terça-feira, 22 de março de 2016

Muito além do Castelo do Dragão


Estamos em uma época de aniversários, na qual Sonic completa 25 anos, Pokémon e Resident Evil completam seus 20 anos e várias outras séries dos anos 90 comemoram dois dígitos de idade. No entanto, 2016 marca também o aniversário de 25 anos de um clássico "nacional", o jogo "Mônica no Castelo do Dragão" do Master System, lançado originalmente em 1991 pela Tec Toy, exclusivamente para o Brasil.

Neste jogo a protagonista Mônica, das histórias em quadrinhos da Turma da Mônica, é levada para uma terra de monstros sob o pretexto de enfrentar um vilão comum de suas aventuras, o Capitão Feio. Estranhamente ele havia domado um dragão e o mantinha em um castelo como forma de proteção. Após derrotar o dragão, porém, o Capitão Feio fugia e a história acabava com um final um pouco anticlimático que explicava sua ausência através de texto.

A jogabilidade era divertida, com combates simples nos quais desferíamos coelhadas contra inimigos no caminho, ocasionalmente enfrentando chefes e coletando dinheiro para comprar melhores armaduras, botas, escudos e também itens que pudessem ser úteis. As várias combinações de upgrades tornavam a aventura sempre diferente, pois as armaduras permitiam que você tomasse menos danos, as botas podiam fazer você andar mais rápido e pular mais alto, e os escudos protegiam contra certos projéteis. Dependendo de qual desses fatores você escolhesse priorizar, seu jeito de jogar mudava.


Provavelmente a maioria dos leitores do blog já deve saber por que havia algumas coisas que soavam "estranhas" na história de Mônica no Castelo do Dragão, mas talvez ainda haja alguns que estão aqui inocentemente. Na época a Tec Toy fez uma grande campanha que nos fez sentir um certo orgulho do jogo. Nos anos 90 não havia indústria de games no Brasil e a ideia de vermos uma personagem nossa em um videogame era surreal.

Porém, Mônica no Castelo do Dragão não era realmente um jogo brasileiro de verdade. Ele era uma versão adaptada de outro jogo, chamado Wonder Boy in Monster Land. O herói Wonder Boy (menino prodígio?) foi transformado em Mônica, sua espada virou o coelhinho Sansão e os personagens da terra dos monstros foram mantidos, agora falando em português.

Éramos crianças, éramos inocentes e para nós, foi muito importante ver uma personagem "nossa" nos videogames, pois como dito antes, simplesmente não havia indústria nacional naquela época. Mônica no Castelo do Dragão foi definitivamente um passo importante para firmar o Master System como um console que o público brasileiro abraçava e se tornou parte da infância de muitos de nós.


Mais jogos da franquia foram convertidos depois. Wonder Boy III: The Dragon's Trap virou "Turma da Mônica em O Resgate" e o jogo Wonder Boy in Monster Land para Mega Drive virou "Mônica na Terra dos Monstros". Os jogos da Turma da Mônica eram todos excelentes, graças aos valores arcade presentes em Wonder Boy, e se tornaram sinônimo de qualidade, algo que o público brasileiro podia se orgulhar, sem saber a verdade na época.

Isso só não era bom para o pobre Wonder Boy, que ficou totalmente desconhecido por aqui. Wonder Boy poderia andar na rua e não seria reconhecido por ninguém e isso de certa forma nos prejudicou por muitos anos e tem reflexos até os dias de hoje. Em outras palavras, o público brasileiro não sabe que é fã de uma série chamada Wonder Boy.

Quando a Sega parou de criar jogos para o Mega Drive a Tec Toy começou a buscar alternativas para manter o videogame com lançamentos relevantes, como trazer jogos japoneses que não haviam sido lançados em outras partes do mundo para o Brasil. Por isso ganhamos títulos como YuYu Hakusho: Sunset Fighters, disponível apenas no Japão e no Brasil.


Porém, vale então a pergunta: Por que a Tec Toy nunca trouxe Wonder Boy: Monster World 4? Era um jogo de extrema qualidade e popularida, mas ninguém saberia disso sem a Turma da Mônica para substituir o elenco original. Isso fez Monster World 4 ficar restrito ao Japão por anos até ser lançado em inglês no Virtual Console do Wii em 2012 e em várias outras plataformas posteriormente.

Eu não quero criticar a Tec Toy pelo que ela fez na época do alto de um pedestal de 25 anos depois. O que ela fez foi importante e inteligente dada a situação daquela geração e garantiu o sucesso do Master System. Também não vou fingir que a empresa não ficou gananciosa e começou a alterar jogos demais, sem ponderar as consequências. Asterix do Master System que continha os atemporais personagens gauleses, trocou-ous por Gilmar e Priscila da TV Colosso, um programa de TV que desapareceu com o tempo.

A própria Sega fazia versões editadas de outros jogos, como Alex Kidd in Higg-Tech World, que era na verdade um outro jogo chamado Anmitsu Hime baseado em um desenho japonês que nunca veio para o ocidente, e Black Belt, que era originalmente um jogo do anime Fist of the North Star, e assim por diante. Até a Nintendo fazia isso, quando transformou o jogo Doki Doki Panic em um bizarro Super Mario Bros. 2 no qual o encanador puxava legumes do chão e era um dos piores personagens para se controlar.


