que a indústria não parece ter limites é para más intenções. Não seria impossível para uma empresa pegar seus jogadores conhecidamente cheaters e pareá-los especialmente contra a rede de outro videogame para prejudicar a imagem de um concorrente. Mesmo hipoteticamente é assustador o que podemos ver nos próximos anos.

Mais do que nunca o online está integrado nos consoles, a ponto de nem parecer que era uma grande novidade uma geração atrás. No entanto, quanto mais os jogos dependem da parte online, mais dependemos de uma estrutura igualmente preparada para suportá-los, o que não tem acontecido ultimamente. Problemas de matchmaking, toxicidade e falhas técnicas podem estragar jogos outrora bons.

Ao unificar todas as plataformas em uma só será jogado um holofote em todos esses problemas e ao invés de resolvê-los poderá se tornar um grande jogo de culpar uns aos outros: "Jogadores do PlayStation xingam mais", "Jogadores do Xbox são mais machistas", "Jogadores da Nintendo desconectam mais das partidas", "jogadores do PC trapaceiam mais".

É um admirável mundo novo online que promete ser uma experiência ainda mais conturbada do que as que estávamos vivendo até agora.

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Fim da Telltale Games, Clementine irá lembrar disso


A Telltale Games, empresa que fazia vários jogos episódicos das mais variadas franquias, anunciou sua falência recentemente e não foi uma surpresa tão grande para quem acompanhava esses jogos. Como dizia um famoso comediante, "Eu quero ser apenas saudável o suficiente para quando eu morrer as pessoas ainda perguntarem "de que?"". Vamos lembrar um pouco da história da Telltale Games e ver onde ela errou.

Basicamente, a Telltale Games foi fundada em 2004 para produzir jogos simples, uma espécie de nova geração de jogos do gênero "Point and Click" (Apontar e Clicar) que haviam sido deixados pra trás pela indústria. Para produzi-los com gráficos modernos ela criou uma engine própria para gerar gráficos em 3D, mas veja bem, isso era 2004.

Fazia sentido então que essa companhia que queria ressuscitar os games de aventura de apontar e clicar fosse atrás de franquias do estilo. Tivemos então o retorno de Sam & Max, os quais não eram muito lucrativos em 2D devido ao alto custo de animar os personagens, o retorno de Monkey Island, o qual a LucasArts já não tinha muito interesse de produzir e versões novas de franquias que faziam um razoável sucesso no PC como CSI.


Então a Telltale pegou suas primeiras grandes franquias, séries de filmes que já não recebiam novos conteúdos na época: Jurassic Park e De Volta Para o Futuro (Back to the Future). Foi aqui que eles começaram a sair um pouco da sua zona de conforto. Como eram franquias meio mortas ninguém tinha expectativas muito altas e Jurassic Park realmente não os levou a lugar nenhum. Mas Back to the Future agiu praticamente como um quarto filme após a trilogia e aumentou bastante a mitologia da série.

Parece ter sido na forma como eles lideram com essas franquias que fez com que eles entrassem em contato com a série The Walking Dead de Robert Kirkman, a qual na época estava começando a ganhar atenção na TV e já era um sucesso nos quadrinhos. Este foi um ponto de virada para a Telltale Games que subitamente se tornou um dos garotos grandes do playground.

O primeiro jogo de The Walking Dead da Telltale era incrível, principalmente porque era muito bem escrito assim como as HQs. A história era visceral, desesperadora e havia momentos em que ser um jogo tornava a história individualizada, como escolher quem vai receber comida quando não há suprimentos pra todos. Ele também nos apresentou ao clássico sistema de escolhas da Telltale, que geravam consequências na história. Tudo isso era amarrado com uma nostálgica jogabilidade de Point and Click e tudo estava bem no mundo.

O jogo foi muito aclamado por público e crítica, porque era realmente bom assim, ao ponto de muita gente chorar no final de tão envolvente. As escolhas em geral pareciam alterar significantemente a história e até fazer com que personagens chegassem mais longe ou não na sua história do que na de outras pessoas.


No entanto as escolhas não eram tão profundas assim e a maior parte da história estava sempre sob um trilho impossível de ser alterado. Por ser o primeiro jogo da Telltale tudo parecia ser verdade e "Clementine irá lembrar disso" parecia uma promessa real. Até certo ponto elas foram verdade, mas acho que nunca da forma como os jogadores esperavam que seriam.

A Telltale Games pegou essa ilusão de escolha e fez o que qualquer ilusionista sabe que não deve fazer, repetiu o truque várias vezes diante da mesma plateia. Após perceber o sucesso de The Walking Dead foram vários jogos em sequência nos anos seguintes como Tales from the Borderlands, The Wolf Among Us, Game of Thrones e uma segunda temporada de The Walking Dead.

Os jogos não eram ruins, mas de repente os produtos da Telltale se tornaram algo formulaico e o mais importante, eram jogos que contavam apenas histórias, não tinham mais uma jogabilidade relevante. Havia claro a necessidade de ter que guiar os personagens a fazer algo e a jornada não progredir até você descobrir o que e Quick Time Events no qual você precisava apertar um botão, porém não havia qualquer liberdade dentro desses trechos.

Chegou um momento em que todos sabiam o que esperar de um game da Telltale e eles começarem a entrar em promoções e serem distribuídos de graça em serviços de assinatura como PS Plus e Games with Gold. Provavelmente o ponto mais baixo da empresa, assim como dos jogos da série The Walking Dead foi o game dedicado a Michonne em 2016, com apenas 3 episódios, praticamente sem escolhas e sem revelar nada sobre a personagem ou sua vida anterior (evitando dar spoilers, na HQ muito mais já foi explicado).


As escolhas passaram a determinar menos para onde a história ia e mais sobre quem sobrevivia e assim destravava novos diálogos ou tinha pequenas referências a escolhas passadas em episódios futuros, o que era bastante monótono. Logo a Telltale se tornou mais uma daquelas empresas que prometem uma grande aventura cheia de escolhas que nada mais fazia do que colocar o jogador sempre no mesmo caminho.

Demorou muitos anos para a Telltale Games chegar a Walking Dead e levou muitos mais para ela começar a se mexer novamente. Apenas há poucos anos ela havia decidido mudar sua engine gráfica, a qual ainda era a mesma de 2004 e já apresentava muitos problemas como travadas ao mudar de cena que muitas vezes faziam você morrer à toa.

Estranhamente eu diria que um dos pontos altos da empresa foi justamente em Minecraft: Story Mode. Acho que ninguém esperava que esse jogo ficasse bom e isso deu uma chance ótima à Telltale para surpreender e mostrar do que realmente era capaz. A campanha ficou divertida, cheia de referências e metalinguagem para fãs de Minecraft e ainda teve episódios extras sobre mais elementos desse mundo, incluindo YouTubers.

A segunda temporada de Minecraft: Story Mode mostrou ainda o que poderia ser uma evolução para a Telltale. O jogo oferece um sistema de combate interessante e conta até mesmo com lutas contra chefões, as quais ofereciam um desafio real tanto de jogabilidade quanto estratégia, algo que remete ao que um videogame de verdade deveria ser.


Porém, já era tarde demais. A boa vontade do público com a empresa já havia se esgotado faz tempo. Quando ouvimos que a Telltale havia declarado falência ninguém demonstrou surpresa, mais provável termos imaginado "também... pudera".

Foi como se em algum momento eles achassem que não precisavam mais fazer jogos, só precisavam contar histórias.

Como a Nintendo pretende inflar as vendas do Switch


Em Julho de 2018 o Nintendo Switch atingiu a marca de 20 milhões de unidades vendidas, uma boa marca que deveria ter sido atingida um pouco antes em março, mas aqui entramos em uma questão. Um ano após o lançamento do Switch as vendas estão desacelerando devido a falta de jogos e a Nintendo deve estar ficando preocupada, pois a boa vontade do público e da imprensa podem se virar rapidamente.

Percebi recentemente que a Nintendo ligou o modo desespero pra esse final de ano, pois não parece acreditar que vão atingir a meta de vendas a menos que deem um jeito de inflar as vendas do Switch, artificialmente aumentar as vendas através de um custo para eles. Logo em seu segundo ano a Nintendo já pretende encher o Switch de bundles e cá pra nós, alguns são estranhos.

Se o Switch estivesse indo tão bem quanto as notícias e os fãs gostariam de acreditar, esta não seria uma temporada de festas com bundles, seria uma época para se produzir o máximo de unidades padrão possíveis para atender uma demanda desenfreada, como aconteceu com o Wii que vivia esgotado. Bundles por outro lado são quando você já não acredita tanto no valor do seu produto e oferece algo mais para que as pessoas o vejam como um "bom negócio".

Só neste final de ano o Switch terá bundles com seus maiores lançamentos: Super Smash Bros. Ultimate e Pokémon Let's Go Pikachu & Eevee (dois bundles). Além de criar um quarto bundle bem estranho com... Fortnite. A popularidade de Fortnite é inegável, mas ele é um jogo gratuito. A Nintendo está vendendo um bundle que é um console, um jogo e moeda virtual para esse jogo, algo que se aproveita do nome mas não necessariamente oferece bom valor ao consumidor.