Hoje vivemos em um mundo globalizado, no qual soa como absurda a alteração de um produto de um país para o outro. Quando pensamos nas censuras que os desenhos japoneses sofrem, trocando cigarros por pirulitos, cerveja por suco, alterações nas histórias como nos Estados Unidos, onde Sakura Card Captors foi rearranjado para colocar Shoran como protagonista ou Cavaleiros do Zodíaco no qual Hyoga é surfista, nos causa indignação, pois estão desrespeitando a obra original.

Não temos essa indignação por Mônica no Castelo do Dragão, no entanto. O defendemos pois fez parte da nossa infância e nos marcou mesmo que talvez não tenha sido certo. Porém, e se um novo Wonder Boy fosse criado hoje em dia? Seria certo colocar Mônica no lugar dele novamente? Com certeza não. Iríamos querer que isso fosse feito mesmo assim? Acredito que o público se dividiria nessa questão.

Não estamos mais em um ramo hipotético, no entanto. Há mesmo um novo Wonder Boy sendo produzido pelo seu criador, Ryuichi Nishizawa, apesar de que ele não pode usar o nome "Wonder Boy" pois este título pertence à Sega. Sob a alcunha de "Monster Boy and the Cursed Kingdom", este novo jogo será lançado no segundo trimestre de 2016 para o PlayStation 4, Xbox One e PC, com tudo que fez do original um sucesso, confira o vídeo.


Fãs de Mônica no Castelo do Dragão não sabem que deveriam estar ansiosos por esse jogo. É curioso quando pensamos que 25 anos se passaram desde Mônica no Castelo do Dragão, quase 30 se considerarmos a versão Wonder Boy in Monster Land original de 1987, e veja como ambas as franquias seguiram em direções diferentes.

Wonder Boy prepara-se para um retorno de alto nível nos consoles de última geração com um novo nome que pode se transformar em uma nova série, enquanto Mônica se resume hoje a minigames em smartphones e tablets, clones bem feitos de jogos de sucesso como Angry Birds em "Coelhadas da Mônica" ou Temple Run no "Jogo do Cascão".

Quando nos fizeram acreditar que Mônica no Castelo do Dragão era nosso, havia toda uma magia sobre o Brasil ser capaz de produzir jogos assim como a Sega ou a Nintendo faziam. Porém 25 anos depois, estamos aqui, ainda presos nos minigames e em jogos independentes que não chegam ao nível do clássico Wonder Boy ou de sua nova versão.

A verdadeira ilusão é que o mercado nacional, a Tec Toy e a Mauricio de Sousa Produções, nunca tiveram a ambição de andar com os grandes, tudo não passou de uma oportunidade que surgiu na época e que eles aproveitaram. Essa falta de ambição é que não nos dá um novo jogo de aventura da Turma da Mônica que seguisse os mesmos valores de Wonder Boy mas que não precisasse tirá-lo de seu próprio jogo.

Para sonhar um pouco eu fiz uma imagem de como ficaria Mônica em uma screenshot do novo Monster Boy (clique para ampliar), utilizando o design dela da história em quadrinhos "Mônica contra o Terrível Exército do Capitão Feio", uma adaptação de 1993 do enredo do jogo para a revista tradicional da turma. Quem sabe em um outro dia, uma outra época, em outros 25 anos.


6 comentários:

  1. Obrigado Monteiro por mais um post, já estava ficando preocupado, boa sorte e se cuide.

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  2. Acerca dos jogos não tem muito o que fazer, estamos bem aquém.

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  3. Excelente reportagem. Sou uma das vítimas da Tectoy. Na minha infância, joguei com meus amiguinhos o clássico Turma da Mônica em o resgate e posteriormente o Monica na terra dos monstros. Fiquei muito frustrado anos depois quando descobri que meu personagem favorito na infância na verdade era um boy kkk! Vai entender. Automaticamente deixei a Mõnica de lado e fui explorar o tal do Wonder boy e vi que era um personagem incrível! Passei a ser fã e só jogava os títulos do mesmo. Quando descobri que vão lançar o Monster Boy, na minha mente veio aquela sensação nostálgica e mesmo com meus 35 anos de idade sim! vou jogar com certeza!! Mas não gostaria de ver a Mônica substituindo o Boy denovo porém gostaria de ver a Mônica num excelente game de aventura/RPG junto de seus amigos do bairro do limoeiro. Obrigado amigo!

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    1. A TecToy realmente nos roubou a chance de termos nostalgia por WonderBoy, mas ainda por cima nos roubou a chance de ver a Mônica em um jogo próprio

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  4. Ótimo artigo. Muita nostalgia.
    Lembro de jogar na casa de um colega e achar incrível um jogo em português. Coisa que não acontecia no NES.
    Lembro que a TecToy investiy em traduções também, como Phantasy Star. Era bem diferente jogar sem um dicionário do lado.

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    1. Fazia muita diferença, hoje em dia é até estranho quando os jogos não tem opção em português. Até No Man's Sky que é um indie veio dublado.

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