Esta estratégia de inflar vendas com bundles foi muito usada na época do Nintendo 3DS, mas não foi algo que aconteceu de cara (apesar que ele teve o corte de preço monstro), apenas quando as vendas desaceleraram começamos a ver incontáveis versões do videogame. Bundles agitam colecionadores que queiram ter versões exclusivas do videogame, espertalhões que compram para revenda no eBay sabendo que eles valorizarão e até mesmo compras de impulso por pessoas que talvez não comprassem o videogame em outra ocasião.

Tudo isso é um reflexo do Switch não estar expandindo seu público e sua principal fonte de alimentação ser de fãs da Nintendo, um grupo que tem um teto. Se você comprou um Switch por The Legend of Zelda: Breath of the Wild já está na seca há mais de um ano sem outra grande aventura épica em mundo aberto, e se BOTW for o único jogo que interessar um certo tipo de consumidor no Switch é de se esperar que ele esteja desanimado.

Pessoas que jogavam Wii Sports rapidamente se converteram em público para coletâneas de minigames, para games musicais e assim por diante. Um público que compra um console por Breath of the Wild não vai se converter em público para ports de Wii U, para jogos de plataforma sem desafio nenhum como Kirby e Yoshi ou para spin offs como Luigi's Mansion 3.


O excesso de ports do Wii U para o console como o recém anunciado Super Mario Bros. U, um jogo de lançamento do antigo videogame, e agora o anúncio de um novo Luigi's Mansion 3 que ninguém estava pedindo, pinta um quadro muito óbvio de uma Nintendo da fase Wii U e 3DS agora no Switch. No entanto, este ainda não é o caso.

Mencionei antes como vários jogos de "segundo ano" da Nintendo estavam ausentes e como recentemente temos tido muitos anúncios apenas com logos e "em breves" como Metroid Prime 4, Animal Crossing, Pokémon, jogos que apenas existem em conceito até agora. Para não mencionar que mesmo jogos já lançados estão estranhos, com pouca confiança, como é o caso do Nintendo Labo que é uma boa ideia mal vendida.

A resposta para isso tudo é um pouco triste. A Nintendo ainda está sofrendo consequências do inesperado falecimento de Satoru Iwata. Todas as decisões que estamos vendo agora não são necessariamente fruto de uma Nintendo incompetente como da época do Wii U e 3DS, mas uma Nintendo um pouco sem direção e com muitos cozinheiros temperando a sopa.

Aparentemente Kimishima não tinha tanta autonomia em seu papel como presidente e algumas de suas ideias podem até ter sido aprovadas, mas sem aquele empurrãozinho que apenas um presidente pode dar ao seu produto favorito. Iwata deu empurrões monumentais na época do Wii e DS pois ele sabia qual tipo de software precisava ser lançado para seu sucesso, mas esse não era o papel de Kimishima como um presidente de transição.


Então temos a entrada do novo presidente e para quem sabe enxergar também o espaço negativo, a ausência de anúncios e de jogos, vemos que houve um vácuo durante esse período na Nintendo. Não é apenas a Nintendo não anunciando coisas, houve um vácuo de autoridade no qual ninguém parecia ter cacife para aprovar projetos que deveriam ser aprovados ou botar ênfase em projetos já lançados. Tão raro de acontecer quanto com o trem bala, a Nintendo está atrasada em sua agenda.

O videogame vai vender muito por causa de Super Smash Bros. Ultimate e Pokémon Let's Go e a Nintendo vai passar como se tudo estivesse bem com essa cortina de fumaça (e com ajuda dos fãs), mas se as coisas estivessem tão boas, o consumidor teria que gastar mais para obter o console e esses jogos, como é de costume com quem escolhe Nintendo.

O terceiro ano do Nintendo Switch será sem dúvida seu mais decisivo pois só então começaremos a ver algumas das ações do novo presidente Shuntaro Furukawa e veremos também os seus jogos de segundo ano que deveriam ter consolidado a mensagem do console mas que chegarão atrasados. Isso atrasará um pouco a agenda da Nintendo e talvez crie outro ano com muitos lançamentos como foi o primeiro do Switch, de Zelda e Mario no mesmo ano.

Normalmente o segundo ano de um console Nintendo é a segunda martelada que mostra que o prego do primeiro ano continua reto. Já o terceiro ano é deixado para jogos menores e remakes para dar espaço para Third Parties com parcerias. Agora todos esses jogos poderão acabar colidindo e gerar um efeito cascata bem mais complexo do que a maioria dos jogadores pode imaginar.